Correio Braziliense, n. 21109, 11/03/2021. Economia, p. 6

 

Governo cede na PEC emergencial

Denise Rothenburg 

11/03/2021

 

 

Para garantir a aprovação da PEC Emergencial com o congelamento de salários toda vez que as despesas alcançarem 95% das receitas correntes, o governo aceitou retirar da proposta a suspensão das promoções e progressões de carreira a todos os servidores públicos, o que custará, em média, R$ 1,2 bilhão ao ano para o Tesouro Nacional. A decisão de permitir as promoções, com o respectivo aumento de salário correspondente em cada carreira, foi tomada depois que o líder do governo, Ricardo Barros (PP-PR), percebeu que havia um movimento para aprovar um destaque do PT, que tiraria da emenda constitucional todas as possibilidades de congelamento de salários. Diante do acordo, a ideia era varar a madrugada votando os destaques e o segundo turno da PEC, sem maiores alterações no texto, apesar da pressão de diversas categorias.

Desde segunda-feira, os deputados foram bombardeados com mensagens no celular de várias categorias, em especial, policiais civis, militares e federais, pressionando para que essa parte da PEC fosse retirada. O presidente Jair Bolsonaro chegou a pedir ao relator, Daniel Freitas (PSL-SC), que atendesse o pedido dos policiais. Os líderes não gostaram de ver o presidente tentar se sair bem com o segmento que o apoia, deixando para os parlamentares a imagem de "carrascos". Começou então, uma revolta na base do governo, contida por uma conversa com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e com o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos.

Diante do cenário da economia, foi dado o seguinte recado a Bolsonaro: ou ele aceitava que a Proposta de Emenda Constitucional Emergencial era obra do governo, ou, se o Planalto quisesse mudanças na proposta, o Congresso faria as alterações e, depois, o governo que arcasse com as despesas. O presidente, então, se recolheu perante os policiais. O texto da PEC que estabelece os gatilhos do congelamento foi mantido por 319 votos – 11 além dos 308 necessários para as votações de emendas constitucionais.

Politicamente, os congressistas estão cansados de o governo apresentar propostas e, depois, quando percebe que desagrada setores que apoiam o presidente Jair Bolsonaro, o capitão "tira o corpo fora" e deixa os congressistas com o ônus de aprovar medidas antipáticas sugeridas pelo Executivo. O presidente da Câmara, Arthur Lira, tem sido muito incisivo ao dizer que o Congresso não negará apoio ao Planalto. Porém, o governo tem que ser o responsável por aquilo que propõe. Se fosse para retirar os policiais do congelamento de salários, iriam sair todas as categorias, como, aliás, foi feito na questão das promoções e progressões de carreira.

Auxílio emergencial
O outro "perigo" para a economia veio tarde da noite, quando os deputados apreciaram o teto de R$ 44 bilhões para pagamento do auxílio emergencial. A oposição queria elevar esse valor, justamente, para, na hora de votar o auxílio, ganhar uma margem que permita aumentar o valor do benefício. Mantido o limite de 44 bilhões, a perspectiva é de que o Congresso não tenha condições de elevar os R$ 250, a serem definidos por Medida Provisória, assim que o Congresso sancionar a PEC.

Com o Brasil na posição de epicentro da pandemia no mundo e o registro de 2.286 mortes nas últimas 24 horas, os deputados pressionavam pela necessidade de ampliar esse teto para completar o pagamento do auxílio emergencial. Afinal, sem vacinação em massa e com os hospitais em risco de colapso em vários estados, o distanciamento social surge como uma forma de tentar segurar a proliferação do vírus, a fim de desafogar o sistema de saúde. Logo, o auxílio ganha um peso maior na vida das pessoas que precisam se proteger da doença, ficando em casa.

Foi nesse momento que a discussão voltou a esquentar, e o presidente Arthur Lira tentou correr com a sessão. O líder da minoria, Glauber Braga (PSL-RJ), estrilou: "Nenhum projeto de coronel vai calar a minha voz. Eduardo Cunha teve seu destino traçado", reclamou, e Arthur Lira cortou seu microfone. "A única pessoa que se achava dona desta Casa está presa", fez coro a deputada Erika Kokay (PT-DF).

O fato de os deputados estarem na sessão remota, ou seja, sem a presença física no plenário, prejudicou a estratégia da oposição e dos servidores, que ficaram impedidos de fazer um corpo a corpo no plenário. Em temas polêmicos e sessões presenciais, deputados costumam paralisar as votações e fazer vários pedidos ao mesmo tempo e, diante da confusão, aplausos e gritos, a oposição consegue virar o jogo. Porém, nas virtuais, o presidente da Casa tem mais condições de controlar o plenário. Sorte do governo.

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Policiais e auditores pressionam deputados 

Fernanda Strickland 

11/03/2021

 

 

Inconformados com o andamento da PEC Emergencial no Congresso Nacional, integrantes da União dos Policiais do Brasil (UPB), que representa entidades de policiais de vários segmentos do país e é formada por ao menos 24 instituições da área de segurança pública, dispararam diversar críticas ao governo do presidente Jair Bolsonaro. Os policiais cobram serem poupados do congelamento de salários proposto pela União.

Edvanir Paiva, presidente da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (AFPD), comentou que, na PEC da Previdência, não viu o vice-presidente da República, general Hamilton Mourão, exigindo o sacrifício dos militares. "Nós vimos, em todos os momentos de arrocho dos policiais, que estão na frente de batalha em todos os momentos, inclusive na pandemia, falas do governo federal dizendo de contribuições, da necessidade de que as categorias dessem sua cota de participação", comentou o dirigente.

Paiva ressaltou que as categorias tiveram salários reduzidos a partir da reforma da Previdência, estão com contracheques congelados, desde 2016 não encaminham nenhum tipo de negociação salarial, nem para reposição de perdas inflacionárias. "Nosso povo está morrendo para trabalhar. Qual é mais o sacrifício que nós temos de fazer, vice-presidente da República?", questionou Paiva.

O protesto do dirigente se dirigia a Hamilton Mourão, que, mais cedo, comentou a situação dos policiais e a PEC Emergencial. "Não resta dúvida de que o segmento da segurança pública é extremamente importante porque provê uma das necessidades básicas da população. Mas, da mesma forma que a gente reclama que não pode haver tratamento desigual, então, as pessoas têm de compreender a situação fiscal que o governo se encontra — não só o federal, mas os dos estados e municípios — e que é um momento de crise, que requer medidas em que todos têm que dar a sua cota de sacrifício", disse o vice-presidente.

André Luiz Gutierrez, presidente da Confederação Brasileira dos Policiais Civis (Cobrapol), afirmou que a categoria não está satisfeita com os trâmites da PEC Emergencial no Congresso. Alegou que os gatilhos de congelamento de salários, contratações e progressões nas carreiras impõem um "lockdown ao funcionalismo", especialmente das forças de segurança. "Essa PEC decreta o bloqueio da segurança pública e a categoria vai reagir", advertiu. André também classificou a inclusão do auxílio emergencial no texto como "chantagem" para forçar a votação.

Em nota, a UPB criticou a conduta do governo ante a disseminação da covid-19. "O Governo brasileiro se aproveitou de um momento de calamidade e comoção para passar um pacote de medidas fiscais que em nada contribuirão para o arrefecimento da pandemia, que precisa ser erradicada com auxílio financeiro compatível, vacinas, distanciamento e uso de máscaras, e não por meio do desmonte do serviço público brasileiro", protestou a entidade.

Luís Antônio Boudens, presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), argumentou que o governo diz algo à opinião pública, mas negocia o oposto nos bastidores. "O que está acontecendo é um discurso em público, enquanto, nos bastidores, é feita outra proposta, que vai abalar e muito as nossas carreiras. A mais penalizada, ao final, vai ser a sociedade brasileira. Ao contrário do que o governo prega, o Estado vai sair enfraquecido, porque vai enfraquecer seu elemento mais importante, que é o elemento humano das forças policiais", disse.

Demissão coletiva
A reação à PEC Emergencial não desapontou somente os servidores da Segurança Pública. A cúpula da Receita Federal chegou a ensaiar um pedido de demissão coletivo. A entrega dos 220 cargos comissionados e funções de chefia foi convocada pelo Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil (Sindifisco). A avaliação interna era de que a renúncia em massa seria um último e contundente gesto para marcar oposição à proposta. "Sem o apoio do governo, e sem possibilidade de qualquer discussão, será muito difícil qualquer mudança nesse roteiro. O texto da PEC coloca nossa atividade no terceiro escalão de importância, fere de morte o nosso órgão e exige um posicionamento firme e contundente de todos nós", conclamou o presidente do sindicato, Kleber Cabral, em vídeo publicado ontem. Na gravação, Cabral alertou que a PEC vai abrir "uma espiral de desmonte e de desestruturação da Receita Federal". "Sem promessas, sem novas cartas. Agora é a hora da entrega dos cargos", disse o presidente do Sindifisco.

O clima arrefeceu com o resultado da votação na Câmara dos Deputados. O plenário aprovou um destaque do PDT e manteve a vinculação dos repasses de cerca de R$ 65 bilhões em receitas hoje carimbadas para órgãos, fundos e despesas específicas. A desvinculação afetaria a prerrogativa garantida ao Fisco e às administrações tributárias estaduais e municipais de terem despesas custeadas por fundos alimentados a partir de multas arrecadadas por esses órgãos.

Com Agência Estado.

*Estagiária sob supervisão de Carlos Alexandre de Souza