O globo, n. 31977, 23/02/2021. Sociedade, p. 10

 

Manaus: empresa diz que Pazuello só retornou às vésperas de colapso

Paula Ferreira

Aguirre Talento

23/02/2021

 

 

White Martins conseguiu reunião em 11 de janeiro, três dias antes de faltar oxigênio

Em depoimento ao Ministério Público Federal, o gerente da empresa fornecedora de oxigênio para o governo do Amazonas, Christiano Cruz, relatou que a White Martins só conseguiu se reunir com integrantes do Ministério da Saúde para relatar pessoalmente o grave problema na disponibilidade de oxigênio no Amazonas às vésperas do colapso.

A equipe do ministro Eduardo Pazuello teria recebido ofício da empresa no dia 8 de janeiro, alertando sobre a insuficiência dos estoques de oxigênio, mas só se reuniu com a White Martins no dia 11. Três dias depois, a rede entrou em colapso, e pacientes começaram a morrer por falta de oxigênio.

O relato reforça as suspeitas da Procuradoria-Geral da República (PGR) de que o Ministério da Saúde demorou para tomar ações concretas para evitar o problema. Cruz afirma que fez sucessivos alertas à Secretaria de Saúde desde o início de janeiro sobre a incapacidade de suprir o crescente consumo de oxigênio pelos pacientes de Covid-19. Representantes do ministério já estavam em Manaus desde o início do ano, mas não houve contato com a White Martins.

— O primeiro contato com o Ministério da Saúde foi numa reunião, agendada por intermédio da Secretaria de Saúde do Estado do Amazonas, aí é que a gente teve contato com o ministro Pazuello e acredito que com o assessor dele, o senhor Airton Cascavel. Isso foi no dia 11 de janeiro — narrou em seu depoimento.

Gerente de desenvolvimento de negócios medicinais da White Martins, Cruz foi ouvido como testemunha pelo MPF do Amazonas no inquérito civil público que investiga as responsabilidades sobre o colapso na rede de saúde do Estado em janeiro. O GLOBO teve acesso ao vídeo do depoimento.

De acordo com Cruz, a conversa com Pazuello foi “muito curta” e serviu apenas para o ministro encaminhar o assunto ao coronel Nivaldo Moura Filho, responsável por cuidar da logística dos voos da Força Aérea Brasileira que levariam cilindros de oxigênio para reforçar o estoque no estado.

— A reunião foi pra falar de oxigênio, das dificuldades de logística, do incremento do consumo e da necessidade de apoio do ministério pra White Martins e Estado do Amazonas. Ficou claro para eles que desafios que a gente teria pra frente. Agora, por que eles só estavam tratando comigo naquele momento, isso não fez parte da conversa —disse.

Cruz retratou um cenário de caos das autoridades de Saúde do Amazonas e disse que não foi traçado um planejamento sobre o crescimento da demanda de oxigênio, o que trouxe dificuldades para que a empresa pudesse calcular o reforço necessário.

— Não lembro se foi falada a palavra “colapso”, mas, a partir do momento em que a gente diz que “do jeito que tá, se você não me ajudar, eu não consigo fornecer”, é a mesma coisa. (...) A gente falou de forma clara que precisava de ajuda —narrou ao MPF.