Valor Econômico, n.5213, 23/03/2021. Brasil, p.A2

 

Pasta de Rogério Marinho é principal beneficiada em proposta de Orçamento

Vandson Lima

Renan Truffi

23/03/2021

 

 

Vitrine de obras para os políticos, Ministério do Desenvolvimento Regional recebe 66% mais recursos em parecer

O Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) recebeu o maior acréscimo proporcional de recursos entre os ministérios no parecer do Orçamento para 2021. Em uma vitória para Rogério Marinho, sempre às turras com o ministro da Economia Paulo Guedes, a pasta que é vitrine de obras para os políticos terá R$ 10,6 bilhões - ante R$ 6,4 bilhões em despesas previstas anteriormente, um generoso aumento de 65,6% em relação à proposta original.

A subida para o MDR foi proporcionada pelas emendas parlamentares, com os congressistas já de olho na eleição de 2022.

A previsão é que a Comissão Mista de Orçamento (CMO) comece hoje a analisar a proposta para que esta esteja aprovada até quinta-feira, quando deputados e senadores se reúnem em sessão do Congresso Nacional para dar a palavra final sobre o texto.

O parecer apresentado pelo relator do Orçamento, senador Marcio Bittar (MDB-AC), manteve a previsão da meta de déficit primário, tal qual estabelecida na Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2021 (LDO), em R$ 247,1 bilhões. A proposta baseou suas projeções fiscais para 2021 na retomada do crescimento ao ritmo de 3,2%. “Os analistas econômicos, apesar das elevadas incertezas a respeito dos efeitos do agravamento da pandemia de covid-19, igualmente projetam crescimento na casa de 3,2%”, observa o relator. O PIB nominal, na avaliação mais recente, de 17 de março, estima que alcance R$ 8,21 trilhões em função da aceleração do nível de preços.

Sobre a inflação, Bittar anotou: “A elevação dos preços dos alimentos e, mais recentemente, dos combustíveis tem resultado em revisão da expectativa de inflação para 2021, agora está em 4,4% nas projeções oficiais e em 4,6% nas estimativas do mercado”.

Segundo o boletim Focus de 19 de março, para os analistas de mercado a Selic sofrerá alteração mais significativa e terminará o ano no patamar de 5%. A previsão para o dólar é de ficar no patamar de R$ 5,30.

As despesas observam o teto de gasto da União e ficam em R$ 1,486 trilhão. Esse valor corresponde ao limite aplicável a 2020 (R$ 1,455 trilhão) corrigido pelo percentual de 2,13% (IPCA acumulado no período de 12 meses completado em junho/2019). A participação dos Poderes Legislativo, Judiciário e Executivo, inclusive Defensoria Pública da União (DPU), e do Ministério Público da União (MPU) na parcela primária da despesa é, respectivamente, de 3,0%, 10,6%, 84,8% e 1,6%. A previsão é que 25,9% das despesas do Executivo estão condicionadas à aprovação pelo Congresso de créditos suplementares.

O valor total da despesa constante do substitutivo é de R$ 4,3 trilhões, dos quais R$ 1,6 trilhão refere-se ao refinanciamento da dívida pública. Assim, os orçamentos da União líquidos de refinanciamento da dívida totalizam R$ 2,7 trilhões.

Os recursos para educação somam R$ 100 bilhões, ante o valor mínimo de R$ 55,6 bilhões determinado pela Constituição. A complementação da União ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) é de R$ 19,6 bilhões. Para a Saúde, serão alocados R$ 136 bilhões.

O total destinado para emendas parlamentares subiu de R$ 16 bilhões em 2020 para R$ 19,1 bilhões neste ano. As emendas individuais foram elevadas de R$ 9,4 bilhões para R$ 9,6 bilhões; os gastos indicados pelas bancadas estaduais foram de R$ 5,9 bilhões para R$ 8,8 bilhões.

Em medida controversa, Bittar retirou a maior parte dos recursos para realizar o Censo Demográfico de 2021. De R$ 2 bilhões anteriormente previstos, ele cortou R$ 1,76 bilhão, sobrando somente R$ 240 milhões, o que, segundo o instituto, inviabiliza a empreitada. A pesquisa já havia sido adiada de 2020 para este ano. Parte dos funcionários do IBGE reivindicava novo adiamento da pesquisa ante à disparada no número de casos e mortes na pandemia, agora em seu pior estágio no Brasil. Eles temiam que o governo não conseguisse garantir condições de segurança suficientes para o trabalho.

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Parecer não atualiza mínimo e deve exigir bloqueio de gasto

Ribmar Oliveira

23/03/2021

 

 

 

Subestimação das despesas obrigatórias aponta para um gigantesco contingenciamento das despesas discricionárias

O parecer final do senador Marcio Bittar (MDB-AC), relator da proposta orçamentária deste ano, apresentado ontem, não alterou os valores das despesas obrigatórias estimadas em agosto do ano passado pelo governo, que realizou os cálculos com base em um salário mínimo previsto de apenas R$ 1.067,00. Hoje, o salário mínimo em vigor é de R$ 1.100.

Assim, mesmo com a mudança no valor do salário mínimo, Bittar manteve os gastos previstos da proposta original do governo para os benefícios previdenciários, benefícios assistenciais, o seguro-desemprego e o abono salarial. Além disso, o senador não incluiu no Orçamento a despesa relativa à prorrogação da desoneração da folha de salário, estimada em R$ 4 bilhões, e o adicional que a União terá que repassar neste ano para o Fundeb, devido à emenda constitucional 108.

Fontes ouvidas pelo Valor disseram que a subestimação das despesas obrigatórias feitas pelo relator permitiu que ele mantivesse as despesas discricionárias (investimentos e custeio da máquina administrativa), que incluem as emendas parlamentares, sem cortes. Na verdade, Bittar aumentou de R$ 112,3 bilhões, previsto na proposta de agosto, para R$ 113,1 bilhões as despesas discricionárias deste ano. As emendas parlamentares, por sua vez, foram elevadas de R$ 16,3 bilhões para R$ 21,5 bilhões.

O relator fez apenas um corte nas chamadas despesas discricionárias. Passou a tesoura em R$ 1,76 bilhão que estava destinado à realização dos censos demográfico, agropecuário e geográfico neste ano. Houve uma pressão muito grande de especialistas e do próprio IBGE para que o governo mantivesse esses recursos na proposta orçamentária. Agora, o dinheiro foi cortado. Ontem, ex-presidentes do IBGE e outros economistas iniciaram um movimento para manter a verba para o censo demográfico.

A subestimação das despesas obrigatórias feitas pelo relator, se aprovadas pelo Congresso Nacional, aponta para um gigantesco contingenciamento das despesas discricionárias que o governo será obrigado a fazer, logo que a lei orçamentária for sancionada, advertiram fontes consultadas pelo Valor.

Em dezembro do ano passado, em ofício dirigido ao Congresso, propondo a mudança da meta fisal de 2021, o ministro da Economia, Paulo Guedes, estimou que as despesas discricionárias, neste ano, ficariam em R$ 100,2 bilhões, incluindo nesse valor R$ 4 bilhões para a capitalização de empresas estatais, que não está incluída no teto de gastos.

Se a capitalização for retirada da conta, as discricionárias cairiam para R$ 96,2 bilhões. Como o relator estabeleceu despesas discricionárias de R$ 113,1 bilhões, retirando-se os R$ 4 bilhões da capitalização, o montante das discricionárias do parecer do cairia para R$ 109,1 bilhões. Para chegar nos R$ 96,2 bilhões projetados por Guedes, seria necessário promover um contingenciamento de R$ 12,9 bilhões em investimentos e custeio.

O valor das emendas parlamentares aumentou, em relação ao previsto inicialmente pelo governo, porque os parlamentares derrubaram vetos do presidente Jair Bolsonaro à Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), válida para este ano, mantendo a obrigatoriedade da execução das emendas de comissão e de relator.

As emendas individuais dos deputados totalizaram R$ 8,3 bilhões, as individuais de senadores chegaram a R$ 1,8 bilhão, as emendas de bancada estadual atingiram R$ 7,9 bilhões, as de comissões do Senado, a R$ 487,4 milhões, e a da Comissão Mista do Congresso, R$ 83,5 milhões. As emendas de relator Bittar somaram R$ 3 bilhões.

Embora o relator-geral não tenha corrigido as despesas orçamentárias, a Comissão Mista de Orçamento fez a revisão das receitas tributárias para este ano, com base nos novos parâmetros macroeconômicos. Por causa da revisão, as receitas da União foram elevadas em R$ 35 bilhões e incluídas pelo relator Bittar em seu parecer.