Título: A hora e a vez de Barack Obama
Autor: Azambuja, Marcos Castrioto de
Fonte: Jornal do Brasil, 18/01/2009, Sociedade Aberta, p. A10

VICE PRESIDENTE DO CENTRO BRASILEIRO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS (CEBRI)

Escrevo sem pretender isenção ou objetividade. Sou torcedor (já que, como brasileiro, não pude ser eleitor) de Barack Obama. Nele investi um não pequeno capital de esperança e estou convencido de que, se seu governo tiver sucesso, poderemos voltar aos trilhos de que nos afastamos nos últimos oito anos.

Não sei o que vai pesar mais sobre Obama. Se os imensos desafios que tem a enfrentar ou se as não menores esperanças que seus compatriotas e o resto do mundo depositaram nele.

Um dos problemas do excesso de esperanças é que a cobrança de sua realização é sempre impaciente e que elas se transformam rapidamente em frustrações quando não atendidas.

Se as esperanças têm pressa, os grandes problemas do momento reclamam igualmente ação rápida e eficaz para seu encaminhamento e solução. Obama não contará com os habituais 100 dias de trégua que são oferecidos aos novos governantes em Washington.

Terá de começar a atuar desde o dia da posse e de forma decisiva. Tem a seu favor estar bem preparado e ter reunido uma equipe de extraordinária qualidade, compensando assim sua principal vulnerabilidade que reside em sua inexperiência administrativa.

Por onde deverá começar? Vários assuntos reclamam atenção simultânea e respostas imediatas. A crise financeira internacional, o conflito em Gaza, a deterioração política e militar no Afeganistão, o cronograma da retirada do Iraque, episódios de terrorismo internacional, a salvação ou não da indústria automobilística americana deverão estar na short list daquilo que não pode esperar.

Obama tem sido de exemplar prudência desde sua eleição. Valendo-se do escudo de que os Estados Unidos só podem ter um presidente de cada vez, tem evitado se pronunciar sobre coisas complicadas. No dia 20 de janeiro termina o tempo para esse tipo de tática. Obama terá de começar a fazer escolhas que inevitavelmente desagradarão alguns segmentos que até agora o apóiam. Ele, que tem sido o grande articulador de alianças e o arquiteto de convergências, começará a ter o desafio de fazer difíceis e, quase sempre, imperfeitas opções.

Some-se a isso o ressentimento das forças conservadoras e o rancor residual dos grupos movidos por preconceitos raciais, ambos pelo momento derrotados ¿ mas não eliminados ¿ e temos um conjunto poderoso de forças de oposição.

Se é fácil imaginar qual será o menu inicial da nova administração, não é difícil prever alguns dos temas que não deverão compor a pauta inicial. Entre eles estará a América Latina, em seu conjunto, com a possível exceção de algumas questões migratórias e de tráfico de drogas dentro, sobretudo, do relacionamento com o México e com o Caribe.

O Brasil não deverá ver nisso sinal de sua relativa falta de importância para os Estados Unidos. É uma indicação, apenas, de que nossa agenda bilateral ¿ certamente importante para ambos ¿ não reclama tratamento imediato.

É desejável que Obama tenha com o presidente (ou presidentes) do Brasil que coincida com seu mandato a mesma relação fluida e fácil que tiveram Clinton e FHC, Lula e Bush. É importante para nós (e para eles) conservar a qualidade desse relacionamento pessoal. Também, no nível de ministros de Relações Exteriores, Hillary Clinton deverá continuar a manter o bom entendimento que tiveram Lampreia e Lafer com Madeleine Albright e Colin Powell, e Celso Amorim com Condolezza Rice.

Onde imagino que Obama e o Brasil encontrem o principal terreno de ação imediata é dentro do G-20, colegiado que procurará tirar o mundo da profunda crise econômica em que se encontra. Será, imagino, dentro dele, que Washington e Brasília irão buscar, no primeiro momento, identidades em seus planos de ação e criar afinidades de estilo.

Obama não conhece pessoalmente o Brasil. Não tenho memória de alguma visita sua ao nosso país. Não temos, com ele, um passado de contatos. É, assim, uma relação a ser inteiramente construída.

Hillary Clinton está familiarizada com nossos desafios e oportunidades. Para nós, seu papel será importante.

Como somos as duas maiores democracias presidencialistas do mundo, a qualidade da relação pessoal entre os primeiros mandatários importa sempre. Desta vez, o presidente dos Estados Unidos, moço, mestiço, vigoroso e otimista, tem muito que ver conosco e não será difícil estabelecermos com ele um relacionamento próximo e denso. O que será bom para os dois países.

Renovo minha torcida. Se Obama fracassar, vai levar muito tempo para pôr a casa em ordem. O que não será bom nem para os Estados Unidos, nem para nós. No mundo globalizado, o Brasil pesa cada vez mais e está cada vez mais entrelaçado com os temas de alcance mundial. Manter a qualidade da relação bilateral com Washington é o que há de mais importante a fazer.no curtíssimo prazo.