Título: TV Digital interativa no próximo ano
Autor: Totinick, Ludmilla
Fonte: Jornal do Brasil, 07/12/2008, Economia, p. E6

Nova tecnologia ainda decepciona, mas as emissoras prometem massificar novo padrão

Ludmilla Totinick

Por que pouca gente assiste à televisão digital no país? Falta de interatividade, alto preço e legislação antiga impedem que o novo sistema de TV, cujo processo de implantação completou um ano na semana passada, chegue à maioria da população. De acordo com a Associação Nacional dos Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros), foram vendidos cerca de 470 mil conversores até agora, desde janeiro de 2007, o que representa apenas 0,5% da população brasileira.

Mas, afinal, o que mudou? Por enquanto, ficou restrita apenas à sensível melhora de qualidade de áudio e imagem, que sai caro (o conversor custa em média R$ 800, para quem não tem serviço de TV por assinatura, e um aparelho de TV Full HD de 1080 linhas, indicado para o uso, vale aproximadamente R$ 4 mil).

Já o aspecto inovador, a interatividade que possibilitará uma interação maior com o telespectador, com acesso a mais informações, diferentes opções de ângulos e, inclusive, meios para realizar compras pela televisão ainda não é oferecido ao consumidor.

Atualmente, oito cidades brasileiras transmitem a TV digital: São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Goiânia, Curitiba, Porto Alegre, Salvador e Campinas.

Hugo de Souza Melo, professor de engenharia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), diz que a legislação antiga impede que haja versatilidade de conteúdo. Pelo sistema digital, segundo Melo, um mesmo canal tem opões de oferecer programações diferentes.

¿ O mesmo documentário poderá ter um texto para um público específico, geral e crianças, por exemplo. Porém, a lei não permite que isso aconteça, pois as políticas regulatórias de comunicação são de 30 anos atrás, a radiofusão é separada da telecomunicação ¿ explica.

Outro problema citado pelo especialista é a criação de um software de interatividade, o middleware Ginga, responsável por fazer a interface entre o usuário e as aplicações interativas, atualmente em desenvolvimento pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

¿ Como a melhora da imagem em relação a dos canais da TV por assinatura é pequena, as pessoas de alto poder aquisitivo não se sentem tão atraídas ¿ observa.

Melo também diz que à medida que as pessoas têm mais acesso à internet, o interesse pela TV diminui.

De acordo com o Ministério das Comunicações, a TV digital aberta chegará em todo o país até 2013.

¿ Além de cobrir todo o Brasil de forma aberta e gratuita, a TV digital será uma importante ferramenta de inclusão digital em um futuro bem próximo ¿ destacou o ministro das Comunicações, Hélio Costa, durante solenidade de inauguração do sinal da TV Digital em Campinas, na semana passada.

A Associação Brasileira de Rádio e Televisão (Abert) informou que a TV digital deverá encerrar este ano com cobertura capaz de alcançar cerca de 40 milhões de pessoas.

Segundo dados do Fórum do SBTVD ¿ órgão que congrega representantes do governo, das emissoras e universidades ¿, a TV em alta definição alcançou, até agora, 645 mil telespectadores.

Presidente da Abert, Daniel Pimentel Slaviero diz que o processo de transição do sistema analógico para o digital de televisão acontecerá de forma gradativa.

¿ Assim como aconteceu nos anos 50, com o surgimento da TV aberta no país, e a partir de 1972, com o padrão em cores ¿ ressaltou Slaviero.

Qualidade

A TV digital brasileira exigiu mais de uma década de estudos, debates, pesquisas e ações articuladas das emissoras, dos fabricantes de equipamentos de recepção e transmissão, da indústria de software, das instituições de ensino e pesquisa e do governo federal. Sua implantação no Brasil foi baseada no sistema de modulação do padrão japonês, com componentes desenvolvidos no Brasil.

A previsão da Abert para 2009 é cobrir todas as capitais e cidades com mais de 500 mil habitantes do país. Já no próximo ano, no entanto, Slaviero diz que a expectativa da entidade é de crescimento exponencial no número de telespectadores no próximo ano, impulsionado pela chegada da interatividade e da maior oferta de receptores fixos e portáteis.

Cooperação

O padrão internacional brasileiro poderá ser adotado na Argentina. Em setembro, os dois países assinaram termo de compromisso para cooperação no desenvolvimento da TV digital. Pelo acordo, serão exploradas oportunidades que sejam igualmente vantajosas tanto no fomento à pesquisa, como em áreas como desenvolvimento tecnológico, investimentos e produção de equipamentos.

O Brasil também discute a adoção do sistema nos países da América Latina, como Chile, Peru, Paraguai, Bolívia e Venezuela.

¿ Quanto mais países adotarem o mesmo padrão, maior será a escala de produção e menores serão os preços para o consumidor ¿ destacou Costa, ao lembrar que o padrão internacional não é só brasileiro e japonês, mas de todos os países participantes.

Histórico

O decreto de 29 de junho de 2006, que define o regime de transição da televisão analógica brasileira para o sistema digital, estabelece um prazo de 10 anos para que toda transmissão terrestre no país seja digital. Nesse mesmo período, os sinais analógico e digital vão ser transmitidos simultaneamente.

¿ Será um grande desafio cobrir o país todo. Muitos investimentos precisarão ser realizados, principalmente com a extensão territorial do Brasil. As emissoras de TV pequenas, principalmente do interior do país, não têm recursos. Um único transmissor custa US$ 1 milhão ¿ ponderou Melo.

No mundo, existem atualmente três tipos de TV digital: um modelo produzido nos Estados Unidos, outro no Japão e um terceiro na União Européia.

No Brasil, o governo decidiu realizar uma pesquisa para ter sua própria tecnologia para a TV digital, com o objetivo de escolher o padrão mais adequado à realidade. Para isso, governo, universidades e centros de pesquisa estão analisando a melhor forma de desenvolver o Sistema Brasileiro de TV digital em um processo que envolve vários outros setores da sociedade, como indústrias, produtores de televisores e componentes e sociedade civil.