Título: Na contramão da tendência mundial
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 13/12/2008, Opinião, p. A8

Algo parece estar fora de sintonia entre a prática da autoridade monetária e a de outros setores do governo. Soa destoante do discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ¿ preocupado em defender a manutenção dos mesmos níveis de consumo de antes da crise e enfático na defesa de redução nas taxas de juros cobrados pelos bancos oficiais ¿ a atitude tomada pelo Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, que na última reunião do ano decidiu por unanimidade manter a Selic em 13,75% ao ano. O BC não só sustentou os juros como um dos mais altos do planeta como ignorou a tendência dos bancos centrais mundo afora. Os integrantes do Copom também não se sensibilizaram com os sinais, cada vez mais evidentes, de arrefecimento da demanda interna e, em conseqüência, dos preços praticados no país.

A sensatez informa que não se reduzem essas taxas por decreto, mas nada justifica que, na conjugação de astros do presente, o Brasil mantenha a posição de líder mundial no ranking de juros. Desde o anúncio da concordata do banco americano Lehman Brothers, em setembro, 13 países reduziram os juros. Enquanto isso, o presidente Lula, no dia seguinte, ordena que os bancos públicos reduzam os juros cobrados. A ação do Copom soa ainda mais contraditória, quando assistimos ao governo anunciar um novo pacote de medidas para aquecer a economia, com as baterias voltadas para estimular o consumo. É visível a preocupação em manter os níveis de liquidez e evitar que a economia desacelere muito no próximo ano, tanto que, entre os alvos, está a redução do imposto que consome o salário, o Imposto de Renda. Acertadamente, o governo reduz a pesada carga de impostos que recai, especialmente, sobre a classe média, principal setor capaz de impulsionar o crescimento do consumo. Carros novos ficarão mais baratos com a redução do IPI, e empréstimos serão mais vantajosos com menor carga de Imposto sobre Operações Financeiras. O mix básico para impulsionar a economia de volta aos trilhos do crescimento verificado no início do ano está pronto. Toda iniciativa para blindar o país contra a crise destinada a preservar a massa salarial é mais do que necessária neste momento. Embora o futuro seja ainda nebuloso, as perspectivas para o Brasil são positivas. Porém, os cuidados não podem recair exclusivamente sobre o crédito.

Há que se concordar com os setores comercial e industrial. Classificada como um balde de água fria no crescimento da economia para o primeiro semestre de 2009, a manutenção da Selic nas alturas é uma atitude que segue na contramão da política para ampliar o acesso ao crédito. Como argumentou o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, Paulo Skaf, "é absurdo manter a taxa de juros tão elevada, quando a inflação está sob controle". O IGP-M ficou em 0,38% em novembro, ante 0,98% no mês anterior; o IPCA de novembro foi muito menor do que o previsto; e o IBGE divulgou a queda na produção industrial nos últimos meses, com redução dos postos de trabalho; além da deflação de 0,17% constatada no Índice de Preços no Atacado, que chegará ao varejo em breve, segundo economistas. Estes seriam dados suficientes para derrubar o argumento usado para dar continuidade à política de juros. Reduzir a Selic é uma reivindicação antiga do setor produtivo, e agora se torna mais imprescindível.