Correio Braziliense, n. 21103, 05/03/2021. Política, p. 2

 

Câmara deve autorizar auxílio na quarta-feira

Jorge Vasconcellos 

Israel Medeiros 

05/03/2021

 

 

A Câmara dos Deputados deve votar, na próxima semana, a PEC Emergencial, que prevê medidas de ajuste fiscal e mecanismos para garantir a retomada do auxílio emergencial. Com o objetivo de acelerar a tramitação, a matéria será levada diretamente ao plenário, sem passar pelas comissões, segundo ficou definido entre o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), e líderes partidários. Caso a proposta, aprovada em dois turnos pelo Senado — na quarta-feira e ontem —, receba o aval também dos deputados, o governo enviará ao Congresso uma medida provisória com as regras sobre o benefício, como valor e quantidade de parcelas.

Lira explicou por que a Câmara não analisará a proposta nesta semana. “Não é justo que a PEC saia hoje (ontem) do Senado, e a Câmara tenha de votar hoje (ontem) ou amanhã (hoje) sem discutir. O Senado levou um tempo maior”, disse. O parlamentar acrescentou que a ideia é apresentar o texto aos deputados para a discussão em plenário na terça-feira e, se possível, votar sua admissibilidade.

A ideia é fazer a votação, em dois turnos, na quarta-feira. Para a aprovação, em cada turno, são necessários pelo menos 308 votos, o equivalente a três quintos dos 513 deputados. Se a Câmara não fizer alterações no texto, a PEC poderá entrar em vigor sem precisar retornar para o Senado. O relator na Casa será o deputado Daniel Freitas (PSL-SC).

O governo definiu que o valor do auxílio emergencial será de R$ 250, mas mulheres com filhos terão direito a uma cota maior, de R$ 375. Famílias compostas apenas de uma pessoa, por sua vez, receberão R$ 150. As quatro parcelas do benefício serão pagas, entre março e junho, a apenas um membro da família. Ao todo, 46 milhões de desempregados e trabalhadores informais deverão receber o auxílio. O gasto foi estimado pela equipe econômica entre R$ 35 bilhões e R$ 36 bilhões.

O Executivo federal pretende iniciar o pagamento do auxílio no próximo dia 18, para os que recebem o Bolsa Família. Os demais trabalhadores devem começar a acessar o benefício no fim do mês.

Após a promulgação da PEC Emergencial pelo Congresso, o governo enviará uma MP com valores e outras regras do auxílio. As MPs entram em vigor na data da publicação, mas precisam ser aprovadas pelo Congresso no prazo de 120 dias para não perderem a validade. Como o período do auxílio também será de três meses, todos os quatro pagamentos poderão ser feitos sem a necessidade de aprovação da MP pelos deputados.

Entre parlamentares de oposição, há o temor de que o governo, em articulação com o presidente da Câmara — aliado do Planalto —, envie a MP, mas não a coloque em votação, para evitar modificações no texto que aumentem o valor do auxílio. É grande o número de deputados, de centro e de esquerda, que defendem a volta de parcelas de R$ 600.

“Mais digno”

O Presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), disse, ontem, que, dentro dos limites impostos pela PEC Emergencial, o Congresso trabalhará por um valor “mais digno” para o benefício. Ele falou sobre o assunto em entrevista coletiva, após a aprovação da PEC em segundo turno na Casa.

“Dentro da responsabilidade fiscal, das limitações agora impostas pela PEC, obviamente, o objetivo do Congresso Nacional é sempre ter o valor mais digno para as pessoas”, frisou, destacando que o Brasil vive um “ápice” da pandemia da covid-19. O parlamentar declarou, também, que, após a aprovação do texto no Parlamento, a prioridade será discutir um novo programa permanente de renda para as pessoas mais necessitadas.

No Senado, o parecer do relator da PEC Emergencial, Marcio Bittar (MDB-AC), foi aprovado em primeiro turno por 62 votos a favor contra 16. No segundo turno, o placar foi de 62 a 14. Entre outros pontos, o parlamentar definiu um limite máximo de R$ 44 bilhões para o montante de despesas que poderão ser excepcionalizadas das regras fiscais, destinado ao pagamento do auxílio emergencial (veja quadro).

O que diz a proposta

Veja os principais pontos do texto aprovado no Senado

O montante destinado para o auxílio emergencial por meio da excepcionalização das regras fiscais terá um limite de R$ 44 bilhões

Gatilhos serão acionados automaticamente para conter os gastos da União quando as despesas primárias superarem 95% das receitas correntes ou em caso de calamidade pública. O governo estará proibido de fazer novos concursos, aumentar salários de servidores ou pagar bônus

Os gatilhos serão opcionais para os estados e o Distrito Federal, mas aqueles que não adotarem medidas de ajuste durante a calamidade nacional não poderão contar com empréstimos e garantias por parte da União

O prazo para pagamento de precatórios de estados, Distrito Federal e municípios será ampliado para 2029

Regras de vinculação de receitas serão alteradas, permitindo mais exceções para que fatias do Orçamento que eram destinadas a determinadas áreas sejam redirecionadas

Será criada exceção à regra geral de redução de incentivos e benefícios tributários, alcançando, além da Zona Franca de Manaus, outras áreas de livre comércio.

Autorização para carimbar receitas para uso exclusivo das Forças Armadas

_______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Proposta beneficia militares 

05/03/2021

 

 

Em mais uma aceno aos militares, o Congresso incluiu na PEC Emergencial um dispositivo que abre caminho para carimbar receitas e destiná-las a ações de "interesse à defesa nacional" e "destinadas à atuação das Forças Armadas". A medida vai na direção contrária do que prega a equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, que defende a necessidade de maior flexibilidade no Orçamento.

A alteração foi introduzida na última das quatro versões oficiais do parecer do relator, senador Marcio Bittar (MDB-AC), poucas horas antes da votação no plenário da Casa. Outros grupos de interesse no governo também conseguiram blindar suas receitas, como a Polícia Federal. O texto ainda precisa ser aprovado em dois turnos pela Câmara.

A manobra chamou a atenção de técnicos e de economistas fora do governo, pois o objetivo central da equipe de Guedes é justamente o oposto: tirar o máximo possível de carimbos das receitas para combater represamento de recursos em certas áreas. Se as receitas vinculadas não são usadas, não podem financiar outro tipo de gasto, mesmo que haja necessidade.

A medida preserva a vinculação de recursos que já existem, como royalties de petróleo que, hoje, ficam sob a alçada do comando da Marinha. No Orçamento de 2021, a arrecadação prevista nesse item é superior a R$ 1 bilhão. A maior preocupação, porém, é com a brecha criada para a criação de novas vinculações.
A última versão do texto também tratou de livrar do alcance das desvinculações o Funapol, da Polícia Federal, abastecido com taxas e multas cobradas pelo órgão.

Esse não é o único dispositivo da PEC que beneficia militares. Outro trecho do texto blinda reajustes na remuneração nas Forças Armadas do alcance de gatilhos de contenção de despesas. Na prática, qualquer aumento aprovado antes de eventual acionamento das medidas poderá ser implementado sem restrição, mesmo que se estenda por vários anos. Na redação original da proposta, qualquer reajuste aprovado após a promulgação da regra (no fim de 2016) seria alcançada pelo gatilho.