Valor Econômico, n. 5199, v.21, 03/03/2021. Brasil, p.A7

 

 

 

 

 

Governo não pode obter vantagens sobre investidores em estatais, diz OCDE

 

Chave para blindar as empresas de interferências é o fortalecimento dos conselhos de administração, defende entidade

Por Lu Aiko Otta — De Brasília

 

O Estado não deve usar empresas estatais para obter vantagens indevidas em relação a outros investidores das empresas, disse ontem o economista-sênior da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) Hans Christiansen, na apresentação de relatório sobre as estatais brasileiras. “Vemos isso nos jornais”, comentou, sem especificar a quais episódios se referia.

 

A chave para blindar as empresas de interferências é o fortalecimento dos conselhos de administração, segundo explicou. Disse que esses devem ser profissionalizados e se manterem independentes do poder público, acrescentou. “Não é possível que o Estado interfira de maneira cotidiana nas empresas.”

 

Essas recomendações constam do relatório e estão alinhadas com diretrizes gerais da organização para empresas estatais em geral.

 

Especificamente em relação ao Brasil, uma das principais recomendações do relatório é garantir que a nomeação e a destituição de presidentes de empresas estatais sejam feita apenas pelos conselhos de administração das empresas, disse o analista de políticas da OCDE Caio Oliveira.

 

Não deve ser prerrogativa do presidente da República ou do ministro, porque os conselhos não deixam de ser filtros contra indicações políticas, disse. Além disso, o poder de destituir permite aos conselhos fiscalizar resultados.

 

A transferência da escolha dos chefes das estatais para os conselhos não demandaria grandes alterações legais, disse. Exceções são Caixa e Banco do Brasil, pois nesse caso a lei estabelece que a nomeação dos presidentes cabe ao presidente da República. “Mas não é impensável uma delegação.”

 

Outra recomendação da OCDE é garantir a presença de pessoas qualificadas. Uma avaliação sobre o perfil dos conselheiros mostrou que há poucos especialistas em contabilidade e auditoria e também poucas pessoas com experiência internacional. A recomendação é recorrer a “headhunting”.

 

A OCDE avaliou ainda que a remuneração para dirigentes de empresas estatais é inferior à do mercado e recomenda uma aproximação de valores. A União, diz o documento, deve estabelecer seus objetivos de longo prazo ao deter empresas estatais. Dessa forma, a seleção das que serão desestatizadas fica mais racional.

 

Outro item é a fixação de metas financeiras e não financeiras, pois a falta delas impede a cobrança de resultados. “ Em vez de telefonemas e reuniões entre ministros e presidentes de estatais, a recomendação é que se tenha um documento claro definindo esses objetivos.”

 

De 245 instrumentos da OCDE, o Brasil aderiu a 99 e solicitou adesão a outros 44, disse o secretário-especial adjunto da Secretaria Especial de Relacionamento Externo da Casa Civil, Pedro Florêncio. É, entre os candidatos a ingressar na organização, o que tem maior número de adesões.