Título: Hora de Bush abandonar o barco
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 26/11/2008, Tema do Dia, p. A2
THE NEW YORK TIMES
O Dia de Ação de Graças é semana que vem, e o presidente Bush poderia transformá-lo num feriado realmente especial se despedindo. É sério. Temos uma economia em frangalhos e um vácuo no poder. Bush ¿ atualmente numa viagem ao Peru para encontrar líderes asiáticos que já não se importam com o que ele pensa ¿ não se deu conta, ou talvez não teve energia suficiente para fazer algo útil. Sua contribuição mais recente para resolver a crise financeira foi palestrar para os representantes das economias mais importantes do mundo sobre as glórias do capitalismo do livre mercado.
Pôr o presidente-eleito Barack Obama no comando imediatamente não é impossível. O vice-presidente Dick Cheney, obviamente, teria de renunciar, bem como Bush. Na verdade, só para garantir, o vice-presidente tem de renunciar primeiro (Estamos desesperados, não loucos). Depois, a presidente da Câmara Nancy Pelosi assumiria a presidência até 20 de janeiro. Obviamente, ela cederia o cargo para o futuro executivo-chefe do partido dela, e Obama poderia começar a governar.
Como um bônus, Pelosi seria a primeira presidente na Casa Branca este ano. Alguns apresentadores de talk shows com tendência para a direita poderiam, no entanto, sucumbir à apoplexia (perda total ou parcial de consciência e sensações). Seria terrível, mas talvez tenhamos que correr o risco em nome de um bem maior.
Alguém pode levantar as mãos? Quantas pessoas querem que George saia e Barack assuma? Muitos americanos têm contado os dias para a saída de Bush durante todo o ano em seus calendários de 2008. Sei que isso vem acontecendo porque muitas pessoas me parabenizaram quando, no dia 1º de fevereiro, Bush citou uma frase de um velho artigo meu. (Acho que não precisamos apenas cortar impostos da classe média, acho que devemos reduzir os impostos) Essa tirada nem chegou aos pés daquela do dia 5 de fevereiro (Temos que fazer o bolo crescer) ou a de 21 de fevereiro (Entendo o crescimento do pequeno empresário. Eu era um) Mas nós fazemos o que podemos.
No passado, os presidentes não encararam bem sugestões para deixarem os cargos antes do fim do mandato. O senador J. William Fulbright sugeriu um plano nessa linha quando Harry Truman estava chegando ao fim de um mandato num estado de profunda impopularidade, e Truman o chamou de Halfbright (Meio brilho, fazendo trocadilho com o sobrenome do senador que poderia ser traduzido como Brilho total) pelo resto da vida.
Bush pode não gostar da idéia de renunciar antes de ter a chance de acender a árvore de Natal ou salvar o último peru presidencial. Ainda tem algumas viagens planejadas. E regulações de último minuto para editar. (Tantos parques nacionais para roubar, tantas espécies em perigo de extinção para exterminar). Depois precisa fazer as malas. Por outro lado, ele pode querer deixar seu legado do jeito que está.
Em dias mais felizes, Bush talvez tenha nutrido esperanças de entrar para a lista dos presidentes mais medíocres dos EUA, mas em algum lugar entre o Iraque e Katrina, essa meta se tornou uma montanha muito alta para se escalar. No entanto, pode ainda ter a chance de evitar o fundo do poço, posto ocupado atualmente por James Buchanan, pelo menos em minha opinião. Buchanan conseguiu o título de pior presidente nos dias entre a eleição de Abraham Lincoln e a posse, quando os estados do Sul começaram a se separar e Buchanan, depois de estrebuchar um pouco, não fez absolutamente nada.
"Não fazer nada é a pior atitude que um presidente pode tomar" disse o historiador Michael Beschloss. Em vez de não fazer nada, se Bush optar por desistir do emprego, é possível que algum dia a história possa elevá-lo à posição dos que estão abaixo da média. Melhor que Franklin Pierce! Mais esperto que Warren Harding! E mais saudável que William Henry Harrison!
Quem talvez não gostaria desse plano seria Barack Obama. Quem ia querer tomar as rédeas antes do tempo com os problemas da indústria de automóveis? Os presidentes das grandes corporações fabricantes de carros dos EUA estão tão desanimados que não conseguiriam nem mesmo sobreviver a audiências feitas por membros do Congresso que, na verdade, quiseram ajudá-los. De fato, quando alguém pergunta a você de quanto dinheiro você precisa, a resposta não deveria ser muito.
Uma tomada instantânea de poder também poderia arruinar o plano da equipe de Obama de ter a transição presidencial mais bem-organizada e correta da história. Encurtar o transição e começar o governo transformaria sua planejada marcha em direção ao poder numa miscelânea louca. Muitos dos escolhidos para o governo ainda estão respondendo aos questionários de 62 páginas.
Mas ao mesmo tempo em que não há drama com Obama, vivemos uma versão em Technicolor de Os perigos de Paulina (The Perils of Pauline). Detroit está amarrada aos trilhos e o trem está a caminho! O governo da Califórnia está afundando! Do jeito que as coisas vão, quando a posse acontecer, a taxa de desemprego chegará a 10% e o Dow Jones estará em 10. É hora de mudança.