Título: A Suprema Corte e o ativismo judicial
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 29/12/2008, Opinião, p. A8
AO REBATER AS CRÍTICAS de que o Supremo Tri- bunal Federal tem se excedido em matéria de "ativismo judicial", agindo muitas vezes como legislador sobretudo sob sua pre sidência o ministro Gilmar Mendes reafirmou, em reportagem publicada no fim de semana pelo JB, que "o Supremo não sai aí pelas ruas buscando as demandas". E acrescentou: "Em geral, só atua quando provocado e, em matéria de conflito político, sempre é um dos contendores que, descontente, traz o tema ao STF". No ano que termina, ficou bem claro que a chamada judicialização da política foi fomentada, principalmente, pelos próprios políticos. Conforme a Constituição, são partes legítimas para propor as chamadas ações diretas as de inconstitu cionalidade, declaratórias de constitucionalidade e a argüição de descumprimento de preceito fundamental o presidente da República, as mesas do Senado, da Câmara dos Deputados e das assembléias legislativas, os governadores dos estados e do Distrito Federal, o procurador-geral da República, a Ordem dos Ad vogados do Brasil, os partidos políticos com representação no Congresso, além de confederações sindicais ou entidades de classe de âmbito nacional. Tal generosidade é incomum no direito comparado, como anotam os constitucionalistas. À pletora de "ações diretas" (a última ação de incons titucionalidade protocolada é a de número 4.178) somam-se as dezenas de milhares de petições e recursos ajuizados no STF como instância originária ou final recursos extraordinários, habeas corpus, mandados de segurança. Entre os últimos, in clui-se o malfadado pedido de liminar do presidente do Se nado, Garibaldi Alves, que pre tendia que a Mesa da Câmara dos Deputados fosse compelida a promulgar a emenda cons titucional que aumentava em 7.343 o número de vereadores em todo o país. Ou seja, o próprio presidente do Congresso, no apagar das luzes de um ano em que o Legislativo teve um desempenho pífio, recorreu ao Supremo para que arbitrasse uma questão tipicamente interna corporis. O próprio advogado-geral da União, José Antonio Toffoli, reconheceu que o STF deu, este ano, um "enorme passo" como Corte constitucional, assumindo para valer seu "papel moderador" como instituição destinada a decidir as grandes controvérsias que envolvam a República e a sociedade em geral. O "ativismo judicial" do STF reforçou-se, de maneira especial, na edição das súmulas com efeito vinculante para toda a administração pública. Foram 13, ao todo, das quais tiveram maior repercussão a que proibiu a prática do nepotismo na gestão pública, e a que limitou o uso de algemas em operações policiais e nos atos processuais. Em recente ensaio publicado na revista Consultor Jurídico, o constitucionalista Luiz Roberto Barroso considera como "pri mos", ou seja, "da mesma família", a judicialização e o ativismo judicial. Segundo ele, "o ativismo judicial é uma atitude, a escolha de um modo específico e proativo de interpretar a Constituição, expandindo o seu sentido e alcance". E mais: "Normalmente, ele se instala em situações de retração do Poder Legislativo, de um certo descolamento entre a classe política e a sociedade civil, impedindo que as demandas sociais sejam atendidas de maneira efetiva". O STF demonstrou, neste ano, sua crescente adesão ao que se passou a chamar de neoconstitucionalismo, atuando cada vez mais como Corte constitucional do que como "quarta instância".