O Globo, n.32005 , 23/03/2021. Sociedade, p.11

 

Troca lenta no ministério atrapalha combate à Covid, dizem gestores

Paula Ferreira

Leandro Prazeres

Jussara Soares

23/03/2021

 

 

Estados tratam questões com equipe de Pazuello, e investigações do MPF estão travadas; OMS pede alinhamento de esferas de poder

A demora na oficialização da troca do ministro da Saúde, anunciada na semana passada, tem repercutido mal entre governadores e secretários. Em meio ao agravamento da pandemia, a pasta está sem comando definido, atrapalhando a condução do combate à Covid-19. Entes das esferas estaduais e municipais ainda têm tratado as questões urgentes com o atual ministro, Eduardo Pazuello, e sua equipe, mas sem saber o que esperar do cardiologista Marcelo Queiroga e se haverá mudança de rumo.

Ontem, a Organização Mundial da Saúde (OMS) desejou ao novo ministro “competência e firmeza” e disse que a condução da pandemia deveria ser alinhada em todas as esferas de poder. A organização também alertou para o fato de que as mortes pela Covid-19 no país dobraram no último mês. “A mensagem extremamente importante que ele (Queiroga) já se posicionou foi de as políticas de saúde serem baseadas em evidências científicas (...) e que sejam alinhadas nas três esferas de governo”, disse a vice-diretora geral da OMS, Mariângela Simão.

Segundo gestores, formou-se um vácuo na pasta que impossibilita a resolução de questões da pandemia. Além disso, a demora na posse tem atrapalhado as investigações em curso sobre o Ministério da Saúde no Ministério Público Federal (MPF).

O governador da Bahia, Rui Costa (PT), diz que as discussões seguem com a equipe de Pazuello, e que o futuro ministro não entrou no circuito para debater temas urgentes com os estados. O governador cita as negociações sobre a compra de vacinas pelo Consórcio Nordeste e de medicamentos para intubação.

— A conversa foi com o ministro que está saindo, porque agora é no gerúndio, e não fizemos reunião com ministro que está entrando.

E esse saindo e entrando já tem uma semana —disse.

Gestores reclamam que “nada avança” na pasta. Ada tapara aposse de Queiroga já foi alterada diversas vezes. A última previsão é que ocorra na quinta-feira, mas o governo evita cravar o dia. As conversas sobre questões relacionadas à pandemia têm sido assumidas pelo atual secretário executivo, Élcio Franco, mas, segundo interlocutores, nem ele sabe dizer se continuará no ministério coma saída de Pazuello.

Como O GLOBO mostrou, o impasse em relação ao destino de Pazuello após a saída da pasta e os trâmites burocráticos de Queiroga para se desvencilhar de empresas das quais é sócio têm atrasado a nomeação.

—Espero que essa situação seja resolvida o quanto antes. Há urgência — afirmou o presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde, Carlos Eduardo Lula.

INVESTIGAÇÕES IMPACTADAS

Outra esfera na qual a demora na nomeação gera impasse é a judicial. Há ao menos quatro investigações em curso conduzidas pelo MPF sobre a atuação do ministério no combate à Covid-19. Em uma delas, que tramita no Distrito Federal, a indefinição sobre quem está, de fato, no comando da pasta está atrasando a obtenção de informações sobre as ações do ministério.

Na semana passada, a Procuradoria da República no Distrito Federal (PR-DF) enviou um ofício a Queiroga como ministro da Saúde logo após ele ser anunciado pelo presidente Jair Bolsonaro. O ofício pedia informações sobre um aplicativo lançado pelo governo federal que recomendava medicamentos sem comprovação científica para o tratamento da Covid-19.

Como Queiroga foi anunciado ministro, a responsável pelo envio do ofício seria a Procuradoria Geralda República (PGR). A PR-DF enviou o ofício à PGR solicitando que ela pedisse as informações junto ao ministério. Já que Queiroga ainda não assumiu, o ofício terá de retornar à PR-DF e só deverá ser enviado novamente quando ele for nomeado.

O novo ministro da Saúde já é aguardado na próxima semana na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara. O requerimento do convite foi aprovado pelo colegiado na última quarta-feira, quando estava marcada a idade Pazuello. Com o anúncio da substituição, a visita do ministro foi cancelada. A comissão decidiu que Queiroga fosse convidado afalar sobre a pandemia e seu plano para a crise sanitária.

— Queremos que ele vá à comissão apresentar o mais rápido possível o que ele quer fazer para o país. Foi apresentado no Congresso um cronograma de vacinação que é inaceitável. É grave e não estamos podendo perder uma semana. Cada dia são 3 mil mortes — disse o deputado Alexandre Padilha (PT-SP), integrante da comissão e exministro da Saúde.