Título: Cordão de imagem e verso
Autor: Caroline Menezes
Fonte: Jornal do Brasil, 02/03/2005, Caderno B, p. B1

Exposição no Rio com 1.500 exemplares destaca o aspecto visual do universo do cordel

Na sua fonte beberam grandes autores da língua brasileira - como o poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto e o dramaturgo paraibano Ariano Suassuna. Mas, além de seu valor como uma das mais expressivas referências escritas da arte popular brasileira, a literatura de cordel agrega também a singela poética dos chamados artesãos capistas, responsáveis pela criação das capas dos folhetos. Em xilogravuras ou montagens fotográficas, essas ilustrações estampam aos olhos do leitor a tradução visual do rico universo cordelista.

Este foi o ponto de partida para que os curadores Pedro Karp Vasquez e Franklin Pedroso elaborassem a exposição Universo do cordel, dando ênfase ao aspecto plástico dessa produção popular. A mostra, que será inaugurada, hoje, no Arte Sesc, no Flamengo, reúne um conjunto de 1.500 cordéis vindo de coleções raras, como os acervos da Casa de Rui Barbosa, do Museu do Folclore e da Academia Brasileira de Literatura de Cordel.

- Decidimos fazer um verdadeiro mosaico com os folhetos selecionados. Mas a montagem não foi aleatória. Fizemos aproximações, colocando lado a lado folhetos que dialogam entre si, por exemplo, aqueles que tratam de temas clássicos como o cangaço, contrapondo com criações contemporâneas do tipo A volta de Lampião via internet - explica o fotógrafo e parceiro da curadoria, Pedro Karp Vasquez.

Ele chama a atenção para a importância do trabalho dos capistas de cordel, que pode ser comparado ao dos designers de livros e CDs. Alguns desses artistas, como o pernambucano J. Borges, são disputadíssimos entre os poetas por seu talento criativo e habilidade:

- J. Borges é célebre por conseguir expressar, através de linhas e traços, o mesmo estilo que o autor empregou em seu texto.

A exposição traz também matrizes de madeira e uma prensa para que o visitante possa acompanhar todas as etapas da confecção do cordel. Um vídeo que exibe o trabalho do gravador Erivaldo, em sua barraca no Centro de Tradições Nordestinas Luiz Gonzaga, a popular feira de São Cristóvão, foi produzido especialmente para a mostra. Os curadores deram preferência aos cordéis de formato tradicional - pequenos e feitos sempre em múltiplos de oito páginas. A produção mais recente, que utiliza tecnologia digital nas impressões e formatos diferenciados, foi deixada de lado.

A preferência pela tradição se explica:

- Esse é o formato brasileiro, por excelência - diz o cordelista cearense Gonçalo Ferreira da Silva, presidente da Academia Brasileira de Literatura de Cordel. - Os pesquisadores, quando visitam nosso acervo, não estão interessados nos modelos atuais, mas sim naqueles feitos a partir de xilagravuras e tipografia.

Embora dê maior destaque ao aspecto plástico dos cordéis, a mostra inclui uma parte didática que refaz a história do gênero no Brasil, desde 1910 até os dias atuais, com a exibição de 40 folhetos raros, como os de Leandro Gomes de Barros, um dos precursores da literatura de cordel no país. E ainda originais de cordelistas como João Ferreira de Lima, Cordeiro Manso, e claro, de Catulo da Paixão Cearense e Patativa do Assaré.

Também está representado na mostra o momento da expansão desse gênero de literatura popular no país, nos anos 50, quando se deu o êxodo rural do Nordeste para o Sudeste.

- A mostra está abrindo o ciclo de exposições do Arte Sesc, cuja programação este ano vai estar voltada para a arte popular, que é um segmento pouco valorizado pelas instituições populares com exceção daquelas específicas no assunto - diz Stela Costa, coordenadora de artes plásticas do Sesc Rio.