O globo, n. 31973, 19/02/2021. País, p. 6

 

Bolsonaro ignora apelos por apoio a Silveira

Gustavo Maia

19/02/2021

 

 

Durante transmissão ao vivo, presidente silencia sobre prisão de deputado mesmo diante de pressão de apoiadores

Quase dois dias após a prisão do deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ), o presidente Jair Bolsonaro ignorou a situação do aliado durante quase uma hora de transmissão ao vivo na internet na noite de ontem. O silêncio foi mantido apesar da crescente pressão por parte de apoiadores nas redes sociais — e nos comentários da live —por uma manifestação do presidente contra a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

Integrante da tropa de choque bolsonarista na Câmara, Silveira gravou um vídeo na última segunda-feira no qual proferiu ofensas e ataques a ministros do STF, instigou atos violentos e fez apologia ao AI-5, instrumento de repressão mais duro no período da ditadura militar no Brasil. Na noite de terça, ele foi preso em flagrante em sua casa, em Petrópolis (RJ), por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo. A decisão foi referendada pelos outros dez ministros da Corte no dia seguinte.

Durante o dia de ontem, a hashtag #DanielSilveiraLivre chegou a ficar em primeiro lugar entre os assuntos mais comentados do Twitter. No início da manhã, Bolsonaro se reuniu no Palácio da Alvorada com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PPAL), e com seu filho, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ). Lira vinha tentando negociar uma saída para o caso do parlamentar, mas não teve sucesso. O plenário da Câmara dos Deputados deve votar hoje, a partir das 17h, se mantém ou derruba a medida.

Na quarta-feira, Bolsonaro e seus auxiliares mais próximos se mantinham afastados da prisão de Silveira quando o líder do governo na Câmara, o deputado Ricardo Barros (PP-PR), anunciou seu voto pela soltura de Silveira, “pela liberdade de expressão, de opinião e pela imunidade parlamentar, diretos garantidos na constituição federal”. Nas palavras de Barros, “o impasse” é entre o Legislativo e o Judiciário, e o governo “não faz parte da questão”. O Palácio do Planalto segue tentando se blindar da confusão causada pelo aliado.

No clã Bolsonaro, a primeira e tímida manifestação sobre o caso foi do vereador do Rio Carlos Bolsonaro (Republicanos), ainda que de forma indireta. Pouco depois das 9h da manhã da quarta-feira, ele desabafou no Twitter: “Sinto meu estômago embrulhado como não sentia há tempos!”.

DECRETO DAS ARMAS

No mesmo dia, à noite, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) publicou um tuíte informando que, “dentre outros fatores” votaria nesta quinta pela libertação do colega “em nome das garantias da imunidade parlamentar, liberdade de expressão, devido processo legal, ampla defesa e contraditório”.

Durante a transmissão ao vivo, Bolsonaro também defendeu os decretos que editou na semana passada sobre armas. Ele comentou que “partidos pequenos” acionaram o STF para suspender os atos, mas ressaltou que não deu porte a ninguém. Ele disse ainda que seus auxiliares já tiveram acesso às ações, que não apontariam nenhuma irregularidade.

Dirigindo-se à categoria de vigilantes, que segundo ele o cobra para obter o porte de armas, o presidente afirmou que a mudança precisa ser feita por lei e não por decreto — porque ele estaria legislando de forma inconstitucional.

Na live, Bolsonaro estava acompanhado do ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, que chegou alguns minutos atrasado, e do presidente do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), o coronel do Exército Marcos Heleno Guerson Júnior, nomeado por ele um ano atrás.

Ao fim da transmissão, Bolsonaro anunciou que vai viajar no sábado para Campinas (SP) para participar de uma reunião da sua turma do Exército da década de 1970, que deve contar com cerca de 60 pessoas. Ele aproveitou a ocasião para contar causos dos tempos em que era militar da ativa.