O globo, n. 31978, 24/02/2021. Economia, p. 17

 

Petrobras

Bruno Rosa

Daniel Gullino

João Sorima Neto

24/02/2021

 

 

Conselho abre caminho para a troca de comando da estatal

Em uma reunião tensa, marcada por divergências, e que se estendeu por cerca de 12 horas, o Conselho de Administração da Petrobras aprovou a convocação de assembleia geral extraordinária para analisar o nome do general Joaquim Silva e Luna, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro, para assumir o comando da estatal. Como antecipou o colunista do GLOBO Lauro Jardim, não houve unanimidade. Em um conselho de 11 integrantes, seis votaram a favor da assembleia, que abre caminho para a escolha do governo.

Outros três integrantes votaram contra. O atual presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, que ocupa um lugar no conselho, não votou, assim como Nívio Ziviani, afastado por licença médica. A data da assembleia não foi marcada, e prazo é de no mínimo 30 dias após a convocação. Castello Branco e os diretores devem cumprir o mandato até o final, em 20 de março.

Desde o início, houve divisão de três grupos no conselho com posições divergentes: militares e a representante dos trabalhadores; os outros cinco indicados pela União e os conselheiros selecionados pelos acionistas minoritários.

Entre os indicados pelo governo, apesar da resistência à troca, havia receio de contrariar a União. Na assembleia geral, o conselho vai ser destituído, masa União acenou com a recondução dos integrantes ao cargo, exceto Castello Branco.

AÇÕES TÊM DIA DE ALTA

Os conselheiros registraram em ata e em ofício à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que o objetivo é zelar pelos padrões de governança da estatal, com atenção especial ao respeito à política de preços.

A preocupação nãoéà toa. Parte do conselheiros teme ser responsabilizada caso a mudança seja questionada na Justiça. Escritórios já trabalham em ações coletivas contra a troca no comando, anunciada por Bolsonaro na sexta-feira nas redes sociais, um dia após se queixar dos reajustes do diesel e da gasolina. A própria CV M já abriu processo para investigar aforma como a mudança foi anunciada.

Na reunião, Castel lo Branco mostrou indignação coma forma como foi tratado pelo presidente e recebeu o apoio de quase todos os conselheiros.

Ele ainda disse que vai falar ao mercado após a divulgação dos resultados da empresa, marcada para hoje.

Ontem, Bolsonaro disse que é “infundado” afirmar que teria interferidona Petrobras eque a estatal vai“melhorar ”. E acenou coma possibilidade demais alterações ao afirmar que o governo levará adiante qualquer mudança que julgar necessária.

— O que eu interferi na Petrobras, alguém responde aí? O que eu falei para baixar o preço? Nada, zero — disse. — Tem muita coisa errada, o novo presidente vai dar uma arrumada lá.

O presidente comemorou a alta das ações da Petrobras. Depois de registrara segunda maior queda de sua história na Bolsa, de 20%, no pregão de segunda-feira e de acumular perda de quase R$ 100 bilhões em valor de mercado em dois dias, as ações da Petrobras deram sinais de recuperação. Os papéis ordinários (com voto) subiram 8,96% e os preferenciais, sem voto, avançaram 12,17%. A Bolsa subiu 2,27%, aos 115.227 pontos. O dólar caiu 0,24%, a R$5,44.

Para analistas, mais do que uma percepção de mudança em relação aos rumos da companhia, a alta indica que a ação ficou barata. Além disso, há expectativa em relação ao balanço da companhia.

—É oportunidade de preço. Sobre a criação de valor para a companhia ainda há muita dúvida com a troca de comando. Não se sabe como será a Petrobras daqui para a frente—disse Ilan Arbetman, an alistada Ativa Investimentos.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), minimizou a troca de comando e disse que houve “um clima de bolha histérica” em live promovida pelo Valor:

— Não vejo risco de ingerência nos preços.

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Procuradoria junto ao TCU pede que estatal suspenda troca

Geralda Doca

24/02/2021

 

 

Objetivo é dar tempo à Corte para julgar se Bolsonaro interferiu na empresa. Eletrobrás cobra explicações ao Ministério de Minas e Energia

O procurador do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), Lucas Rocha Furtado, entrou com representação para que a Corte determine, em caráter cautelar, que a Petrobras não realize qualquer atividade relacionada ao comando da empresa até que o órgão julgue se o presidente Jair Bolsonaro interferiu na estatal.

O pedido se estende também à decisão do presidente Jair Bolsonaro em reduzir impostos federais sobre o diesel e o gás de cozinha, sem apontar de onde viriam as receitas para cobrir essa renúncia fiscal.

INTERESSES PARTICULARES’

Na avaliação do procurador, as medidas tomadas pelo presidente Bolsonaro são indícios de “sobreposição de interesses particulares com fins eleitoreiros ao interesse público e desvio de finalidade do ato administrativo, com ofensa aos princípios constitucionais da legalidade e da moralidade", diz trecho do pedido.

Furtado solicita que o TCU avalie os motivos da substituição do presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, pelo general Joaquim Silva e Luna, anunciada por Bolsonaro nas redes sociais sexta-feira.

Também questiona as razões do corte nos impostos federais sobre o gás de cozinha e o diesel, além de realizar controle prévio afim de conhecer os interesses de Bolsonaro ao dizer que vai “meter o dedo na energia elétrica”.

“Minha preocupação se acentua ao notar que há indícios de interesses do atual governo em intervir politicamente em outras empresas estatais”, diz o procurador.

O pedido foi apresentado ontem. O próximo passo será a abertura de um processo junto à área técnica do TCU.

No entendimento de um interlocutor, há limites na atuação do TCU sobre a conduta de presidente. Contudo, a expectativa é que as ações adotadas no caso da Petrobras sejam analisadas em procedimento específico porque há formas de trocar o comando de uma estatal sem causar prejuízos à empresa e gerar ruídos entre investidores.

Em outra frente, a diretora financeira e de Relações com Investidores da Eletrobras, Elvira Cavalcanti Presta, enviou carta ao Ministério de Minas e Energia reclamando da divulgação de dados e lembrando que a empresa tem capital negociado nas bolsas de São Paulo, Nova York e Madri.

A carta cita notícias sobre a declaração de Bolsonaro de que iria “meter o dedo” no setor elétrico e a revelação, feita pelo GLOBO, de que o governo tem pronta medida provisória (MP) para privatizar a empresa. Ontem, o governo entregou a MP ao Congresso. “Serve a presente para reiterar junto a esse ministério a importância de que seja observada a política de divulgação e uso de informações relevantes da Eletrobras”, diz o texto.