Valor Econômico, n. 5198, v.21, 02/03/2021. Política, p.A7

 

 

 

Fachin diz que democracia está ‘sob ataque’ e alerta para riscos

 

Ministro aponta atentados contra a liberdade de imprensa, apologia à ditadura, à tortura e à repressão política

Por Isadora Peron — De Brasília

 

O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou ontem que “a democracia brasileira está sob ataque” e que o “momento é de alerta”, para que não haja retrocessos.

 

“Basta ver o que atualmente se apresenta, além da tragédia pandêmica que assola o país: envenena-se a democracia com atentados contra a liberdade de imprensa, com apologia à ditadura, à tortura e à repressão política, com intimidações inadmissíveis a outros Poderes, com a depreciação do valor do voto, com o incentivo às armas e à violência, com a incitação à animosidade entre as Forças Armadas e instituições civis”, disse.

 

Para o ministro, as conquistas do Estado Democrático de Direito estão ameaçadas. Ele afirmou que, apesar de no mundo hoje as nações que possuem governos democráticos serem mais numerosas que os autoritários, “há intermitências e severos retrocessos”. “A democracia é uma conquista que exige vigília e proteção”, apontou.

 

Em meados de fevereiro, o STF mandou prender o deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), após ele divulgar um vídeo com ataques aos ministros da Corte e fazendo apologia ao Ato Institucional nº 5 (AI-5), que endureceu a ditadura militar em 1968.

 

No últimos tempos, Fachin tem se apresentado como uma voz de contraponto ao governo Jair Bolsonaro dentro do STF, após a aposentadoria do decano Celso de Mello, no ano passado.

 

Ele, que assumirá a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no ano que vem, tem demonstrado preocupação com os ataques e desconfianças disseminadas em relação ao resultado das eleições ao redor do mundo.

 

Em sua fala, o ministro defendeu que a existência de um processo eleitoral “livre e justo” é pressuposto fundamental de uma democracia representativa.

 

Ele também listou o que considera ser os pilares de uma democracia: o princípio da separação de Poderes, as liberdades de imprensa e de expressão e a criação de um sistema eficaz na distribuição dignidade.

 

Fachin, porém, disse que esse sistema “não se encontra isento de falhas, e por isso não nos livra de males como a opressão e o populismo autoritário”. “Ademais, não nos imuniza por completo do vírus do autoritarismo como hoje assola o Brasil, ameaçando o sistema eleitoral brasileiro e a própria democracia.”

 

O ministro afirmou ainda ser “imprescindível” preservar as instituições e seus ganhos institucionais e que a saída para esses problemas devem ser pacíficas e sempre dentro da Constituição”.

 

Para ele, eleições periódicas e alternância pacífica no poder são os antídotos contra o retrocesso. “Será muito mais grave, gravíssimo mesmo, se o ataúde que está sendo cavado levar consigo a própria democracia. Há saída, com racionalidade e equilíbrio, e ela passa pela porta aberta da Constituição de 88”, disse.

 

As declarações de Fachin aconteceram durante um evento online em homenagem ao constitucionalista Paulo Bonavides, morto em 2020. O encontro foi organizado pela Comissão de Estudos Constitucionais da OAB, comandada por Marcus Vinicius Furtado Coêlho.