Título: Que venha um ano bom
Autor: Sarney, José
Fonte: Jornal do Brasil, 26/12/2008, Opinião, p. A9

ex-presidente da República

Ano velho, ano novo. De viver, vive-se com a invenção do tempo. Escrever sobre estas festas e estado de espírito é coisa difícil, a começar pela exigência dos gramáticos. Ano-Novo, com maiúscula e hífen, é o champanhe se abrindo, a festa da passagem. Já ano novo, tudo minúsculo, são todos os dias do novo ano. Por isso é correto dizer "bom Ano-Novo" e "feliz ano novo". De um jeito ou de outro, queremos um 2009 de progresso, tranqüilidade e paz, dando graças por ter vivido o ano de 2008. Paz para o doutor Guido Mantega, tranqüilidade para o Meirelles e o progresso fica mesmo para o presidente Lula.

Mas não é isso que as Cassandras andam berrando no mundo todo. Dizem que 2009 será o olho do furacão da crise. O problema eram as hipotecas e os subprime nos Estados Unidos, que depois nadaram para a Europa, galoparam para a Ásia e agora fazem marolas em nossas bandas.

Mas eu sou um inveterado otimista que jamais devo aplicar na Bolsa porque não acredito em queda, e ela sempre vem... Acho que 2009 não vai ser nada disso que estão alardeando, pois é um ano ímpar, e estes anos ímpares não costumam ser de catástrofes. Fiquei acreditando nisso quando a Dona Maria do Correio, a lendária vidente de Araxá, me disse quando eu era candidato a governador do Maranhão: "Se a eleição for num ano ímpar, você ganha, se for num ano par, perde". E quando Carlos Lacerda brigou com o Castelo e este resolveu fazer eleição direta em 1965, eu me animei todo e disse de mim para mim: "Agora é minha vez". E foi.

Não sou adepto da numerologia, minha simpatia pelos anos ímpares é pura superstição, assim como não gosto de marrom nem de bicho empalhado. Se for jacaré, Deus nos acuda.

Mas um ano não é nada, é uma gota d¿água, embora os físicos descobrissem agora, nesta alquimia do século 21, entre equações mágicas complicadas de interação entre campo magnético e gravidade, que o Universo pode ser enxergado numa gota d¿água, com buraco negro e tudo. É tudo igual, o pequeno e o imenso, coisa das leis do Criador, que Einstein dizia "não jogar dados".

O tempo, repito, é uma invenção do homem. Depois dos 70, então, ao ser contado, pesa que nem cabeça de bêbado. A todos os leitores que me acompanham nesta minha sexta-feira, espero que tenham tido um bom Natal e na próxima semana recebam o Ano-Novo com o carinho que se tem pelas crianças. Afinal ele também vai envelhecer e, como tudo, um dia será passado.

A mais perturbadora invenção do homem foi a contagem do tempo. Dizem que tudo começou no Big Bang, há 14 bilhões de anos, e nós, cheios de esperança, agora acrescentamos mais um ano a essa montanha de estrelas e energia.