Título: Confiança e bala na agulha para combater o desânimo
Autor: Aliski, Ayr
Fonte: Jornal do Brasil, 12/12/2008, Tema do Dia, p. A2

O ministro Guido Mantega chegou bem atrasado ao almoço reservado no ministério no qual anteciparia, a um pequeno grupo de jornalistas, as medidas de combate à crise. Acabara de sair do encontro com os empresários, mas não dissera o que faria. "Contei do milagre mas não falei de como o santo faria", explicou, ao lado do secretário executivo do ministério da Fazenda, Nelson Machado. Na primeira impressão, a percepção do clima de urgência na adoção das medidas. "Me desculpem, mas terei de comer e falar ao mesmo tempo", adiantou, batendo com o garfo na taça para pedir atenção e abrindo na mesa a lista e gráficos que embasam, segundo ele, a posição menos desconfortável do Brasil. Os comparativos de crescimento eram com China, Índia e Rússia, em curva descendente. Curva essa que só entraremos agora, e de forma mais suave.

Ao mesmo tempo em que exibia confiança nos resultados esperados, Mantega deixou claro que o governo tem um arsenal de novos instrumentos os quais poderá lançar mão, "toda semana se preciso for". "Temos bala na agulha", avisou, sem entrar em detalhes, mas associando a declaração a uma maior musculatura do Estado. A pressa, segundo ele, tem razão de ser, sobretudo nos efeitos da redução de IPI, prevista para valer até 31 de março. "É preciso baixar os estoques nas fábricas logo para evitar que as demissões aconteçam e criem um clima de desânimo", avaliou, completando, entre uma garfada e outra de frango grelhado com xuxu ao molho branco. "Se você quer comprar o carro dos seus sonhos tem de ir às lojas amanhã (hoje)". Pouco antes havia se reunido com representantes das quatro principais montadoras de veículos do país. "O acordo já foi selado", disse.

Mantega só preferiu mastigar a melancia de sobremesa em silêncio quando confrontado com a decisão do Copom, que manteve a taxa Selic em 13,75%. A sinalização contraditória evidente entre as duas decisões foi avaliada como uma vantagem por trazer credibilidade. "O presidente Lula decidiu que o BC seria independente e isso às vezes gera desconfortos. Posso atuar naquilo que é a minha atribuição", reagiu o ministro, cuja mira se volta para os custos financeiros elevados demais. Lembrado que os bancos oficiais estão entre os que mais caro cobram, respondeu: "vão baixar".

Reações na própria Fazenda e na Receita contra a perda de arrecadação com novas alíquotas do IR foram minimizadas na hora do café. Não houve resistência, mas apenas "ressalvas" diante da decisão ¿ "se o presidente quer e o ministro quer, está resolvido", comentou Machado. "O crescimento pode absorver a perda", encerrou Mantega.