O Globo, n.31992 , 10/03/2021. Sociedade, p.10

 

Pfizer pediu pagamento por vacina livre de impostos

Francisco Leali

Paula Ferreira

10/03/2021

 

 

E Janssen queria receber US$ 95 milhões do governo mesmo sem aprovação de imunizante, mostram documentos obtidos pelo GLOBO

Uma versão do memorando de entendimento entre o governo brasileiro e a Pfizer, feita no ano passado, previa que a União pagasse todos os impostos relativos à aquisição de vacinas contra a Covid-19, de modo que não houvesse prejuízo para a empresa nos US$ 700 milhões que seriam desembolsados pela administração federal. A Janssen, que também negocia imunizantes, por sua vez, pediu US$ 95 milhões que não seriam devolvidos em caso de reprovação na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

O GLOBO questionou o Ministério da Saúde se as atuais negociações com os laboratórios ainda incluem estas exigências, masa pasta alegou estar impedida dese pronunciar, pois os contratos ainda estão em discussão — os documentos, informa, “se tornarão públicos no futuro".

A Pfizer também disse que não comentaria detalhes sobre negociações em curso, mas acrescentou que as cláusulas apresentadas ao governo brasileiro “estão em linha com acordos fechados em outros países, inclusive na América Latina”.

A Janssen afirmou que “segue empenhada” em concluir as negociações para disponibilizara dose única do imunizante :“Em paralelo, seguimos trabalhando nos demais processos regulatórios juntoàAn vi sapara viabilizara utilizar da vacina da Janssen no Brasil, em um modelo sem fins lucrativos durante a pandemia”.

O memorando de entendimento coma P fizer previa um valor de US$ 10 por dose. Inicialmente, a quantidade negociada era de 70 milhões de doses, mas aumentou para 100 milhões na semana passada.

O titular da Saúde, Eduardo Pazuello, criticou as cláusulas “leoninas e abusivas” propostas pela farmacêutica, como exigir que a União se responsabilizasse por eventos adversos causados pela vacina.

Em memorando obtido pelo GLOBO via Lei de Acesso à Informação, uma cláusula versa sobre como o governo federal deve indenizar pacientes vítimas de eventos adversos: “O Estado Brasileiro implementará, através de lei federal (ordinária ou medida provisória já convertida em lei ), fundo governamental para o pagamento de indenização a indivíduos que sofrerem danos em função da administração ou uso da Vacina”.

As negociações coma Janssen também custaram a evoluir. O laboratório e a Saúde previam negociar o contrato até 15 de dezembro do ano passado, mas o negócio ainda não foi concluído.

Em uma carta de intenção de compra, a Janssen pediu um pagamento de US$ 95 milhões não reembolsáveis, mesmo “se a vacina candidata não receber aprovação regulatória ou se o desenvolvimento e/ou fabricação da vacina candidata não forem bem-sucedidos”.

A empresa afirmou ainda que, caso não receba autorização da Anvisa até 30 de abril, poderia haver atrasos no cronograma estabelecido com o governo. No entanto, a Janssen nem sequer deu entrada ao pedido de autorização emergencial ou registro de seu produto na agência.