O Estado de S. Paulo, n. 46449, 19/12/2020. Economia, p. B3

 

Após provocação, governo barra 13º do Bolsa Família

Camila Turtelli

Idiana Tomazelli

Lorenna Rodrigues

19/12/2020

 
 

Após o presidente Jair Bolsonaro jogar no colo do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a cobrança pela ausência de 13.º do Bolsa Família em 2020, o próprio governo precisou convocar uma tropa de choque para impedir o que a fala do chefe do Palácio do Planalto havia provocado: uma votação relâmpago para instituir o abono natalino e obrigar a equipe econômica a abrir o cofre.

Antes do horário marcado para a votação na Câmara, o ministro da Economia, Paulo Guedes, admitiu a jornalistas que o governo não encaminhou proposta de pagamento do 13.º aos beneficiários do programa em 2020 para não cometer um crime de responsabilidade. “sou obrigado, contra minha vontade, a recomendar que não pode ser dado o 13.º do Bolsa Família”, disse Guedes em coletiva virtual para apresentar um balanço de fim de ano. “É lamentável, mas precisa escolher entre um crime de responsabilidade (13.º) e a lei.”

No dia anterior, à noite, em transmissão na internet, Bolsonaro disse que o pagamento do abono não seria feito este ano porque Maia deixou o texto da medida provisória (MP) que garantiu o benefício em 2019 perder a validade.

Na de ontem, Maia tomou uma atitude incomum e foi à tribuna da Câmara para rebater a acusação. Ele repetiu o que havia dito ao Estadão na noite anterior, chamando Bolsonaro de mentiroso e culpando o governo por não expandir o programa assistencial marca dos governos PT. Segundo ele, a MP não foi votada porque o próprio governo não queria que o texto fosse aprovado.

“O episódio, mais um episódio ocorrido no dia de ontem (quinta-feira), quando infelizmente o presidente da República mentiu em relação a minha pessoa. Aliás, muita coincidência, a narrativa que ele usou ontem, com a narrativa que os ‘bolsominions’ usam há um ano comigo em relação às MPS que perdem validade nessa casa. É a mesma narrativa”, afirmou Maia.

Numa retaliação à acusação de Bolsonaro, Maia havia decidido pautar a Medida Provisória que prorrogou o auxílio emergencial a vulneráveis até o fim deste ano, incluindo nela o pagamento do 13.º do Bolsa Família em 2020. O presidente da Câmara só desistiu da estratégia após obter uma admissão pública do governo que eram eles os contrários ao pagamento adicional.

O governo pagou o 13.º para beneficiários do Bolsa Família pela primeira vez em 2019, após promessa de campanha de Bolsonaro. Parlamentares chegaram a discutir a ampliação da MP de 2019 para tornar permanente o 13.º para os beneficiários do programa e incluir o pagamento da parcela extra a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda que já recebem o Benefício de Prestação Continuada (BPC). As duas propostas de mudança foram incluídas no parecer do relator, senador Randolfe Rodrigues (Redeap), que foi aprovado na comissão mista em 3 de março deste ano.

O texto, no entanto, perdeu a validade em 24 de março sem que fosse votado nos plenários da Câmara e do Senado. O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), publicou uma mensagem nas redes sociais admitindo que a MP que previa o 13.º do Bolsa Família não foi votada porque não havia recursos para arcar com o abono natalino para o BPC, eximindo Maia da responsabilidade pelo insucesso da proposta.

Barros pediu ao presidente da Câmara que não votasse a MP do auxílio emergencial ontem, uma vez que os pagamentos para 2020 já estão garantidos (uma medida provisória tem vigência imediata). “Eu precisava fazer o meu discurso para resguardar a imagem desta Casa e da minha Presidência. Porque amanhã a narrativa vai deixar de ser do 13.º do Bolsa Família, e ele vai dizer que fomos nós que acabamos com o auxilio emergencial porque não votamos a MP”, afirmou Maia.