Título: Polêmica na Câmara
Autor: Karla Correia
Fonte: Jornal do Brasil, 02/03/2005, País, p. A5

Uso de embriões leva manifestantes ao Parlamento

O Salão Verde da Câmara foi ocupado ontem por grupos de defensores e críticos do uso de células-tronco embrionárias em pesquisas. Entre os favoráveis, estavam portadores de doenças degenerativas ou crônicas, a maior parte em cadeiras de rodas, acompanhados de seus familiares. Do outro lado, grupos religiosos avessos à autorização da pesquisa com células embrionárias, embutida em artigo do projeto de Lei de Biossegurança que entrou, esta semana, na pauta de votações do plenário.

O projeto permite o uso em pesquisa de células retiradas de embriões com até 14 dias de formação, congelados há mais de três anos e destinados ao descarte. Para futura aplicação em seres humanos para terapias será necessária outra lei.

Segundo a geneticista Mayana Katz, coordenadora do Centro de Estudos do Genoma Humano da USP, o limite de 14 dias de existência é uma determinação ética. É a partir da segunda semana que o sistema nervoso central passa a existir, marcando o início da vida.

Hoje, a legislação permite apenas a pesquisa envolvendo as chamadas células-tronco adultas, retiradas de cordões umbilicais ou da medula óssea. São desse ramo as pesquisas que apresentam os maiores avanços, mas a capacidade de multiplicação e diferenciação dessas células é limitada.

As células embrionárias despertam maior interesse dos pesquisadores pelo seu maior potencial de crescimento e diferenciação, o que aumenta a possibilidade de reconstituição de órgãos. Segundo Mayana, elas podem se diferenciar em até 216 tecidos humanos diferentes, abrindo inúmeros caminhos para pesquisas com células-tronco.

- Nos países onde essa linha de investigação científica é liberada, já se conseguiu até a formação de células neurais, o que abre um potencial fantástico de cura para doenças neuromusculares e casos de paraplegia, só para dar um exemplo - defende a geneticista.

A capacidade de divisão das células embrionárias é apenas um dos argumentos usados por movimentos religiosos contrários à autorização desse ramo de pesquisa. Alegam que a instabilidade genética dessas células seria um fator cancerígeno potencial. Mas é a destruição dos embriões para a retirada das células que atiça os ânimos da ala religiosa do debate.

- Não podemos pretender a cura de uma pessoa baseada na morte de outra - resume o secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Odilo Scherer, um dos recebidos em audiência pelo presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE).

O argumento gerou indignação de familiares de pacientes que estavam no Salão Verde.

- Ele só pensa assim porque não tem filhos - dizia a carioca Rosane Monteiro, mãe de Thiago Waldek, 20 anos, paralítico e cego desde os 16, depois que um carro atingiu a vespa que conduzia.