Valor Econômico, n. 5197  v.21, 01/03/2021. Brasil, p.A2

 

 

 

Problemas de saúde mental devem marcar o pós-covid

 

 

 

 

Efeito será semelhante a “réplicas de terremoto”, defende terapeuta familiar na Live do Valor

Por Felipe Frisch — De São Paulo

 

 

Ganha força na discussão entre psicólogos e psiquiatras mundo afora a preocupação com uma provável disparada nos problemas de saúde mental quando a pandemia de covid-19 for superada. Será como as chamadas réplicas de terremotos, pequenos tremores que sucedem a grande e principal catástrofe, nas palavras do terapeuta familiar Alexandre Coimbra Amaral, que participou da Live do Valor na sexta-feira.

 

“Depois que a pandemia acabar, a gente vai viver o rebote da saúde mental, como se fosse depois do grande terremoto, em que você tem aquelas pequenas réplicas. Depois da catástrofe do coronavírus, a gente vai ter essas réplicas de saúde mental”, disse.

 

Segundo ele, a saúde mental é a variável mais longeva da crise sanitária provocada pelo novo coronavírus. “A gente pode se preservar do ponto de vista da saúde física e, quando terminar esse ciclo de pandemia, a gente ainda vai ter os efeitos na saúde mental que vão precisar ser analisados durante muito tempo em cada tipo de população humana.”

 

No dia em que faz um ano da confirmação do primeiro caso do então novo coronavírus no Brasil, com o país já tendo ultrapassado os 250 mil mortos pela pandemia, desconsiderando as prováveis subnotificações, o psicólogo calcula que haja pelo menos 20 pessoas próximas a quem morreu, vivendo o luto, chegando a um contingente de aproximadamente 6 milhões de brasileiros que estão sofrendo perda ou passando pelo processo de elaboração de perda. “Tudo isso compromete a nossa saúde mental individual, familiar ou coletiva.”

 

Dessa vez, no entanto, as questões emocionais não dizem mais respeito apenas à vida privada das pessoas, mas também tendem a se tornar prioridade das empresas. “A saúde mental passou à categoria de protagonista, se você quiser pensar em ações organizacionais. Nós temos estudos que já mostram que cuidar da saúde mental nas empresas significa promover diminuição das faltas ao trabalho.”

 

Segundo ele, “ao contrário do que muita gente pode pensar, cuidar da saúde mental dos funcionários, ‘gastar tempo’ em tipos de ações para saúde mental dos funcionários da sua empresa aumenta a produtividade das pessoas, que é no fundo um dos indicadores que mais importam para a gestão”.

 

Para o terapeuta, aproveitar o momento de transformação para instituir programas de saúde mental nas empresas pode ser “uma grande virada paradigmática para as organizações, para as culturas organizacionais brasileiras, para que as pessoas se sintam mais à vontade para serem elas mesmas.”

 

Ele conta que durante 2020 foi chamado por diversas empresas para falar dessa “interface” entre o home office e a família, que passou a ser uma característica daquele funcionário, e não mais um elemento de fora da vida do trabalho.