O globo, n. 31966, 12/02/2021. Sociedade, p. 7

 

Vacina, quase esgotada 

Felipe Grinberg

João Pedro Fragoso

Lucas Altino

Rafael Garcia

12/02/2021

 

 

Com doses à beira do fim, cidades ameaçam parar

Caso não receba novos imunizantes contra a Covid, a cidade do Rio de Janeiro deve interromper amanhã a aplicação das primeiras doses da vacina. O estoque não passa deste fim de semana. Duque de Caxias está na mesma situação. No país, só há produto disponível para começar a imunizar mais 2 milhões de pessoas, e a situação não deve mudar até o fim deste mês.

De acordo com dados reportados pelas secretarias estaduais de Saúde, ainda há 6,53 milhões de doses prontas para uso, mas 70% delas precisam ser aplicadas em quem já tomou a primeira dose.

A perspectiva é indicada pelos números compilados pelo consórcio de veículos de mídia reunido para levantar dados sobre a pandemia, composto por O GLOBO, G1, Folha de S.Paulo, UOL e O Estado de S. Paulo.

Se mantido o ritmo atual, com cerca de de 250 mil doses de vacinas sendo aplicadas ao dia no Brasil, em oito dias se esgotaria o estoque para novos vacinados. Assim, o país passaria seis dias aplicando o produto só em quem já tomou a primeira dose, até achegada de novos lotes.

O ritmo de vacinação poderia ser retomado e ampliado em 25 de fevereiro, uma vez que o Instituto Butantan coloque mais 8,6 milhões de doses previstas da vacina CoronaVac no sistema. A produção da Fio cruz, que distribuirá o imunizante de Oxford, só deve ficar pronta em meados de março.

Além dos municípios fluminenses, relataram que têm seus estoques de vacina se esgotando as cidades de Salvador (BA), Juazeiro do Norte (BA) e Ourinhos (SP).

O governo do Espírito Santo também diz que já enviou todas as primeiras doses para os municípios e que em alguns não há mais sobras disponíveis.

IMUNIZANTES RESERVADOS

No Rio, apesar da escassez, a Secretaria municipal de Saúde não interrompeu a campanha, e o secretário Daniel Soranz trabalha com duas hipóteses para manter o planejado. Uma seria antecipar doses da CoronaVac que estão armazenadas com a Secretaria estadual de Saúde (SES), e que seriam aplicadas daqui a 28 dias. Outra seria receber, até terça, uma nova remessa de imunizantes de Oxford/ Astrazeneca.

—Como essa segunda dose só precisa ser aplicada daqui a 28 dias, estamos pedindo liberação do Ministério da Saúde para usar esse estoque agora, se houver garantia da entrega de uma grande remessa no dia 23, como está previsto —afirmou Soranz.

A antecipação de doses sem previsão segura de abastecimento contraria a recomendação da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).

— O Programa Nacional de Imunização (PNI) deixou claro que estava enviando vacina para duas doses, e que metade delas deveria ser guardada para a segunda dose — afirma Isabella Ballalai, vice-presidente da SBIm.

— Se soubéssemos que a vacina está para chegar amanhã, seria possível começar a usar essas doses em estoque. Não é recomendável deixar as pessoas com a segunda dose atrasada.

Como o número de vacinas distribuído a cada município foi estabelecido de acordo com o tamanho de suas populações prioritárias, aqueles que foram mais rápidos em vacinar podem se ver obrigados a fazer uma pausa.

O secretário estadual de Saúde do RJ, Carlos Alberto Chaves, disse, porém, que, se os municípios estão ficando sem vacina, é porque não seguiram o PNI:

— Faltou administração por parte das cidades que estão reclamando.

Na opinião da SBIm, porém, os percalços operacionais na campanha são secundários, e o grande gargalo da vacinação é mesmo a falta de doses.

—O grande problema não é a nossa estrutura para vacinar — diz Ballalai.

— A gente precisa ter mais opções. Não podemos ficar só com duas vacinas.

Procurado, o ministério afirmou que está trabalhando em todas as frentes para garantir vacinação ágil e que o país tem 454 milhões de doses “garantidas”, com cronograma de envios ao longo do ano, a partir da liberação dos laboratórios. A pasta, porém, não respondeu sobre os pleitos do Rio.

O número que o governo federal afirma ter assegurado, porém, diz respeito a contratos e previsões de produção, não a produto efetivamente entregue. O total para o qual as secretarias estaduais de Saúde afirmam já ter recebido é de 11,22 milhões.

Até agora, apenas 0,05% da população brasileira de 212 milhões de habitantes recebeu a vacinação completa em duas doses. Uma parcela de 2,11% recebeu a primeira dose e aguarda a próxima, segundo os números levantados pelo consórcio de veículos de mídia.

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Câmara aprova PL que criminaliza “fura-filas”

Victor Farias

12/02/2021

 

 

Deputados também decidiram pelo aumento de pena para quem destruir imunizante ou insumo usado para enfrentar a pandemia

A Câmara dos Deputados aprovou ontem projeto de lei que prevê punições para pessoas que furem a fila de vacinação. Os deputados também aprovaram uma proposição que aumenta a pena para quem destruir vacina ou insumo usado para enfrentar a pandemia da Covid-19.

Levantamento do GLOBO apontou que, desde o início da vacinação contra o novo coronavírus no Brasil, em 17 de janeiro, já foram registradas ao menos 2.982 denúncias de possíveis casos de “fura-filas” da imunização — o que significaria irregularidade em uma a cada 1.341 doses aplicadas no país.

O texto aprovado pelos deputados prevê penas diferentes para três situações: infração de plano de imunização, peculato de vacinas, bens medicinais ou terapêuticos e corrupção em plano de imunização. A proposição segue agora para análise do Senado.

O primeiro caso previsto trata de infrações da ordem de prioridade de vacinação ou afrontas à operacionalização do plano de vacinação federal, estadual, distrital ou municipal. A pena é de um a três anos de reclusão e multa, mas pode ser aumentada, caso o infrator tenha usado documento falsificado. A punição também é prevista para quem falsificou a declaração.

A Câmara também aprovou ontem projeto que aumenta a pena para quem inutilizar vacina ou insumo usado para enfrentar a pandemia. Pelo projeto, o condenado será punido com reclusão de uma cinco anos e multa.

Em São Paulo, a Assembleia Legislativa (Alesp) aprovou, anteontem, um projeto de lei que prevê multa de até R$ 100 mil para quem não pertence a grupos prioritários e recebera imunização. Já quem aplicara vacina para alguém que furou afila receberia uma punição de R$ 25 mil. O vacinado de forma irregular pode ter que pagar até R$ 50 mil. Se ele for funcionário público, a multa dobra, com afastamento do cargo e processo administrativo. A proposta é analisada pelo departamento jurídico do governo do Esta doantes de seguir para sanção do governador João Doria (PSDB).

Em relação ao peculato de vacinas, o texto aprovado prevê pena de dois a 12 anos de reclusão e multa para pessoas ques e apropriem, de forma irregular, de bem ou insumo médico, terapêutico, sanitário, vacinal ou de imunização.

O artigo que trata de corrupção em plano de imunização prevê pena de reclusão de dois a 12 anos e multa para aqueles que, valendo-se do seu cargo, infringiram a ordem de vacinação por benefício próprio ou de terceiros. A mesma pena é prevista para o funcionário público que, sabendo do crime, não adota as providências necessárias para que o ato seja apurado.