Valor Econômico, n. 5201, v.21, 05/03/2021. Política, p.A6

 

 

 

Senado aprova PEC com limite para auxílio emergencial

 

Líder do MDB diz que tirar trava seria dar “cheque em branco” a Bolsonaro

Por Renan Truffi e Vandson Lima — De Brasília

 

 

Após fazer diversas concessões, o governo conseguiu aprovar ontem no Senado a proposta de emenda à Constituição (PEC) emergencial. A vitória exigiu a mobilização da base aliada para salvar o dispositivo que estabelece um limite de R$ 44 bilhões para os gastos com o novo auxílio emergencial. Entre as alterações de última hora, no entanto, foi criada a possibilidade de vinculação dos recursos dos militares. A matéria segue agora para a Câmara dos Deputados e a expectativa é que o governo envie o mais rápido possível uma medida provisória que regulamente o novo benefício social.

 

Foram necessários dois dias de discussão para a aprovação da proposta em dois turnos. Em ambas as votações, o governo conquistou apoio amplo: 13 votos a mais do que os 49 necessários. A disputa mais complicada foi para derrubar um destaque de autoria do PT, que apresentou uma emenda buscando retirar do texto o limite de R$ 44 bilhões que será gasto com o novo auxílio emergencial.

 

Essa barreira é importante para o Palácio do Planalto, que tenta passar algum tipo de segurança fiscal ao mercado e evitar que os parlamentares aumentem o valor mensal do auxílio de maneira exagerada. Diante do risco, o governo mobilizou os partidos de centro, como PP e PSD, que votaram contra a emenda. Foram 55 votos a favor da manutenção do texto contra apenas 17 contrários. O assunto gerou embate no plenário. O líder do MDB, Eduardo Braga (AM), ironizou a ofensiva por acreditar que a emenda daria “cheque em branco" ao presidente Jair Bolsonaro fora do teto de gastos.

O líder da minoria na Casa, Jean Paul Prates (PT-RN), rebateu. “É cheque em branco? Que seja cheque em branco, que o presidente [Bolsonaro] diga lá que foi ele que fez - o que não é verdade porque nós é que estamos fazendo. Agora, nós, do Senado, não vamos sair com essa alcunha de quem colocou limite no auxílio emergencial. Esse é que é o ponto”, disse o petista.

 

O substitutivo que será enviado aos deputados abandonou algumas das regras relacionadas aos gatilhos fiscais, cujo objetivo é fazer a contenção de gastos públicos. O parecer original estabelecia por exemplo que, quando decretado o estado de calamidade pública, medidas como reajuste de salários dos servidores públicos e criação de cargos ficariam vedadas por até dois anos após a data do decreto.

 

A última versão do texto afirma, no entanto, que essas regras terão vigência apenas durante a calamidade. Por outro lado, os Estados e municípios que não cumprirem todas as medidas previstas nos gatilhos ficarão impedidos de terem acesso a empréstimos ou aval da União para a contratação desses recursos.

 

Outra concessão que foi feita de última hora diz respeito à possibilidade de vinculação de receitas da Defesa Nacional e Segurança. Num claro aceno aos militares, o relator Márcio Bittar (MDB-AC) permitiu a vinculação dos gastos dessas áreas. “[São áreas] fundamentais de atuação do Estado e que devem poder contar com um fluxo estável de recursos”, justificou. O emedebista não teve o mesmo cuidado com a Receita Federal. Ele manteve no texto a desvinculação de recursos para um fundo que custeia 70% da operação do órgão.

 

Foram feitas concessões também na questão da redução de alguns incentivos e benefícios tributários. Bittar resolveu preservar desses cortes uma série de atividades e produtos: fundos de desenvolvimento regional, Simples Nacional, Zona Franca de Manaus, entidades sem fins lucrativos e, por fim, a cesta básica. A poucos minutos da votação, ele ainda incluiu nessa lista uma “nova exceção à regra” que beneficia principalmente “outras áreas de livre comércio e as zonas francas ”, diz o texto.

 

Após a aprovação, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), sinalizou que o Congresso Nacional espera do governo um auxílio que atenda o “maior número possível” de brasileiros apesar das limitações fiscais. “Houve o limite de R$ 44 bilhões para essa finalidade, do auxílio emergencial, e agora há de se conceber quantas pessoas podem ser alcançadas por isso”, explicou. “Ano passado aprovamos um auxílio de R$ 600. Obviamente que nosso desejo é ter o maior valor possível, mas existem limitações fiscais e temos que encarar essas limitações. Vamos procurar fazer algo muito equilibrado”, respondeu.

 

Por fim, o presidente do Senado defendeu que o Legislativo precisará discutir agora um programa de renda mínima “perene”. “Uma vez aprovada a PEC emergencial, que viabiliza o auxílio, nós temos agora que começar a discutir de maneira muito firme a perenização de um programa social de renda mínima, de renda cidadão, para uma camada social que precisará do Estado até que possamos ter uma recuperação plena da economia".

 

 

 

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Lira quer concluir votação em dois turnos em um único dia

 

Presidente da Câmara escolheu o bolsonarista Daniel Freitas para relatar em plenário a PEC emergencial

Por Marcelo Ribeiro e Raphael Di Cunto — De Brasília

 

 

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmou ontem que espera concluir os dois turnos da votação da PEC Emergencial na quarta-feira.

 

Pouco depois da aprovação do texto pelo Senado, ele designou o deputado Daniel Freitas (PSL-SC), aliado do presidente Jair Bolsonaro, para a relatoria do projeto e agendou a votação da admissibilidade da proposta de emenda constitucional para a terça-feira.

 

“Votaremos na semana que vem. Deputados e deputadas tendo conhecimento do texto, dá para as lideranças dos partidos se posicionarem com relação ao mérito", afirmou Lira, acrescentando que existe uma possibilidade mínima de acordo no plenário.

 

Integrante da ala bolsonarista do PSL, Freitas foi comunicado pelo próprio Lira, em reunião na residência oficial, que seria o relator.

Ontem mesmo passou a tarde conversando com sua equipe técnica e deve se reunir hoje com o ministro da Economia, Paulo Guedes.

 

O chefe da equipe econômica participou ativamente das negociações com o relator da PEC Emergencial no Senado, Márcio Bittar (MDB-AC), antes de o texto ser aprovado pelos senadores. O objetivo, segundo fontes, era “deixar o texto redondo” para avançar rapidamente na Câmara.

 

Lira demonstrou otimismo com a aprovação na Câmara. “Conforme conversa com líderes, nós não temos unanimidade, mas temos maioria bastante significativa. Importante que saibamos que, enquanto as comissões não estão instaladas, a gente pode abreviar o rito dessa PEC."

 

O governo tem pressa, para que a promulgação ocorra já na próxima semana. Depois disso, será possível encaminhar ao Congresso a medida provisória (MP) do auxílio emergencial, o que viabilizará efetivamente a retomada do pagamento do benefício por quatro meses, entre março e junho.

 

Alinhado ao Palácio do Planalto, Lira costurou acordo entre líderes partidários para garantir que a PEC Emergencial tramitasse diretamente no plenário da Câmara, sem ter que passar pelas comissões. Apesar de ter construído maioria para acelerar a tramitação, partidos de oposição e o Novo são contra o rito sumário e prometeram trabalhar contra.

 

Anteontem, Lira participou de uma reunião de emergência antes mesmo de o texto ser aprovado em primeiro turno pelo Senado. Diante dos rumores de que o Congresso trabalhava para incluir o Bolsa Família na exceção do teto de gastos, o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, foi ao Congresso para desarmar a bomba.

 

Em conversa com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), com Lira e líderes governistas, o ministro reforçou pedido para que o teto de gastos fosse respeitado.

 

Após o encontro, Lira declarou que o Congresso não criaria nova exceção ao teto de gastos. No mesmo sentido, o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), foi às redes sociais para criticar a medida. “Tirar o Bolsa Família do teto pode parecer algo socialmente benéfico, mas os impactos no câmbio, juros e inflação vão corroer qualquer ganho ilusório momentâneo”, escreveu o deputado do PL.