O globo, n. 31972, 18/02/2021. País, p. 4

 

Respaldo unanime 

Carolina Brígido

Natália Portinari

Bruno Góes

Paulo Cappelli

18/02/2021

 

 

STF confirma prisão, mas Lira tenta articular saída que permita livrar deputado da cadeia

Por unanimidade, os 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) confirmaram ontem a prisão em flagrante do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), determinada no dia anterior pelo ministro Alexandre de Moraes. A decisão aumentou a pressão sobre a Câmara, onde o presidente da Casa, Arthur Lira (PPAL), busca uma saída para livrar o parlamentar da cadeia e ao mesmo tempo evitar uma confrontação direta com o Supremo.

Para sinalizar que está disposto a punir o deputado, mesmo sendo contra a prisão, Lira reativou o Conselho de Ética da Casa, paralisado desde antes da pandemia, e já encaminhou uma representação contra Silveira. O deputado foi preso em flagrante após publicar um vídeo com ataques à ordem democrática e ofensas e incitação à violência contra ministros do STF. No início da tarde de hoje, Alexandre de Moraes comandará uma audiência de custódia com Daniel Silveira, e deve manter a prisão. No mesmo horário, Lira reunirá o colégio de líderes da Câmara em busca de uma alternativa que crie ambiente para derrubar a prisão, que precisa ser submetida ao plenário da Casa.

No fim da tarde, Lira e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), têm audiência, anteriormente agendada, com o presidente do STF, Luiz Fux, o que também concorre para que a votação da prisão de Silveira não ocorra hoje.

A sessão de ontem no STF mostrou uma rara união da Corte em torno da decisão de Moraes. Todos os ministros votaram pela legalidade e manutenção da prisão. O atual decano do Supremo, Marco Aurélio Mello, deu o tom da reação do tribunal.

—Creio que ninguém coloca em dúvida a essa altura a periculosidade do preso nem a necessidade de preservar a ordem pública, mais especificamente as instituições — declarou o ministro, enfatizando que a Câmara terá de analisar uma decisão unânime da Suprema Corte. — Mantenho o ato de sua excelência (Alexandre de Moraes). Agora a Câmara dos Deputados, e não vejo nisso qualquer pressão, terá que apreciar não só um ato individual, mas um ato do colegiado, que imagino, formalizando uma só voz.

A unidade do STF em torno da prisão do deputado foi costurada no dia anterior. Moraes consultou alguns ministros antes de assinar o mandado de prisão e obteve apoio para colocar a medida em prática. O presidente da Corte, Luiz Fux, foi um dos que concordaram com a ideia de Moraes.

Em um dos trechos mais agressivos do vídeo, Daniel Silveira diz que gostaria dever ministros da Corte “na rua levando uma surra”.

Ao votar em plenário, Moraes defendeu a manutenção da prisão em flagrante ordenada contra Silveira. O ministro considerou “gravíssima” a conduta do parlamentar.

— As suas declarações (do deputado), a sua incitação à violência não se dirigiu apenas a diversos ministros da Corte, ofendidos pelas mais abjetas declarações, mas muito mais do que isso: suas manifestações dirigiam-se a corroera estruturado regime democrático e do Estado de Direito, fazendo apologiaà ditadura, ao AI -5, pleiteando o fechamento do STF, incitando a violência física, nos limites inclusive da morte de ministros, porque não concorda com posicionamentos —disse.

O ministro lembrou avida pregressa recente de Silveira. Citou que, em 2019, o parlamentar quebrou aplaca feita pela prefeitura do Rio em homenagem à vereadora Marielle Franco, assassinada meses antes. Moraes ressaltou também que, quando foi preso na terça-feira, Silveira voltou ase recusara utilizar máscara no Instituto Médico Legal (IML) e desacatou a policial que pediu que ele realizasse o procedimento.

SUSPENSÃO DO MANDATO

Ao proclamar o resultado unânime da sessão, o presidente da Corte, Luiz Fux, chegou a se esquecer do nome do deputado.

—O Supremo Tribunal Federal confirmou a prisão em flagrante do réu… do deputado... deputado Daniel… o nome todo como é, ministro Alexandre? —disse Fux, sendo ajudado pelo ministro.

O presidente do STF defendeu ainda que a Corte deve “zelar pela higidez do funcionamento das instituições brasileiras” e que se mantém “vigilante contra qualquer forma de hostilidade à instituição”.

Além de articular para derrubar a prisão no voto, Lira tentou costurar uma saída acordada com o ministro Alexandre de Moraes, que poderia ser a substituição da ordem de prisão por medidas cautelares, como o afastamento do mandato, o que poderia acontecer durante a audiência de custódia. O diagnóstico de aliados do presidente da Câmara, porém, é de que a chance de esse acordo prosperar é baixa.

Diante da dificuldade de recuo do Supremo, Lira passou a ligar para líderes partidários com o objetivo de sondar a posição das bancadas em relação à questão. Além de marcar a reunião do colégio de líderes para hoje, ele articulou a ação da Mesa Diretora e determinou a reativação do Conselho de Ética. A ideia é dar andamento a um processo disciplinar, que pode levar à cassação do mandato. Assim, Lira quer sinalizar que, mesmo se a prisão for revertida, sua intenção não é que o deputado fique impune.

DESGASTE EVITÁVEL COM STF

Uma outra possibilidade que seria considerada um meio termo entre aliados de Lira é a suspensão do mandato de Daniel Silveira. O assunto é debatido entre os integrantes da Mesa Diretora. O passo seguinte seria levara hipótese voto. Não há previsão regimental para isso, mas a ideia é punir o deputado como afastamento da atividade e recusar o pedido de prisão.

Em conversas com interlocutores, Arthur Li ratem defendido revertera prisão de Daniel Silveira para que não se crie um precedente negativo. O entendimento do presidente da Câmara é que a decisão não está de acordo com o ordenamento legal.

No entorno de Lira, porém, lideranças do Centrão acreditam que o desgaste de confrontar o Supremo não vale apena nesse caso. Aliados dizem que Daniel Silveira extrapolou o limite da imunidade parlamentar ao agredir os ministros do Supremo com ofensas pessoais. Por isso, revertera prisão significaria um abriga indesejável entre Poderes.

O presidente Jair Bolsonaro evitou durante o dia de ontem se posicionar sobre o caso. O líder do governo, Ricardo Barros (PP-PR), integrante do Centrão, disse ser pessoalmente contra a prisão, mas que esse não era um assunto do governo. Já os partidos de oposição anunciaram que vão votarem bloco pela manutenção da prisão de Silveira.