Correio Braziliense, n.21117 , 19/03/2021. Cidades, p.13

 

O drama por uma UTI

Samara Schwingel

Luana Patriolino

19/03/2021

 

 

 Recorte capturado

Mesmo com a constante abertura de vagas de unidades de terapia intensiva pelo governo do Distrito Federal, a fila de espera na rede pública parece não diminuir. Ontem, DF teve número recorde de mortes

Durante todos os dias desta semana, a ocupação de leitos de unidade de terapia intensiva (UTI) para o tratamento da covid-19, na rede pública do Distrito Federal, esteve acima de 90%. No mesmo período, a fila de espera para a internação em uma UTI mantinha-se em torno de 200 pessoas. Diante desse cenário, profissionais de saúde que atuam diretamente no atendimento à covid-19 reforçam a necessidade de se manter os cuidados preventivos e o isolamento social. Para tentar combater a doença e diminuir os números de internações e espera, o GDF vai reativar 82 leitos de UTI em Unidades de Pronto-Atendimento (UPAs).

De acordo com os dados da InfoSaúde — portal de transparência da Secretaria de Saúde —, por volta das 15h de ontem, 323 pessoas aguardavam por um leito de UTI. Destas, 243 estavam com suspeita ou confirmação de infecção pela covid-19. No dia anterior, havia 218 pessoas infectadas pelo Sars-Cov 2 aguardando por internação (veja Evolução das UTIs). A Defensoria Pública do DF recebeu, nos primeiros 17 dias de março, 106 pedidos de ações ajuizadas de pessoas em busca de uma unidade de terapia intensiva. Em todo o mês de fevereiro, foram 23. O aumento pela procura da Defensoria está atrelado à lotação dos hospitais.

Há 18 anos na área da saúde, o médico intensivista do Hospital Brasília Rodrigo Biondi, 43 anos, afirma que nunca imaginou presenciar hospitais tão cheios e as UTIs funcionando com a capacidade máxima. "Nada se compara ou fica mais ou menos parecido com isso. Nem em sonho", diz. Biondi relata que, atualmente, os internados com covid-19 permanecem em situação gravíssima. "Estão cheias de pacientes muito graves. Não era assim antes, era sempre uma mescla: gravíssimos, graves, estáveis e moderados. Agora, muito mais jovens do que antigamente. Realmente, é um perfil bastante diverso da primeira onda", observa.

O médico faz um apelo às pessoas que ignoram os protocolos de higiene e medidas de distanciamento físico. "Cerca de 80% das pessoas vão ter sintomas leves e levíssimos. Mas 5% serão intubadas, vão para a UTI, terão falta de ar e podem ter até sequelas de longo prazo. A necessidade atual é segurar a onda por alguns meses para conseguir voltar a viver 'mais ou menos' normal. Não adianta pensar que não vai acontecer com você, porque pode acontecer, sim", desabafa.

Para tentar amenizar a situação, o governo local vai reativar leitos de UTIs para tratamento da covid-19 em UPAs. Ao todo, serão 42 leitos no Núcleo Bandeirante, 20 em Sobradinho e outros 20 em São Sebastião. Porém, segundo o governador Ibaneis Rocha (MDB), assim que abertos, os leitos tendem a ser ocupados rapidamente. "Desde o agravamento da pandemia em 2021, foram abertos 260 novos leitos. Ontem (quarta-feira), dos 20 novos leitos montados no Hospital de Base, 12 foram ocupados em menos de 24h. Ou seja, os dados seguem alarmantes, e precisamos do apoio da população para levar o distanciamento a sério", escreveu nas redes sociais.

Tempo de espera

Ainda de acordo com o InfoSaúde, até as 15h de ontem, a pessoa mais antiga na fila por uma UTI para tratar a covid-19 estava esperando desde 5 de março. Segundo a secretaria, a internação em leitos de UTI segue critérios específicos, que variam de forma individual para cada paciente, pois cada um possui necessidades clínicas distintas. "A Central de Regulação, que funciona 24 horas por dia e sete dias por semana, avalia caso a caso e encaminha os pacientes respeitando a prioridade de internação avaliada pelos médicos e se o leito possui o suporte necessário para atender determinado paciente", informou a pasta por meio de nota.

Para o professor de epidemiologia da Universidade de Brasília (UnB) Walter Ramalho, esperar por um leito pode ser letal. "É importante ter em mente que uma pessoa que precisa de UTI está em estado grave. A covid-19 é uma doença de desenvolvimento muito rápido, e não ter leitos para todos é uma situação dramática", disse. Ele afirmou que, para que não se chegue a uma UTI, é preciso prevenção. "Essa é a importância das medidas de segurança sanitária", completou.

Número recorde

Nas últimas 24 horas, o DF registrou 1.890 novos casos e 68 mortes pela covid-19 (nove somente ontem, as demais em dias anteriores, mas registradas na quinta-feira). No total, 324.576 pessoas foram infectadas, sendo 5.274 óbitos. Ontem, a média móvel de mortes foi a maior registrada desde o começo do ano: 32 — aumento de 100%, em relação ao número de 14 dias atrás. Comparado ao mesmo período, o índice dos casos ficou em 1.660, aumento de 38%.

A taxa de transmissão chegou a 0,99. Caso esse indicador continue a diminuir, Ibaneis deve avaliar a reabertura do comércio na próxima semana. O Correio apurou que o governador deve manter o toque de recolher e liberar aos poucos as atividades comerciais, com horários reduzidos.