O globo, n. 31975, 21/02/2021. Pais, p. 10

 

Bolsonaro diminui ritmo de postagens nas redes sociais

Victor Farias

21/02/2021

 

 

Número de publicações no Twitter vem caindo desde o segundo semestre do ano passado. Para especialistas, aproximação com Centrão, postura que põe em contradição parte de seu discurso eleitoral, obriga presidente a reduzir atritos

Presença ainda frequente nas redes sociais — foi por meio de um post que a troca na presidência da Petrobras foi anunciada na sexta-feira —, o presidente Jair Bolsonaro vem diminuindo a assiduidade on-line. Desde outubro do ano passado, o número de publicações no Twitter está abaixo do volume registrado desde o início do governo: em dezembro, atingiu a marca mais baixa, 94 mensagens, quase 50% a menos do que a média mensal de 183. Na semana passada, aconselhado por auxiliares, não se manifestou publicamente sobre a prisão do deputado bolsonarista Daniel Silveira (PSL-RJ) — a detenção foi confirmada pela Câmara na sexta, em votação expressiva: 364 parlamentares defenderam a ordem de prisão expedida pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A conduta, desta vez, foi oposta à de um outro momento turbulento. Em um dos meses mais delicados para o Palácio do Planalto, março do ano passado, Bolsonaro publicou uma média de 11 mensagens por dia. Na ocasião, início da pandemia, o presidente vinha participando semanalmente de protestos em que manifestantes pediam o fechamento do Congresso e do STF. No segundo semestre, em paralelo à redução de publicações, Bolsonaro passou a ser submetido ao crivo do Twitter em relação a mensagens consideradas como estimuladoras da desinformação ou que violavam as regras de uso da plataforma. O presidente teve um post sobre tratamento precoce da Covid-19 marcado como “enganoso”. No mês passado, foram 101 mensagens, número também inferior ao habitual.

DISCURSO CONTRADITÓRIO

A segunda metade de 2020 marcou também um movimento que se intensificou neste ano: a aproximação com o Centrão e a negociação com o Congresso, numa prática que botou em contradição parte de seu discurso eleitoral, desde sempre reverberado pela militância bolsonarista nas redes. Isso pode ter colaborado, na visão de analistas, para uma redução do engajamento de Bolsonaro.

— Nessa época, ele começa essa aproximação com o Centrão, então é um conjunto de fatos não necessariamente negativos, mas que não são muito da agenda do governo. Não teria motivo para ficar tuitando, é melhor ficar abaixo do radar. Vacinas pelo mundo, derrota do Trump, aproximação do Centrão, começo da segunda onda da Covid-19 —avalia o cientista político Rafael Sampaio, da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Para Creomar de Souza, professor da Fundação Dom Cabral e fundador da consultoria Dharma, a necessidade de moderar o discurso presidencial para evitar crises com outros poderes pode ter impactado na frequência nas redes. Desde meados do ano passado, Bolsonaro tem se aproximado de políticos tradicionais e de autoridades do Judiciário, em busca de sustentação para seu mandato. Ele destaca que o presidente teve de deixar um pouco de lado a postura de campanha permanente:

— Essa lógica de governar pelo Twitter, fazendo campanha constante e mantendo o frisson das bases, é boa para manter a chama acesa, mas é muito difícil quando você trabalha em uma lógica de que isso gera atrito constante e dificulta muito a governabilidade.

No primeiro ano de mandato, Bolsonaro publicava uma média de 191 tuítes por mês, valor que subiu para 210 em 2020, apesar da diminuição no índice nos últimos meses. Logo no início do governo, em março de 2019, em meio ao carnaval, o presidente publicou um vídeo em que um homem urinava em outro, associando a cena aos blocos de rua. No ano passado, o presidente chegou a publicar mais de 300 postagens em dois meses considerados isoladamente.

Como consequência da redução da presença, o número de interações também vem caindo. Nos três primeiros meses do mandato, as publicações de Bolsonaro recebiam, em média, 34.081 curtidas, número que passou a 16.066 no terceiro trimestre de 2020 e a 18.212 no quarto. Quando comparados o pior resultado com o melhor, obtido no terceiro trimestre de 2019 (36.229), há uma redução de 55,6% no índice.

MENOS RETUÍTES

Em relação aos retuítes, Bolsonaro tinha uma média de 4.480 entre janeiro e março de 2019, número que caiu para 2.836 no terceiro trimestre de 2020 e para 2.593 nos últimos três meses do ano passado. A redução é de 50%, quando comparado o pior período com o melhor, também obtido no terceiro semestre de 2019, quando a média era de 5.166 republicações.