O Globo, n. 31986, 04/03/2021. Economia, p.18

 

Proposta que destrava auxílio avança no Senado

 

 

Texto, aprovado em 1º turno, permite que despesa com programa não fique sujeita a regras fiscais, desde que gasto total não ultrapasse R$ 44 bi. Governo vai considerar composição familiar para conceder benefício. Mulheres com filhos receberão mais

 

GERALDA DOCA, MANOEL VENTURA E PAULO CAPPELLI

economia@oglobo.com.br

 

O Senado aprovou ontem, em primeiro turno, a proposta de emenda à Constituição (PEC) que abre espaço para o pagamento de novas parcelas do auxílio emergencial. O texto permite que as despesas com o benefício não fiquem sujeitas a regras fiscais, desde que o valor total gasto com o programa não ultrapasse R$ 44 bilhões. Ao mesmo tempo, cria regras para controle de contas públicas. O projeto foi aprovado por 62 votos a favor, dos 49 necessários. Outros 16 senadores votaram contra.

O segundo turno de votação está previsto para a manhã de hoje. Depois, a proposta será encaminhada à Câmara. Se não for modificada pelos deputados, a PEC é promulgada pelo Congresso e, só então, entra em vigor.

De acordo com o texto, apelidado de PEC Emergencial, os gastos do governo com o auxílio não serão limitados por travas como o teto de gastos —que limita o crescimento das despesas à inflação — e a meta fiscal. Como contrapartida, autoriza que União, estados e municípios acionem medidas de ajuste em caso de necessidade. Não há, no entanto, exigência de corte imediato de gastos para liberar o benefício.

Antes do início da votação, a equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, teve que atuar nos bastidores para barrara tentativa de tirar o Bolsa Família do teto de gastos, ideia que começou a ganhar força na terçafeira. Guedes e assessores passaram o dia em ligações com deputados e senadores.

Apesar da preocupação de Guedes, o sinal verde para que líderes avançassem nas negociações foi dado a senadores pelo presidente Jair Bolsonaro, segundo fontes. Nas conversas, a equipe econômica alertou que, apesar de bem intencionada, a medida poderia ter um impacto ruim. O argumento é que flexibilizar o teto de gastos aumentará incertezas, tendo como consequência a alta de juros, do dólar e do desemprego.

 

RESTRIÇÕES DESIDRATADAS

A estratégia permitiria, na prática, que o espaço de R$ 34,9 bilhões no Orçamento separado para o programa pudesse ser gasto com outras iniciativas. A ideia começou a ser debatidas oba justificativa de reforçar o benefício no segundo semestre, quando o auxílio emergencial acabar. Mas esse objetivo deve ser alcançado por meio de remanejamento de cerca de R$ 10 bilhões que devem ser economizados com a migração de beneficiários do Bolsa Família para o auxílio.

A proposta perdeu força à tarde, quando o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), se pronunciou publicamente e descartou a proposta. “Quero deixar claro que são infundadas todas as especulações sobre furar o teto”, escreveu Lira em uma rede social.

Apesar de manter o Bolsa Família no teto, a proposta apresentada ontem desidrata parte das medidas de controle de gastos. Antes, ao acionar o Estado de Calamidade Pública, o governo não poderia conceder aumento de salários por dois anos. Agora, a proibição de reajuste só valerá durante o período de Estado de Calamidade.

O governo vai considerara composição familiar na hora de conceder o novo auxílio emergencial. Segundo fontes envolvidas nas discussões, o valor do auxílio será de R $250, mas mulheres com filhos terão direito a uma cota maior, de R $375. Famílias compostas apenas por uma pessoa receberão R $150. A expectativa é que os repasses comecem no dia 18 para quem já recebe o Bolsa Família.

Já está definido no governo que o novo auxílio será pago em quatro parcelas a apenas um membro da família e não poderá ser acumulado com outros repasses. A estratégia é focalizar melhor o auxílio e atingir maior número de pessoas, um universo de 46 milhões de famílias.

 

CRITÉRIOS DE RENDA

Nessa nova etapa, deverão ser mantidos os mesmos critérios de renda para acessar o auxílio, de meio salário mínimo por pessoa da família (R$ 550) e de renda total familiar de até três salários mínimos (R$ 3.300). Os dois requisitos serão aplicados de forma conjunta, ou seja, uma família de apenas três pessoas com renda de até três pisos não será beneficiada.

Além disso, não terão direito ao auxílio pessoas que recebem algum tipo de benefício do governo, como aposentadoria, pensão, benefício de prestação continuada (BPC) e seguro-desemprego, assim como trabalhadores com carteira assinada, servidores públicos e militares.

Os detalhes constarão de uma medida provisória (MP) a ser editada nos próximos dias. Caberá ao Ministério da Cidadania definir o cronograma a ser cumprido pela Caixa Econômica Federal.