Título: Desconfiança externa permanece
Autor: Ricardo Rego Monteiro
Fonte: Jornal do Brasil, 02/03/2005, Economia & Negócios, p. A19
Países ricos defendem aumento de aperto fiscal
O Brasil ainda sofre com a desconfiança internacional, apesar de ter registrado crescimento de 5,2% do Produto Interno Bruto (PIB) e ter reduzido a vulnerabilidade externa nos dois últimos anos. Pelo menos é o que sugere o relatório Estudo Econômico Brasil 2005, da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), entidade que congrega os países mais industrializados do planeta. Ao divulgar o documento, ontem no Rio, a organização sugeriu o aumento da meta de superávit primário prevista para este ano, de 4,25%, para cerca de 5%. Presentes ao seminário, tanto o secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy, quanto o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, refutaram a proposta, ao reafirmar a meta deste ano em 4,25%. O economista Andrew Dean, diretor da OCDE, justificou que um aumento da meta para 5% ''daria mais conforto'' para o governo reduzir a dívida e a vulnerabilidade a crises externas.
- Gostaríamos de ver um superávit primário um pouco superior ao que existe no momento. Então, gostaríamos que o governo subisse a meta. A razão para isso é garantir que a vulnerabilidade à dinâmica da dívida possa gradualmente ser reduzida para que o Brasil não sofra com crises que venham a afetar os mercados econômicos no futuro. Não temos um número em mente, mas 5% daria mais conforto que 4,25% - afirmou o economista.
Apesar de reconhecer a necessidade de prosseguir nas reformas estruturais da economia, o secretário do Tesouro descartou mudanças na política fiscal.
- Estamos com os números certos. Não vejo motivo para mudanças - afirmou Levy.
- A OCDE faz considerações pertinentes, mas a meta tem que ser aquela que garanta de forma persistente a queda da relação dívida/PIB - corroborou Appy, após a apresentação do documento.
Levy justificou que, com o esforço atual, o Brasil conseguiu reduzir a relação dívida/PIB em quatro pontos percentuais em 2004, para cerca de 51,5% do PIB. Para este ano, o secretário diz acreditar em nova queda dessa relação, embora admita a necessidade de melhorar a chamada ''qualidade dos gastos públicos'', que também mereceu advertências do documento da OCDE.
A política fiscal foi o ponto mais criticado pelos economistas que compuseram a mesa de debates do seminário de lançamento do estudo. José Alexandre Scheikman, da Universidade de Priceton, foi o mais contundente de todos, apesar de listar os dados positivos sobre o país contidos no relatório. Para Scheikman, um Estado (nos níveis federal, estadual e municipal) que gasta o equivalente a um terço do PIB, como no Brasil, ''deveria ter melhores indicadores sociais e mais investimentos públicos''.
Segundo ele, embora a Previdência Social responda por boa parte dos gastos do governo, as despesas correntes representam o maior ralo de recursos públicos. Appy fez questão de lembrar, porém, que os gastos públicos do país em 2004, como proporção do PIB, ''foram menores do que em 2002''. O secretário do Ministério da Fazenda rebateu dizendo que o governo manterá as despesas ''sob controle''.
Apesar de concentrar as críticas na política fiscal, Scheikman não deixou de lado as estocadas na política monetária do governo. Para ele, os gastos do governo são a principal razão para a manutenção da taxa básica de juros (Selic) em um patamar tão alto. Com isso, advertiu, o governo interfere na redução da dívida pública.