O globo, n. 31966, 12/02/2021. País, p. 4

 

Limites ao tribunal

Bruno Góes

12/02/2021

 

 

Deputados articulam restrição à criação de normas eleitorais pelo TSE

Com o aval do novo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), a Câmara dos Deputados formalizou ontem a criação de um grupo para elaborar uma nova reforma política. Um dos pontos que devem ser debatidos é a criação de um “código de processo eleitoral” para impedir o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de criar normas sem a previsão do Congresso.

Para parlamentares, o TSE acaba “legislando” quando cria, por exemplo, regras sobre cotas de gênero, racial e sobre divisão de recursos do fundo eleitoral. Esses pontos foram alvo de reclamação dos partidos na eleição municipal do ano passado. As siglas afirmaram que tinha dificuldade de cumprir os critérios estabelecidos pelo tribunal por terem sido definidos às vésperas da campanha.

—Vamos debater as regras eleitorais. A questão da validade das resoluções do TSE. Vamos ver quais são os limites da atuação do tribunal. Muitas vezes o TSE tem usurpado competências do Poder Legislativo. O TSE tem legislado por resolução — disse o líder do DEM, Efraim Filho (PB).

O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) demonstra a mesma preocupação:

— O Código Eleitoral brasileiro é bastante antigo. Vejo com naturalidade essa discussão. Surgiu a ideia de ter um Código de Processo Eleitoral para que os procedimentos sejam previstos, para darmos estabilidade à lei eleitoral. Há julgados diferentes em diversas regiões do país. Depois do carnaval vamos debater o plano de trabalho. O esforço é para ter a proposta apreciada até o fim do semestre .

Em outra frente, a ideia é se debruçar sobre o chamado “distritão”. Nesse modelo, estados e municípios são divididos em distritos eleitorais. Para a escolha de deputados federais, estaduais, distritais e vereadores, os mais votados de cada região serão eleitos. Não é levado em conta os votos para partidos. A eleição deixaria de ser proporcional e se tornaria majoritária.

Além de Efraim Filho e Orlando Silva, os trabalhos serão tocados pelos deputados Margarete Coelho (PP-PI), Celina Leão (PP-DF), Soraya Santos (PL-RJ) e Jhonatan de Jesus (Republicanos-RR). Na próxima semana, o grupo vai traçar um plano para recolher sugestões de especialistas e debater as alterações na legislação. Assim que o trabalho for concluído, uma comissão deve ser formada para debater o projeto.

A alteração do financiamento público de campanha e modificação da cláusula de barreira, a princípio, não estão no foco principal, segundo deputados ouvidos pelo GLOBO.

CETICISMO

De acordo com aliados de Lira, durante a campanha para a presidência da Casa, ele foi cobrado para que o Congresso elabore uma nova reforma política. Deputados, vereadores e prefeitos mencionaram o tema em muitas de suas viagens pelo país.

Muito parlamentares, no entanto, veem a ideia com ceticismo. O líder do MDB, Isnaldo Bulhões (AL), por exemplo, diz que ainda não há sequer previsão para a criação de uma comissão:

— Na verdade a discussão é muito embrionária. Foi tratada ainda de forma superficial. A gente não pode antecipar a discussão, é um pouco cedo. Primeiro tem que saber se a comissão realmente vai acontecer. (Reforma política) ninguém sabe como acaba .

Já o líder do PL, Wellington Roberto (PB), diz que a agenda econômica é mais importante. Ele destaca que, de dois em dois anos, sempre se discute se haverá ou não revisão da cláusula de barreira, por pressão eleitoral.

— Temos muitas prioridades antes disso — afirmou Wellington Roberto.

Em 2017, o Congresso aprovou a mais importante reforma política desde o governo Fernando Henrique Cardoso. A lei estabeleceu uma cláusula de barreira, com patamares de votação gradativos para o acesso de partidos nanicos a recursos do fundo partidário e ao tempo de propaganda na TV. Ao longo do tempo, a consequência esperada é a redução no número de partidos.

Em 2019, após tentativa de um entendimento político, fracassou o plano do então presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), de votar uma nova reforma. Ele defendia o voto distrital misto, que preserva em parte o sistema proporcional, mas estabelece também o desenho de distritos. Não houve sequer consenso para a instalação de uma comissão para debater o assunto.

No mesmo ano, após decisão do Congresso, o presidente Jair Bolsonaro sancionou, com vetos, a reforma partidária, que flexibilizou regras para partidos. O presidente chancelou uma prática que hoje é considerada caixa dois: o pagamento de advogados e contadores por terceiros, sem passar pelo caixa oficial das campanhas.

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Temas que devem ser debatidos na Câmara

12/02/2021

 

 

> Distritão

Estados e municípios são divididos em distritos eleitorais. Para a escolha de deputados federais, estaduais, distritais e vereadores, os mais votados de cada distrito são eleitos. Não são levados em conta os votos em partidos e o quociente eleitoral é descartado.

> Código de Processo Eleitoral

Novo texto legal que terá a função de criar um regramento para tramitação de ações na Justiça Eleitoral. Poderá regulamentar recursos, prazos e procedimentos. Intenção é que o TSE não crie normas em função de vácuo legal. Para parlamentares, a Corte acaba “legislando” quando cria, por exemplo, regras sobre cotas de gênero, racial e sobre divisão de fundo eleitoral.

> Financiamento de campanha

Hoje, o financiamento de campanha é suprido quase integralmente por recursos públicos (Fundo Eleitoral e Fundo Partidário). Só pessoas físicas podem realizar doações privadas. Empresas foram impedidas por decisão do Supremo Tribunal Federal.

> Cláusula de barreira

Aprovada em 2017, regra estabelece patamar de votação para que as legendas tenham acesso ao dinheiro do fundo partidário e a tempo de propaganda na TV. Resistência a nova mudança, porém, é grande no Congresso.

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Lira marca data para despejar comitê de imprensa

Bruno Góes

Adriana Mendes

12/02/2021

 

 

Obra do novo gabinete do presidente da Câmara começa no fim de semana; ele ficará menos exposto aos jornalistas

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), comunicou a jornalistas na tarde de ontem que a obra para o seu novo gabinete será iniciada a partir do fim de semana. Ele ocupará espaço que é hoje reservado à imprensa, com acesso direto ao plenário. Com a mudança, Lira não terá que passar mais pelo Salão Verde, onde é abordado pelos jornalistas.

Segundo Lira, o novo local reservado para imprensa será diferente do inicialmente projetado. Quando a decisão foi tomada, na semana passada, jornalistas ficariam no subsolo da Casa . Agora, ficarão em área hoje ocupada pela vice-presidência da Câmara.

O presidente da Casa diz que o tamanho da área será equivalente. Porém, não haverá mais acesso direto ao plenário para os jornalistas. Segundo arquitetos ouvidos pelo GLOBO, a obra descaracteriza o projeto original de Oscar Niemeyer.

RETORNO DAS COMISSÕES

Em entrevista à TV Band na noite de quarta-feira, Lira afirmou que nunca teve a intenção de dificultar o trabalho da imprensa. Segundo ele, houve um “mal entendido”.

Ontem, a Câmara decidiu retornar o trabalho nas comissões, adotando o sistema híbrido de votações, com a participação presencial e remota dos deputados. O projeto de resolução da Mesa Diretora foi aprovado em plenário, mas ainda não há uma data definida para volta.

De acordo com a resolução, o sistema híbrido será adotado nas deliberações do plenário, nas comissões e no Conselho de Ética. As audiências públicas e demais eventos deverão ocorrer unicamente de forma virtual, preferencialmente às segundas e sextas-feiras. O sistema remoto deve ser utilizado preferencialmente por deputados que estão no grupo de risco da Covid-19.

Segundo o relator, deputado Marcelo Ramos (PLAM), um ato da Mesa vai estipular o número máximo de deputados que poderão reunir-se presencialmente. Ele esclareceu que, segundo o Departamento Técnico da Câmara, até 140 deputados poderão participar das sessões no plenário sem provocar aglomerações. Já as salas das comissões contam com diferentes tamanhos e limites.

O relator acatou emenda que dá ao colegiado de cada comissão o poder de definir os procedimentos internos de funcionamento para seguir as exigências de distanciamento social.