O globo, n. 31977, 23/02/2021. Sociedade, p. 10
Exigência do Brasil emperra venda de vacina, diz Pfizer
Julia Lindner
23/02/2021
Governo rejeita cláusula que responsabiliza União por eventuais efeitos adversos; farmacêutica Ofereceu 70 milhões de doses
A Pfizer informou na manhã de ontem a senadores que mantém como condicionante para a vendada vacina contra a Covid-19 ao Brasil uma cláusula garantindo a responsabilização da União por eventuais efeitos adversos do imunizante. No último dia 6, a empresa pediu o registro definitivo da vacina à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
De acordo com o senador Randolfe Rodrigues (RedeAP), a exigência foi reforçada durante conversa de representantes da empresa no Brasil com ele e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). Em um cenário marcado pela escassez mundial de imunizantes, os congressistas têm se mobilizado para viabilizar o acordo por meio de mudanças no Legislativo.
Randolfe Rodrigues destacou que apresentou uma emenda que contempla o teor da cláusula na Medida Provisória em tramitação na Câmara sob remedidas excepcionais para a aquisição de vacinas e insumos no país.
— Nós temos uma circunstância hoje, a MP 1026, em que apresentamos uma emenda pela qual a União passa a assumir a responsabilidade civil pela vacina. Essa cláusula é uma exigência contratual, e tanto a Pfizer quanto a Janssen deixaram claro que precisam desse dispositivo.
IMPASSE
A vacina da Janssen, braço da Johnson & Johnson, é especialmente atrativa por ser de dose única, com resultados de eficácia global de 66%. E a da Pfizer, desenvolvida em parceria com o laboratório alemão BioNTech, apresentou mais de 90% de eficácia nas análises preliminares dos testes da fase 3.
A emenda apresentada pelo senador determina que a União seja responsável por “eventuais efeitos adversos decorrentes das vacinas”. A previsão na emenda estava na Medida Provisória editada em janeiro para a aquisição de vacinas, mas acabou retirada do texto final pelo governo. A exigência foi justamente um dos principais entraves na negociação entre a farmacêutica e o Brasil e foi criticada em diferentes ocasiões pelo ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, e pelo presidente Jair Bolsonaro.
Em nota divulgada no fim de janeiro, a pasta argumentou que a compra do imunizante da Pfizer causaria “frustração” entre brasileiros porque o laboratório teria oferecido “poucas doses”. As exigências contratuais foram definidas como “leoninas e abusivas” pelo ministério. Agigante farmacêutica chegou a oferecer 70 milhões de doses ao Brasil.
No encontro, o parlamentar da Rede contou que o presidente da Pfizer no país voltou a afirmar que a empresa iniciou conversas como Brasil em junho. De acordo com ele, a vacina está sendo aplicada em 69 países e todos eles aceitaram a cláusula. As exceções são Brasil, Argentina e Venezuela.
Depois da reunião, o presidente do Senado sugeriu mudanças legislativas ao ministro, como forma de solucionar o impasse na compra de vacinas. Entre elas está a possibilidade de permitira participação de estados, município seda iniciativa privada na aquisição dos imunizantes.
Mais cedo, Pacheco ponderou que o Brasil não pode exigir modificações específicas para o país nas negociações, caso as cláusulas propostas já tenham sido adotadas em tratativas com outras nações.
No domingo, o Ministério da Saúde divulgou nota informando que pediu à Casa Civil orientação sobre como encaminhar a negociação com a Pfizer e a Janssen. Segundo a pasta, a expectativa é de que a Casa Civil encaminhe manifestação até sexta-feira. O ministério alegou que a “falta de flexibilidade das empresas” estaria travando a negociação.
O GLOBO questionou o ministério sobre as movimentações no Congresso para viabilizar a aquisição da vacina da Pfizer, mas não obteve resposta até a conclusão desta edição.