Título: ''Se estou atrapalhando, vou para casa''
Autor: Sérgio Pardellas
Fonte: Jornal do Brasil, 02/03/2005, País, p. A3

Pressionado pelos partidos na reforma ministerial, presidente desabafa com aliados e ameaça desistir da reeleição em 2006

Pressionado pelo PT e pelos partidos da bancada governista às vésperas de mais uma reforma ministerial, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um desabafo. Em conversas reservadas na última semana, ameaçou não concorrer à reeleição em 2006 caso sejam criados obstáculos à consolidação do governo de coalizão, cujas mudanças serão anunciadas na segunda-feira.

- Não tenho apego ao cargo. Se acham que estou atrapalhando, volto pra casa após o mandato. E vão ter que arrumar um outro candidato para 2006 - afirmou o presidente.

Endereçado sobretudo a setores do PT, o desabafo foi feito durante uma reunião com ministros do núcleo político na semana passada, no Palácio do Planalto, no rastro da polêmica sobre as declarações de que teria abafado uma denúncia de corrupção no governo Fernando Henrique Cardoso. Interessado em sacramentar o chamado governo de coalizão durante a reforma ministerial, o presidente está muito irritado com a carga do PT, intensificada nos últimos dias para cobrar a saída de Aldo Rebelo (PCdoB) da Coordenação Política. Para o lugar de Aldo, os petistas querem o ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP).

Lula, no entanto, estaria convencido de que Aldo, pessoa de sua estrita confiança, tem o perfil ideal para exercer a função. O presidente entende que seu auxiliar transita com desenvoltura entre os partidos da bancada governista. Segundo disse ao Jornal do Brasil um ministro ligado a Lula, não foi a primeira vez que o presidente ameaçou abandonar a corrida sucessória em 2006. O desabafo foi repetida a pelo menos três outras autoridades dos Legislativo e Executivo nacional, em outros dois momentos distintos deste ano: logo após a vitória de Severino Cavalcanti (PP-PE) na Câmara e durante a viagem a Davos no fim de janeiro para o Fórum Econômico Mundial.

Naquela ocasião, integraram a comitiva presidencial o chefe da Casa Civil, José Dirceu, os ministros da Fazenda, Antonio Palocci, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan, das Comunicações, Eunício Oliveira, e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles.

Na manhã de ontem, numa tentativa de demonstração de força, na avaliação de integrantes do governo, Aldo telefonou para o presidente do PT, José Genoino, cobrando uma posição do partido em relação à vontade de reassumir a articulação política. Disse que, se o PT quisesse o seu lugar, que se manifestasse publicamente sobre o assunto. Dessa forma, sairia de forma amistosa, sem criar empecilhos. Genoino foi diplomático:

- O PT não deliberou sobre esse assunto (Coordenação Política), nem é competência do partido deliberar sobre o ministério. Quando se trata de reforma ministerial, o PT não opina. O presidente da República tem total autonomia e independência. O PT também não quer criar nenhuma crise de relacionamento com o ministro Aldo Rebelo - disse.

O ministro da Coordenação Política também participou, na segunda-feira, da retomada das negociações para a reforma ministerial que, segundo o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), será anunciada na segunda-feira. Segundo Mercadante, antes de bater o martelo o presidente voltará a conversar com ele, o presidente do Congresso, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o senador José Sarney (PMDB-AP), sobre a participação dos peemedebistas no governo. Outros partidos da base também serão ouvidos por Lula.

No fim da noite de segunda-feira, Aldo também representou Lula numa conversa com Mercadante e o líder do PT na Câmara, Paulo Rocha (PT-PA), o que revelaria seu prestígio junto ao presidente. No PT, inclusive, já estaria em curso um plano B no caso de ser confirmada a permanência do ministro na articulação política do governo. Sugeririam que a coordenação seja dividida entre Aldo e Dirceu, com o chefe da Casa Civil ficando encarregado das negociações com o PT e Aldo, com os demais aliados. A articulação compartilhada resolveria a dificuldade de Aldo em tratar com os petistas.

Além do comando da coordenação política, a reforma também vai definir o novo espaço do PMDB e do PP na Esplanada, além do quinhão reservado à senadora Roseana Sarney (PFL-MA).