Correio Braziliense, n. 21112, 14/03/2021. Mundo, p.14

 

Ex-presidente boliviana está atrás das grades

LA PAZ » Em meio a investigação de um suposto golpe de estado contra Evo Morales, Jeanine Áñez tenta provar que acusações são infundadas, o que faria sua privação de liberdade ocorrer de foma ilegal. Antecessores prestam apoio em postagens nas redes sociais

 

A ex-presidente da Bolívia Jeanine Áñez foi presa, ontem, devido à investigação sobre um suposto golpe de Estado contra o ex-presidente esquerdista Evo Morales. A televisão nacional mostrou a ex-chefe de Estado chegando ao aeroporto de El Alto, que serve La Paz, no momento em que ela define sua prisão como ilegal. Sem algemas, Áñez estava ao lado do ministro do Governo Carlos Eduardo del Castillo e de vários policiais.

"Informo ao povo boliviano que a senhora Jeanine Áñez já foi apreendida e neste momento está nas mãos da polícia", anunciou, horas antes, Del Castillo em suas contas do Twitter e Facebook, parabenizando as forças de segurança pelo "grande trabalho (...) nesta grande e histórica tarefa de fazer justiça ao povo boliviano".

Também pelas redes sociais, a ex-presidente classificou a prisão com um ato de abuso e perseguição política. "O governo me acusa de ter participado de um golpe de Estado que nunca aconteceu", disse Áñez via Twitter.

Em La Paz, Jeaninne, de 53 anos foi levada para um quartel da Polícia e depois para os escritórios do Ministério Público, onde deu declarações. "É um ultraje absoluto, porque nos acusam de sermos cúmplices de um suposto golpe. É algo sem pé nem cabeça. Vejo como intimidação absolutamente política", disse Áñez.

O Ministério Público da Bolivia foi o responsável por emitir a ordem de prisão na sexta-feira (12). Além dele, vários de seus ministros também começaram a ser presos denunciados por crimes de sedição, terrorismo e conspiração. Dois deles, Álvaro Coímbra, ex-chefe da Justiça, e Rodrigo Guzmán, da Energia, foram detidos em Trinidad e transferidos para La Paz.

A ordem do MP partiu de uma denúncia apresentada em dezembro passado por Lidia Patty, ex-legisladora do governante Movimento Ao Socialismo (MAS, esquerda), de Morales.
No documento, Patty afirmou que o líder civil da região de Santa Cruz (leste), Luis Fernando Camacho, Áñez, vários ex-ministros, ex-militares, ex-policiais e civis promoveram a queda de Morales em novembro de 2019, após 14 anos no poder.

Áñez substituiu Morales constitucionalmente após a renúncia, em novembro de 2019, em meio aos protestos após eleições denunciadas como fraudulentas. Liderou o governo até novembro de 2020, quando o atual presidente Luis Arce foi eleito.

Em carta, Camacho alertou que "os bolivianos não vão ficar de braços cruzados diante do abuso" e garantiu não deixar o país. Camacho venceu a eleição do fim de semana passado para governador da rica região de Santa Cruz (leste) com mais de 55% dos votos.

 

Evo pede sanções
Em seu tuíte, Evo Morales pediu justiça e verdade para, segundo ele, as 36 pessoas que morreram, os mais de 800 feridos e cerca de 1,5 mil detidos ilegalmente nesse suposto golpe de Estado. "Que se investigue e sancione os autores e cúmplices da ditadura que abalou a economia e ameaçou a vida e a democracia na Bolívia", acrescentou.

Os ex-presidentes da Bolívia, o centrista Carlos Mesa (2003-2005) e o direitista Jorge Quiroga (2001-2002), rejeitaram separadamente as prisões. Ambos foram atores-chave para a transição do governo de Morales para o da direitista Áñez em 2019. "Estamos em um processo de perseguição política pior do que nas ditaduras. Está sendo executado contra quem defendeu a democracia e a liberdade", disse Mesa no Twitter.

Opositores protestaram em todo o país em 2019 após as eleições de outubro daquele ano, denunciadas como fraudulentas a favor do quarto mandato de Morales.