O Globo, n.32010 , 28/03/2021. País, p.8

 

Aliados querem campanha ‘profissional’ em 2022

Jussara Soares

28/03/2021

 

 

Em um cenário distinto ao de 2018, entorno de Bolsonaro prevê necessidade de uma estrutura maior e mais recursos para enfrentar na campanha o desgaste do mandato e, possivelmente, Lula; fato terá peso na busca por novo partido

Ao mesmo tempo em que o presidente Jair Bolsonaro tenta se encaixar na versão desenhada para manter líderes do Centrão em sua base até 2022, aliados e auxiliares envolvidos no processo de escolha de um novo partido para o chefe do Executivo já fazem as contas do custo da reeleição. O diagnóstico é que o desgaste do mandato e a possibilidade de enfrentar o ex-presidente Luiz Inácio Lula (PT) da Silva nas urnas forçarão a profissionalização da campanha e o uso maior de recursos para bancar as despesas de propaganda e viagens pelo país. Como presidente, Bolsonaro, obrigatoriamente, precisa viajar no avião da Força Aérea Brasileira, acompanhado por seguranças da Presidência. Os voos feitos em busca de votos, no entanto, precisam ser ressarcidos aos cofres públicos pelo partido do presidente-candidato ou pela coligação, conforme previsto na legislação eleitoral.

Em 2018, viajando em voo comercial, sem tempo de televisão no primeiro turno e impedido de ir às ruas em boa parte do período eleitoral após levar uma facada, Bolsonaro declarou à Justiça Eleitoral ter gasto apenas R$ 2,8 milhões. O valor é pouco mais da metade dos R$ 5,09 milhões gastos pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT) para bancar apenas despesas de transporte em sua campanha pela reeleição em 2014. Os recursos foram devolvidos para a União. Naquele ano, a petista declarou ter gasto R$ 318 milhões.

Já na reeleição de Lula em 2006, o PT ressarciu R$ 4,8 milhões ao governo pelo uso do avião presidencial e de seguranças para acompanhá-lo durante todo o período eleitoral. Em 2010, o partido devolveu aos cofres públicos R$ 2,26 milhões pelos trajetos feitos por Lula para acompanhar a então candidata Dilma em diversas atividades de campanha.

TEMPO MAIOR NA TV

Outro argumento é que Bolsonaro precisará de um tempo muito maior de exposição na TV para defender as ações do governo diante da ofensiva da oposição. Embora o governo aposte que a pandemia estará sob controle neste ano, os efeitos sociais e econômicos da crise sanitária deverão pautar o debate na disputa eleitoral. Aliados de Bolsonaro também defendem que ele passe a usar melhor os meios de comunicação tradicionais para se posicionar. É uma mudança de postura na base do presidente, que sempre defendeu as redes sociais, motor que levou Bolsonaro ao Palácio do Planalto. Bolsonaristas também temem que empresas de tecnologia utilizem critérios semelhantes aos adotados para suspender a conta de Donald Trump, então presidente dos Estados Unidos, e demonstram preocupação com a redução da presença e a potencial ocupação do espaço por adversários políticos.

— Em 2018, Bolsonaro em diversos aspectos contrariou as expectativas. Nenhum candidato ganhava numa posição de extremo sem tempo de televisão e sem aliança, e ele ganhou. Bolsonaro rompeu paradigma na eleição passada, mas acho muito difícil que isso se mantenha em 2022 — avalia José Paulo Martins Junior, diretor da Escola de Ciência Política da Universidade Federal do Estado do Rio (Unirio).

Até mesmo o uso de pesquisas eleitorais internas passou a ser defendido no entorno do presidente, que sempre rechaçou esse tipo de levantamento. Segundo um importante aliado no Congresso, Bolsonaro tem sido aconselhado a utilizar a ferramenta de diversas empresas junto com monitoramento das redes para balizar a estratégia. Em 2018, a campanha de Bolsonaro não declarou gastos com pesquisas.

É com base nesses argumentos que a volta ao PSL está sendo construída com ajuda do senador Flávio Bolsonaro e o vice-presidente da sigla, Antônio Rueda. O dois tentam organizar um encontro entre Bolsonaro e o presidente do PSL, deputado Luciano Bivar (PE), nos próximos dias. A expectativa de parlamentares bolsonaristas ligados à sigla é que decisão seja anunciada até o início de abril.

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Presidente tenta superar oposição interna antes de voltar ao PSL

28/03/2021

 

 

Em busca de um partido com estrutura para disputar as eleições de 2022, o presidente Jair Bolsonaro tenta vencer focos de resistência para retornar ao PSL, sigla que deixou há pouco mais de um ano após desavenças com a direção nacional.

O partido, que terá a segunda maior fatia do fundo eleitoral e do tempo de propaganda em TV, é visto por aliados de Bolsonaro como a alternativa viável, em meio às repreensões que o presidente tem recebido de parlamentares do Centrão. A maior oposição está em São Paulo. O principal símbolo da contrariedade era o senador Major Olimpio, que morreu há dez dias em decorrência da Covid-19 — parlamentares avaliam que a recusa de Bolsonaro em prestar condolências também atrapalhou o cenário.

— O PSL precisa buscar uma alternativa sólida. O país está numa situação de desesperança por conta da Covid-19, e o presidente não vem mostrando sensibilidade humana — criticou o deputado Junior Bozzella, presidente do diretório paulista. EmboraavoltasejadefendidaporpartedacúpuladoPSL, o presidente da legenda, deputado Luciano Bivar (PE), ainda resiste. Emissários de Bolsonaro já fizeram sucessivas reuniões com o vice de Bivar no PSL, Antonio Rueda, numa tentativa de desarmar o conflito iniciado em 2019. Bivart ema dotado o discurso de queBol sonar o precisaria “se adequar” eque o PS L planeja fazer parte de um“projeto de centro” em2022.Biv ar espera também atrair parlamentares de outras legendas na próxima janela partidária, no início do ano que vem, o que poderia mitigar o peso interno do bolsonarismo. Por outro lado, a maior parte da bancada federal de 53 deputados apoia Bolsonaro.

A eleição à presidência da Câmara deu um termômetro: mais de 30 parlamentares assinaram as listas em apoio a Arthur Lira (PP-AL), candidato de Bolsonaro, rejeitando o bloco formado por Baleia Rossi (MDB-SP), que tinha o apoio da cúpula do partido. Para esses parlamentares, a eventual ida de Bolsonaro para siglas como PP, PL, PSD ou Republicanos, que já estiveram no seu radar, dificultaria os planos de reeleição da base bolsonarista, por se tratarem de partidos com diretórios estaduais já estruturados.

—Sem espaço para deputados de sua base brigarem por mais um mandato, o presidente correria o risco de ver sua identidade se diluir dentro de outro partido. O PSL pode ter alguns focos de ferrugem, mas tem identificação com o bolsonarismo — avalia o deputado Luiz Lima (PSLRJ), que defende o retorno.