Valor Econômico, n. 5201, v.21, 05/03/2021. Política, p.A8

 

 

 

 

Novo procurador-geral do RJ muda estruturas de investigação

 

 

Alterações afetam a condução dos casos Flávio e Marielle

Por Gabriel Vasconcelos — Do Rio

 

 

O procurador-geral de Justiça do Rio de Janeiro, Luciano Mattos, reformulou o Ministério Público do Estado (MP-RJ) com a extinção da maior parte dos sete grupos especializados do órgão. Entre as estruturas encerradas está o Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção (Gaecc), que iniciou as investigações contra o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos) e reuniu as provas do caso da “rachadinha”. Ontem, a dez dias de completar três anos do assassinato da vereadora carioca Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes, Mattos também anunciou a criação de uma força-tarefa com o objetivo de avançar na investigação do caso. Falta indicar o mandante do crime.

 

Em função do foro privilegiado de Flávio Bolsonaro, a atuação do MP-RJ no processo é atribuição direta do procurador-geral. Ao contrário do antecessor Eduardo Gussem, Mattos vem concentrando de fato a condução do caso.

 

Mattos afirmou que ainda não está decidido se o MP-RJ vai recorrer da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que anulou a quebra do sigilo bancário do senador. Uma decisão, informou, só será tomada após publicação do acórdão no STJ. Questionado sobre o episódio da compra de uma mansão em Brasília pelo Senador, Mattos afirmou que o assunto será “objeto de investigação”.

 

O processo central do caso corre no Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ), mas há causas paralelas no STJ e uma análise da competência do caso no Supremo Tribunal Federal (STF). O cruzamento de ações em diferentes instâncias empurra para frente uma decisão definitiva sobre o caso, que veio à tona há mais de dois anos.

 

Mattos contará com a Assessoria Originária Criminal, nova nomenclatura para o grupo de procuradores que auxiliam diretamente o procurador-geral. O chefe dessa assessoria será o procurador de justiça Luciano Lessa, quem vai sugerir os próximos passos do MP-RJ no caso da “rachadinha”.

 

Ele garante que as mudanças no órgão, publicadas quarta-feira no diário oficial do MP-RJ, não prejudicam sua atuação. Sobre o Gaecc especificamente, o procurador-geral informou que suas atribuições serão absorvidas pelo grupo de combate ao crime organizado, o Gaeco, que será mantido sob nova direção e formato.

 

O novo Gaeco será dividido em dois núcleos, um de combate à criminalidade organizada e outro de combate à corrupção. De acordo com a resolução, esses núcleos combaterão milícias, tráfico de drogas, lavagem ou ocultação de bens e crimes contra a administração pública.

 

O grupo especializado remanescente contará com 21 promotores dedicados, sete a menos do que na gestão anterior. Portanto, vai acumular funções com pessoal menor. Mattos relativizou o fato, ao dizer que o Gaeco renasce com menor quantidade de trabalho porque todos os processos foram devolvidos aos promotores naturais e, também, porque a lotação do grupo poderá variar conforme o aumento da demanda. Promotor natural é aquele originalmente designado para tocar uma investigação de forma individual.

 

É ao núcleo de combate à corrupção do novo Gaeco que um promotor natural poderá entregar a condução de casos como o de Flávio ou de seu irmão, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos), que também foi alvo de investigação do antigo Gaecc por suspeita de empregar funcionários fantasmas em seu gabinete. Não há informações se essa frente contará com integrantes do antigo Gaecc.

 

A reformulação promovida por Mattos já era esperada e deu o tom de sua campanha na eleição interna do órgão. Ele disse que antigos ou novos grupos especializados ainda podem ser habilitados, mas a ideia é que os promotores naturais atuem mais com forças-tarefa e grupos temáticos, estruturas com prazo definido de atuação.

 

Uma dessas forças-tarefas que nasce com força na gestão de Mattos é justamente a que vai se debruçar sobre o assassinato de Marielle Franco. O procurador-geral justificou a novidade pela complexidade do caso, que envolve 15 procedimentos diferentes dentro do MP-RJ. Três promotores ficarão completamente dedicados ao caso e contarão com o suporte de um grupo interno de policiais civis.

 

A chefe da nova força-tarefa é a promotora Simone Sibílio, no caso desde o início. Ela foi a responsável pela denúncia oferecida em março de 2019 contra os executores do crime, os ex-policiais militares Ronnie Lessa e Élcio Queiroz.

 

Trata-se de uma recondução de Simone à função que desempenhou até o fim de 2020. Nos últimos dois meses, a investigação ficou parada sob o guarda-chuva genérico do Gaeco. A expectativa agora é que a investigação avance e aponte os mandantes do assassinato. Mattos disse que a criação da força-tarefa é uma demonstração da importância que sua gestão pretende dar ao caso Marielle.