O Globo, n.31996 , 14/03/2021. País, p.10

 

Aliados de Bolsonaro querem mais prazo para criar Aliança

Paulo Cappelli

Natália Portinari

14/03/2021

 

 

Partido precisa obter apoios até dezembro e culpa pandemia por fracasso

Para evitar que o Aliança pelo Brasil não consiga se formar antes do prazo para a coleta de assinaturas, em dezembro, o presidente Jair Bolsonaro e seus apoiadores estudam entrar no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com uma ação pedindo um tempo extra. O argumento seria que atrasos nos cartórios eleitorais devido à pandemia de Covid-19 teriam tornado impossível coletar as 492 mil assinaturas a tempo. O presidente mantém a intenção de criar a legenda, mesmo tendo decidido se filiar a outro partido nas próximas semanas, com o objetivo de concorrer à reeleição no ano que vem.

— Os cartórios ficaram fechados por vários meses durante a pandemia, o que prejudicou a coleta de assinaturas, já que muitos deles exigem documentação física. Acreditamos que esse prazo tem que ser recomposto em 2022. O projeto do Aliança está mantido, e o ritmo de coletas de assinaturas está voltando a crescer — disse o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) ao GLOBO.

Além de tentar atingir as assinaturas, Bolsonaro trabalha com outra alternativa para tentar tirar o Aliança do papel a curto prazo: fundir o partido ao qual deverá se filiar com outra legenda nanica. Dessa forma, a nova sigla seria batizada com o nome desejado e o número seria alterado para o 38. A ideia, porém, ainda não empolgou nenhuma das siglas com as quais a filiação vem sendo negociada, tais como PSC, DC, PMB e PMN. O presidente procurou também o PSL, seu antigo partido, para avaliar a chance de aparar as arestas e voltar. Enquanto isso, articuladores do Aliança relatam desorganização, brigas internas e até “roubo de fichas” nos estados como motivos pela demora que pode inviabilizar a formação da legenda. No sistema do TSE, o partido tem 78 mil assinaturas, 15% do exigido.

Gilson Machado, ministro do Turismo, diz que há “cerca de 125 mil fichas já coletadas e ainda não lançadas no sistema”. Além do apoiamento, seria preciso obter o registro na Justiça até o início de abril para a legenda poder disputar em 2022. O prazo é apertado e, culpando a pandemia e os consequentes atrasos nos cartórios, a cúpula do movimento não tem previsão de concluir o trabalho. — Se tudo estivesse nas condições normais de temperatura e pressão, já estaríamos com o processo finalizado. Com a pandemia e o aumento do número de mortes e restrições, qualquer previsão pode ir por água abaixo — disse Machado.

Reservadamente, integrantes do partido relatam “disputas de ego” entre os líderes e dizem que a recusa de Bolsonaro em delegar autoridade a uma pessoa para tocar o projeto é o principal fator que atrasou o processo. No último ano, alguns dos principais organizadores, como o marqueteiro Sérgio Lima e a advogada Karina Kufa, afastaram-se. Nos estados, a coleta de apoio foi organizada por coordenadores voluntários, alguns dos quais já romperam com o partido. Segundo membros do Aliança, muitas assinaturas foram perdidas com a saída desses integrantes. Alguns dos ex-militantes são acusados de terem “roubado” fichas. Um caso citado é de um evento de fevereiro de 2020 que teria coletado 15 mil fichas, mas apenas 4 mil foram entregues. Questionado, Gilson Machado, um dos organizadores, nega que isso tenha acontecido.

Hoje, a coleta de assinaturas do Aliança é organizada por três aliados de Bolsonaro: Admar Gonzaga, ex-ministro do TSE, Luis Felipe Belmonte, empresário e advogado, e Machado. Gonzaga admite que não há perspectiva de finalizar a coleta:

—Apesar disso estamos indo muito bem. O problema é que se os cartórios eleitorais cumprissem o prazo, nós estaríamos muito mais longe. Agora parou tudo de novo, por conta do processo de recrudescimento da doença. Isso (prazo) virou uma coisa sem perspectiva, por que como é que vamos saber como isso vai se comportar?