O Globo, n.32001 , 19/03/2021. Economia, p.17

 

Bolsonaro resiste a mudar seguro-desemprego para reeditar a MP 936

Geralda Doca

19/03/2021

 

 

Proposta, que bancaria programa de corte de salário, previa regras mais duras para concessão do benefício e redução gradual do valor

O presidente Jair Bolsonaro não gostou da proposta da equipe econômica de mudar as regras do seguro-desemprego para renovar o programa de redução salarial, que vigorou ano passado por meio da medida provisória (MP) 936. Segundo interlocutores do Palácio do Planalto, Bolsonaro determinou que os técnicos reformulem o projeto, o que pode atrasar o anúncio da medida, previsto inicialmente para esta semana.

A ideia era reduzir o valor da parcela do seguro-desemprego em 10% de forma gradativa até um salário mínimo e ampliar o tempo de carência para quem solicitasse o benefício mais de uma vez — o que poderia prejudicar os trabalhadores. O objetivo era diminuir as despesas do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), que arca com o seguro-desemprego, e usar a sobra na complementação dos salários de empregados afetados pelos cortes de salário.

A mudança nas regras seria acompanhada de uma reforma mais ampla no FAT para evitar que os trabalhadores recorram com frequência ao seguro-desemprego e estimular ageração de empregos. Para isso,a proposta previ apagamento de bônus para recém-demitidos que fossem recontratados e estímulos para as empresas, como diminuição da alíquota do FGTS de 8% para 2%, além de redução à metade da multa de 40% nas demissões sem justa causa.

A ideia em estudo pela equipe econômica permitiria compensar ostra balhadores afetados pelos acordos de redução de jornada ou suspensão de contratos sem descumprir regras fiscais. No ano passado, a MP 936 se baseou no decreto de calamidade pública, que suspendeu totalmente travas como o teto fiscal e a meta de resultado das contas públicas, o que abriu caminho para gastar mais de R$ 30 bilhões com o programa.

‘MOMENTO NÃO É APROPRIADO’

Ainda não anunciado oficialmente, o plano é visto com receio por especialistas. Na visão do economista Manoel Pires, a proposta tem méritos, mas não seria uma solução adequada no momento de alta do desemprego:

— Você tem uma parcela da população que usa muito o seguro-desemprego, porque é mais vulnerável, com baixa qualificação, só consegue emprego com salário menor eroda muito.

Segundo estimativa do especialista em mercado de trabalho Rodolfo Torelly,amed ida tem potencial para retirar das mãos dos trabalhadores ao menos R$ 3 bilhões por ano, considerando apenas a redução no valor da parcela.

—O momento não é apropriado —resume Torelly.

Com as mudanças na proposta, a renovação do programa de redução salarial, batizado de Benefício Emergencial (BEm), vai atrasar. A medida é muito aguardada principalmente pelo setor de serviços.

—Em janeiro, o presidente Jair Bolsonaro nos prometeu dar uma solução em 15 dias, mas já vão completar 60 dias — queixou-se Paulo Somucci, presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel).