Valor Econômico, n. 5205, v.21, 11/03/2021. Brasil, p.A8

 

 

 

UE discute mais compromissos ambientais do Mercosul

 

Debate a ser realizado hoje não significa, porém, necessariamente pressa pelos europeus

Por Assis Moreira — De Genebra

 

Os 27 países-membros da União Europeia farão uma reunião técnica hoje para examinar opções de compromissos adicionais que querem ter do Mercosul em questões ambientais, sobretudo no combate ao desmatamento da Amazônia, segundo fonte da Comissão Europeia.

 

A União Europeia tinha prometido apresentar em janeiro sua proposta, para atenuar “bom número de preocupações” levantadas por alguns Estados-membros, principalmente envolvendo a proteção da Amazônia. Em meio à demora, a Argentina, na presidência rotativa do Mercosul, cobrou recentemente em evento no Parlamento Europeu que “o tempo passa e não recebemos sinal [da UE] para trabalhar de maneira conjunta [sobre o tema]”.

 

Em todo caso, o fato de a União Europeia agora começar a discutir a elaboração da proposta não significa necessariamente ter pressa. Nesta semana, o negociador comercial chefe do bloco europeu, Valdis Dombrovskis, disse a parlamentares franceses que, por enquanto, não há um cronograma preciso para chegar a um acordo com os países do Mercosul nesse ponto.

 

“Vai demorar muito”, completou rapidamente o ministro de Comércio da França, Franck Riester. A Comissão Europeia, braço executivo da UE, defende firmemente o acordo. Valdis argumentou junto aos franceses que a França seria o segundo país, depois da Alemanha, a mais se beneficiar do acordo com o Mercosul. Exemplificou que os franceses já são o primeiro exportador de produtos lácteos para o bloco do cone sul e que 100 mil empregos franceses dependem das exportações para esses países.

 

Já o ministro francês avisou que a França não ficará satisfeita com um acordo político paralelo com o Mercosul sobre sustentabilidade nem com opções de “fast-track” para ratificação do acordo comercial.

 

Segundo Riester, a França não está sozinha na oposição ao acordo tal como ele é atualmente. Disse que Bélgica, Luxemburgo, Áustria e Polônia estão do lado dos franceses. Entre os principais apoiadores do acordo, estão Portugal, Espanha, Itália, Alemanha, Suécia e República Tcheca.

 

“Precisamos de garantias objetivas, mensuráveis e verificáveis”, disse o ministro francês, em referência sobretudo ao combate ao desmatamento na Amazônia.

 

Para alguns países da UE, uma eventual declaração ambiental anexa ao acordo significará compromisso adicional do Mercosul. Já do lado do Brasil, a expectativa é de uma declaração política que reafirme todos os compromissos já incluídos no acordo birregional, como o Acordo de Paris contra mudança climática, proteção da biodiversidade e da floresta.

 

“Quem considera que é preciso uma declaração paralela é a UE, não é o Mercosul. Cabe então à UE apresentar uma proposta que vamos examinar com toda boa vontade”, afirmou o secretário de Negociações Bilaterais e Regionais nas Américas, embaixador Pedro Miguel Costa e Silva.

 

“É importante ressaltar que o Brasil não considera que o acordo esteja incompleto ou que possa criar qualquer tipo de problema em termos ambientais, em termos de mudança de clima ou na área social. Pelo contrário. É o acordo mais avançado que a UE negociou em termos de desenvolvimento sustentável”, acrescentou o embaixador.

 

Para o diplomata, também precisa ficar bem claro que “não é só o Mercosul que tem responsabilidades em termos de preservação do meio ambiente e combate à mudança do clima. A UE e seus países-membros têm importantes responsabilidades a cumprir. Qualquer documento adicional terá de ser equilibrado e refletir as responsabilidades das duas partes.”

 

“Um exemplo claro diz respeito à matriz energética. A UE tem muito dever de casa a fazer. Dever de casa que o Brasil já fez”, afirmou Costa e Silva.

 

Na Europa, cada vez que apoiadores do acordo se manifestam, mesmo sabendo que a ratificação não tem chance no curto ou médio prazo, a reação é imediata do lado dos críticos, num círculo vicioso que pesa para as empresas dos dois blocos.