O Globo, n.31988 , 06/03/2021. País p.7

 

Me dá certo mal-estar não ter votado contra Bolsonaro”, diz FH

Gustavo Schmitt

Sérgio Roxo

06/03/2021

 

 

Ex-presidente critica atual governo e afirma que Doria precisa se nacionalizar

 

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) disse, em entrevista publicada ontem pela revista “Época”, que ter anulado o voto no segundo turno da eleição de 2018 lhe provocou “certo mal-estar”, em virtude da vitória do presidente Jair Bolsonaro. Segundo o tucano, o atual chefe do Executivo“trata mala pandemia” e não demonstra “sentimento de sofrimento alheio”. Na visão de FH, para evitar a reeleição de Bolsonaro é preciso uma candidatura de centro que dialogue “com todos os campos”. Questionado se voltaria a anular o voto, caso Bolsonaro voltasse a disputar o segundo turno com o PT, FH respondeu que “só em desespero se vota nulo”:

— A pior coisa é você ser obrigado a não ter escolha. Não ter escolha permite o que aconteceu: a eleição do Bolsonaro. Teria sido melhor algum outro? Provavelmente, sim. Pergunta se eu me arrependo (de ter anulado o voto)? Olhando para o que aconteceu com o Bolsonaro, me dá um certo mal-estar não ter votado em alguém contra ele —disse o ex-presidente. O candidato petista, Fernando Haddad, tinha mais “sensibilidade social”, opinou FH, mas havia dúvidas se faria um bom governo. Para o ex-presidente, Bolsonaro mantém índices de aprovação perto de 30%, apesar da gestão da pandemia, porque “muita gente se sente representada por ele”.

Na eleição de 2022, avalia o tucano, não basta um candidato se apresentar como “anti-Bolsonaro”.

— Por enquanto, temos um polo só que é negativo: a favor do Bolsonaro ou contra. Quem for capaz de criar um polo que transcenda seu próprio partido e chegue ao povo terá meu voto, independentemente de ser do meu partido ou não. Prefiro, obviamente, que seja do meu partido.

CAPACIDADE DE UNIÃO

O ex-presidente defendeu que, na próxima eleição presidencial, haja uma composição de nomes de centro em torno de um candidato “que seja capaz de unir” o Brasil, enquanto Bolsonaro deve continuar apostando na linha do “quanto mais rachado, melhor”.

— Se não houver alguém que expresse um sentimento que diga (ao povo) “venha comigo e eu te levo ao paraíso”, o pessoal vai no Bolsonaro —afirmou.

Com relação à pretensão do governador de São Paulo, João Doria (PSDB) de concorrer à Presidência, FH afirmou que o partido deve realizar prévias e que Doria ficou “muito paulista”.

— Ele é baiano de origem. Agora, ele fez a vida em São Paulo. Acho que ele tem de demonstrar que é brasileiro. É mais do que paulista, mais do que empresário. Que é capaz de sentir. Tem de ouvir. E não é essa coisa de roupa. Não é isso. Tem de compreender as dificuldades. Ainda sobre a disputa interna no PSDB, FH se posicionou contra um expulsão de Aécio Neves, já defendida por Doria.

—Acho que é ruim afastar. Ele tem influência em Minas Gerais e foi nosso candidato a presidente da República. Isso tem um valor.