Correio Braziliense, n. 21103, 05/03/2021. Brasil, p. 6

 

260 mil mortes de covid

Renato Souza 

Fernanda Strickland 

05/03/2021

 

 

 Recorte capturado

No segundo dia mais mortal desde o começo da pandemia, o Brasil registrou 1.699 mortes por covid-19 e 75 mil novos casos. De acordo com dados do Ministério da Saúde, o país já registra 10,7 milhões de pessoas acometidas pelo coronavírus e 260.970 óbitos pela doença. A pandemia tem apresentado uma escalada no país, com aceleração da disseminação do vírus e forte pressão sobre os sistemas de saúde. Especialistas apontam a necessidade de ações nacionais de isolamento e restrição da circulação de pessoas, assim como expansão da vacinação.

No Distrito Federal, a taxa de ocupação dos leitos de UTI destinados a pacientes acometidos por covid-19 chegou a 95%. Em São Paulo, esse índice, em relação a leitos públicos, está em 77%. O Rio Grande do Sul já entrou em colapso, com 100% de ocupação. Em uma iniciativa conjunta, procuradores da República de todo o país recomendam que o Ministério da Saúde adote "uma estratégia nacional com o estabelecimento de diretrizes para a definição de critérios regionais e locais de acompanhamento e implementação das medidas de emergência em saúde pública de importância nacional e internacional" de combate à pandemia.

De acordo com o documento, entre as medidas a serem adotadas, está o fechamento de rodovias e estradas para impedir a circulação de pessoas; a garantia da vacinação de idosos nos estados; o reforço de medidas sanitárias em portos e aeroportos; o aumento de estudos para identificar novas variantes do vírus; e o lançamento de uma campanha de comunicação para alertar da necessidade do uso de máscaras, do distanciamento social e da imunização contra a doença. Os procuradores também querem a garantia de que os estoques de oxigênio sejam suficientes para atender os pacientes. Os procuradores dão o prazo de cinco dias para que o Ministério da Saúde responda se acata a recomendação, sob pena de sofrer ações na Justiça.

Especialistas apontam que é necessário mudar políticas de saúde e intensificar medidas de isolamento para conter o avanço do vírus. Para a médica infectologista Eliana Bicudo, membro da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), o aumento acelerado de mortes e novas infecções já era esperado, considerando as aglomerações pelo país e o relaxamento das medidas sanitárias. "Esse aumento já era previsto, e ele é acentuado por causa das aglomerações no mês de fevereiro, principalmente no feriado de carnaval. Se você medir pelo número de viagens, os hotéis disseram que estavam cheios ao longo do carnaval, e isso é o reflexo dessas aglomerações. Então eu não digo que foi rápido, é elevado porque as aglomerações também foram elevadas", afirma.

Medidas severas

A especialista esclarece que não é possível prever, no momento, quando o país voltará à normalidade. E defende lockdown amplo. "O que a gente espera é que, com o lockdown, se de fato ele for respeitado e for de pelo menos maior que 10 a 15 dias, poderemos desafogar nosso sistema de saúde e ter condições de tratar e ter menos doentes morrendo por falta de atendimento. Agora, quanto tempo isso vai demorar, vai depender da resposta da população. E o aumento do número de pessoas imunizadas, como eu disse, é multifatorial e temos que ser tratados de uma forma completa", disse.

Julival Ribeiro, médico infectologista e membro da Sociedade Brasileira de Infectologia, lembra que há duas variantes no Brasil — a proveniente do Reino Unido e a de Manaus, chamada B1. "Ambas são altamente transmissíveis e, como são de maior transmissibilidade, acontece o maior número de casos, maior número de hospitalizações, maior necessidade de terapia intensiva e, infelizmente, maior número de mortes. E uma das coisas que não sabemos ainda, no Brasil, porque fazemos muito pouco nesse país, é o sequenciamento genômico da cepa do coronavírus para ver como ela está se distribuindo. Eu estou falando basicamente agora como está a distribuição da cepa do Reino Unido e da cepa de Manaus", destacou.

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Sequência de aglomerações 

Fernanda Strickland 

Maria Eduarda Cardim 

05/03/2021

 

 

Com agravamento da pandemia de covid-19, praticamente todos os estados adotaram medidas para aumentar o distanciamento social. De norte a sul do país, cidades e estados aplicaram novas medidas de lockdown para frear o crescimento de casos e evitar novos colapsos no sistema de saúde.

José David Urbaéz, diretor científico da Sociedade de Infectologia do DF, explicou que esse aumento vem desde outubro. "Na realidade, nunca tivemos uma circulação do vírus baixa; sempre mantivemos alta circulações virais. Se você tem altas circulações virais e flexibiliza de forma indiscriminada a abertura de todas as atividades, você incita a população a circular intensamente. E você não tem nenhum tipo de controle. Nós começamos, com altíssima circulação viral, a deixar que as pessoas se mobilizassen quase que normalmente, quase que sem nenhuma medida além de máscaras, distanciamento e higiene das mãos", disse.

De outubro de 2020 a fevereiro de 2021 houve eleições municipais, Enem, festas de fim de ano, carnaval— tudo isso com uma atividade econômica extremamente estimulada —, comentou o infectologista. "O vírus são as pessoas se movimentando, não tem outra saída. Aí você diz, 'Ah posso usar máscara e ficar distante'. As pessoas foram viajar, fizeram festas, reuniram-se em casa. Houve aglomerações também em reuniões de amigos, até shows. Os cinemas e academias estavam funcionando e restaurante sem ventilação adequada. Então, partindo de uma alta, você tem uma enorme onda de casos", observou Urbáez.

Série histórica

O Observatório Covid-19 da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) divulgou a série histórica de 17 mapas, que mostra o agravamento da pandemia em todo o país. O último levantamento publicado mostra 18 estados mais o Distrito Federal com mais de 80% dos leitos ocupados. É a primeira vez que mais de 13 estados atingem essa zona crítica.

"Como podemos observar na sequência de 17 mapas, mesmo no período entre a segunda metade de julho e o mês de agosto de 2020, quando foram registrados os maiores números de casos e óbitos, não tivemos um cenário como o atual, com a maioria dos estados e o Distrito Federal na zona de alerta crítica", informou a Fiocruz, em nota.

Entre julho e agosto do ano passado, período considerado o primeiro pico da pandemia no Brasil, o número máximo de estados que tiveram mais de 80% dos leitos de UTI ocupados foi três. Desde julho de 2020, os pesquisadores da Fiocruz publicam boletins quinzenais monitorando quatro indicadores básicos, entre eles a taxa de ocupação de leitos UTI covid-19 para adultos no Sistema Único de Saúde (SUS).

Estados com taxa de ocupação igual ou superior a 80% são classificados dentro da zona de alerta crítica (vermelho); com a taxa igual ou superior a 60% e inferior a 80%, são classificados dentro da zona de alerta intermediária (amarelo); já as unidades federativas com taxa inferior a 60% estão fora de zona de alerta (verde).

* Estagiária sob a supervisão de Carlos Alexandre de Souza