O Globo, n.32000 , 18/03/2021. País, p.5
Mendonça aciona PF para investigar crítica de Bolsonaro
Daniel Gullino
18/03/2021
Ministro diz que autor da mensagem “não vale um pequi roido', em outdoor no Tocatins, cometeu crime contra a honra do presidente
O ministro da Justiça, André Mendonça, determinou que a Polícia Federal (PF) investigue o sociólogo Tiago Costa Rodrigues e o empresário Roberval Ferreira de Jesus, do Tocantins, por envolvimento na instalação de outdoors, em Palmas, com críticas ao presidente Jair Bolsonaro. Umas das mensagens afirma que Bolsonaro “vale menos que um pequi roído”, gíria local que usa o nome de um fruto do cerrado para fazer uma associação a quem não tem valor.
A existência da investigação foi divulgada pelo “Jornal do Tocantins” e confirmada pelo GLOBO. Os outdoors — pagos por Rodrigues e instalados pela gráfica de Jesus — foram colocados nas ruas em agosto de 2020.
Ocaso chegou ao Ministério da Justiça depois de passar pela Polícia Federal, que foi notificada por um empresário local, e pelo Ministério Público. Os dois órgãos decidiram pelo arquivamento sob o argumento de que, conforme o Código Penal, crimes cometidos contra a honra do presidente da República só podem ser investigados mediante representação do Ministro da Justiça. E foi o que ocorreu. Em dezembro, Mendonça determinou a abertura do inquérito.
“Diante dos fatos narrados, requisito ao Diretor-Geral da Polícia Federal que adote as providências para a abertura de inquérito policial com vistas à imediata apuração de crime contra a honra do Presidente da República”, escreveu o ministro, em 8 de dezembro.
Em depoimento, Jesus afirmou que foi apenas contrata dopara a instalação eque também já tinha feito outdoors com mensagens favoráveis ao presidente. Rodrigues, secretário de formação do PCdoB em Tocantins, contou que fez uma vaquinha on-line para instalar os outdoors, que custaram R $2,3 mil. Ele explicou, também em depoimento, que acrítica não foi “pessoal” a Bolsonaro:
— Foi sobre a gestão dele em relação à pandemia.
Rodrigues e sua defesa esperaram que o caso seja arquivado por não se trata de crime, mas de liberdade de expressão.
O Ministério da Justiça foi procurado para comentar o caso, mas não respondeu.
Esta não é a primeira vez que críticos do presidente são instados a prestar esclarecimentos. Na segunda-feira, a Polícia Civil do Rio intimou o youtuber Felipe Neto a depor depois que ele usou uma rede social para chamar Bolsonaro de “genocida”, no contexto de criticar a gestão federal da pandemia. Ele foi enquadrado por supostamente ter cometido crime previsto na Lei de Segurança Nacional, após queixa apresentada à polícia pelo vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos) filho do presidente da República.
Em junho do ano passado, a mesma lei foi invocada pelo ministro da Justiça ao pedir que a PF e a Procuradoria-Geral da República investigassem a publicação do jornalista Ricardo Noblat no Twitter de uma charge de Bolsonaro. No desenho do cartunista Renato Aroeira, o presidente aparece com balde e pincel nas mãos após pintar as pontas de uma cruz vermelha (símbolo usado em hospitais e ambulâncias) e transformá-la em uma suástica (símbolo do nazismo).