Título: ''Candidato do PT deve ter consenso''
Autor: Mariana Santos
Fonte: Jornal do Brasil, 13/02/2005, Brasília, p. D3

Entrevista / Wilmar Lacerda Ele comanda, na capital federal, o partido que mais cresce no País e que, em uma máxima demonstração da envergadura adquirida, elegeu o presidente da República no último pleito. Presidente do PT-DF há mais de três anos, Wilmar Lacerda garante que o partido que elegeu Luiz Inácio Lula da Silva não mudou suas convicções, menos ainda sua bandeira. Em entrevista ao JB, Lacerda afirmou que o comportamento mais ¿responsável¿ da legenda, que nasceu como oposição ao governo em plena ditadura, pode, agora no mais alto posto do Executivo nacional, ajudar a eleger o próximo governador do DF. A sucessão, para Lacerda, vai depender ainda de uma maior abertura petista local, como a construção de uma chapa dentro de uma lógica de alianças. Com 26 mil filiados, o PT-DF vai trabalhar a sucessão ao Buriti dentro do projeto de reeleição de Lula. Lacerda disse ainda que vai tentar se reeleger no próximo dia 18 de setembro. As eleições no diretório poderão se decisivas na escolha do nome do petista que deverá representar o partido nas eleições de 2006 ao GDF que deve ser definido ¿sob consenso, para evitar feridas¿, diz. E Lacerda já revelou quem apoiará: o ex-governador Cristovam Buarque, ainda que este resista a uma terceira candidatura ao governo local.

- O que está programado para Brasília para as comemorações dos 25 anos do PT?

- Ainda não definimos data ou horário. Mas em março haverá uma grande festa-show para militantes. Devem participar lideranças locais e nacionais do PT. Queremos levar o presidente Lula. Lançaremos uma revista, edição única, sobre os 25 anos do PT no DF. Selecionamos fatos que marcaram o partido.

- Nestes três anos como presidente, na sua avaliação, quais foram os momentos mais difíceis do partido?

- Acho que o PT passou por um processo de transformação. Tivemos que, nacionalmente, criar um campo majoritário. Definir estratégia de campanha, um programa de governo mais moderado, mais aceito pela sociedade, o que pressupunha alianças com partidos de centro-esquerda e esquerda como PL, PMDB, PDT, PPS, PCdoB, que possibilitassem a eleição do companheiro Lula. A gestão no Brasil marca um outro comportamento do PT. Não que o PT tenha trocado suas bandeiras, mas não podemos dar cavalo-de-pau.

- Muitos militantes criticam essa nova fase, considerando que o partido traiu suas convicções. Isso pode dificultar a sucessão ao Buriti?

- Quando não somos casados, pensamos em casar, muitos dizem que o casamento é uma maravilha, outros falam que jamais se casariam novamente. Ser governo é uma condição diferente. Não acho que o PT mudou seus princípios. O governo não é só do PT. O governo é de uma coligação de partidos. Se tivéssemos a capacidade de eleger um governo só do PT, talvez o governo pudesse ser um pouco mais de esquerda. Seria muito indelicado com outros partido não aceitar suas ponderações e colocações. Ninguém pode dizer que não estão sendo cumpridos os compromissos macro do Partido. Estamos dando a grande resposta para o povo brasileiro. O desempenho do governo Lula vai nos ajudar a eleger o novo governador do DF. Tratando Brasília, não discriminando o governador que está aqui, apesar de fazermos oposição a ele. O governo federal vai repassar este ano R$ 4,4 bi do Fundo Constitucional do DF, além dos convênios, autorização de empréstimos internacionais, para que o governador Roriz possa administrar.

- Mas o FCDF foi criado ainda na gestão Fernando Henrique Cardoso...

- Quando foi assinado, eram repassados R$ 2,7 bi. Estamos repassando R$ 4,4 bi. O presidente Lula não dá o mesmo tratamento a Roriz que Cristovam recebeu de Fernando Henrique. FHC impossibilitava os recursos de virem ao DF. O Arruda, que era líder do governo naquela ocasião, impossibilitou empréstimo do BID para estruturar a cidade. O BID acatava empréstimo de R$ 130 bilhões e o Arruda impediu que chegasse ao governador Cristovam. Assim que Cristovam perdeu as eleições, o empréstimo veio. Eles faziam discurso de não oposição, de institucionalidade mas na verdade trabalhavam contra a vinda de recursos para o governador. Nós fazemos o discurso e efetivamos na prática. O governo Lula está introduzindo o SAMU, mandando recursos para o programa Saúde na Família, Bolsa Família, todos estão sendo desenvolvidos sem penalidade ao DF. Isso vai mostrar o nosso discernimento de olhar o Brasil como País, não focando divergências regionais.

- Já existem pré-candidatos ao GDF trabalhando, ainda que não explicitamente O PT até agora não definiu nem quem será seu candidato. Vocês não estariam perdendo tempo com isso?

- Não. A cultura, o estatuto e a lógica do PT são diferentes dos outros partidos. Aqui não é a cúpula que define o candidato, mas o conjunto de filiados. Quando existe mais de um candidato majoritário, quem decide no voto são os filiados. E a lógica da eleição de 2006 é a lógica da reeleição do presidente Lula. Essa é a nossa principal estratégia. Teremos uma lógica de composição nacional que possa caminhar junto. Se não mudar a lei eleitoral, e mantiver a verticalização, dependendo do conjunto de partidos que participarem dessa aliança, não lançaremos candidatos em todos os estados. O PT não vai lançar 27 candidatos. Evidentemente no DF, o candidato do PT ajuda na estratégia de reeleição do Lula. Sempre ajudou. Temos a maior base social, juntamente com Roriz, que não vai disputar e que não consegue repassar todos os seus votos para nenhum desses candidatos. Portanto, temos um time pensando no conjunto dos partidos de esquerda do DF, numa chapa plural que envolva PCdoB, PSB, PDT, PP de Benedito Domingos, que queremos que continue conosco. Queremos fazer aliança mais ampla. O PT certamente terá candidato no DF, com visão nacional para o projeto de reeleição do presidente Lula.

- Quando o candidato deve sair?

- Estamos iniciando o processo de diálogo.

- Há pelo menos cinco pré-candidatos - Cristovam Buarque, Maninha, Arlete Sampaio, Sigmaringa Seixas e Geraldo Magela. Este último, inclusive, tem articulado bem para ser lançado como o nome do PT novamente. O senhor acredita que ainda há simpatia pelo nome de Magela entre os eleitores do PT após denúncias de envolvimento com o escândalo Waldomiro?

- Qualquer que seja o candidato do PT será acusado de algo. Lula foi acusado, em muitas ocasiões, de coisas que ele jamais fez. De ter sequestrado Abílio Diniz, de ter forçado aborto em sua ex-esposa... Mas estamos preparados para isso.

- Não há restrições dentro do partido com o Magela?

- Não, nada foi provado contra o ele no caso Waldomiro. Ele tem condições de ser candidato pelo desempenho que teve na última campanha. Evidentemente temos candidatos com potencial igual.

- As relações de Cristovam com a cúpula petista não ficaram abaladas após a saída dele do governo? Especulou-se, inclusive, que ele sairia do partido.

- Cristovam foi indicado agora pelo PT para ser o presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado. A relação de Cristovam com Lula é das mais cordiais. Eu mesmo fui à casa do senador Cristovam com Genuíno, tivemos uma longa conversa com ele. Não existe problema. O que existe é que Cristovam é indivíduo de idéias, e ele expressa essas idéias no PT, na bancada, no seu mandato. No PT, a pluralidade é normal. Crescemos com isso. Não vamos impedir o Cristovam de criar asas, pensar. Ele é um pensador. E por isso age dessa forma. Fazer críticas ao governo, nós todos fazemos. Ele acha que não é o controle da inflação, do crescimento, que vai incluir socialmente as pessoas. É uma política de estado, para educação, saúde, habitação, outras políticas. Vem criticando no governo Lula e está contribuindo para que o governo assuma posturas de políticas públicas que possam beneficiar população mais pobre. Não há a mínima possibilidade de o senador deixar o PT. Ele afirma isso. Há uma pressão enorme da base do PT e da população de fazê-lo candidato. Ele acha que não é o momento de voltar. Ele resiste à candidatura ao governo do DF.

- Quem você apóia?

- Entendo que a melhor candidatura do PT para vencer o rorizismo no DF é o senador Cristovam. É posição minha, não do PT. Entendo que outros candidatos também têm legitimidade. Não quero desmerecer ninguém.

- Como será feita a escolha, no partido, dos candidatos a senador, deputados federais e distritais e ao Buriti?

- Queremos buscar um consenso interno, não queremos ter prévia. Disputa é sempre muito ruim. Até você sanar os problemas que causam uma disputa interna, até sanar as feridas, leva um tempo. E esse tempo é de debate. As feridas de 2002 já foram sanadas, mas não queremos abrir as de 2006. Queremos diálogos internos, com os conjuntos de forças políticas, são 17 correntes em Brasília. Temos de atender o conjunto dessas forças políticas. Os candidatos ao Senado e a vice-governador teremos que discutir com os conjuntos de partidos que participarão desta aliança. O ideal é que PT defenda uma chapa plural, que tenhamos participação de outros partidos na chapa majoritária. E onde o PT fez isso, alianças, ganhou as eleições municipais. Onde o PT se restringe e não casa com ninguém, fica sozinho, acaba perdendo as eleições. Na chapa do Magela era a Kátia Puttin, do PT. No Cristovam, era com Sigmaringa. Na que ele venceu, Cristovam e Arlete. Temos de avançar nisso. O Lula é presidente e o vice é do PL. Temos que aprender essas coisas. Para escolher o candidato ao senado, os delegados decidem se tem que ser do PT ou da aliança. Se houver mais de um candidato a senador do PT, deve haver prévia. Cargo majoritário, também.

- Qual é a sua avaliação sobre a aliança PT e PFL na Câmara Legislativa, que resultou na Frente Democrática, ocasionando a derrota do PMDB na Mesa Diretora?

- Acho que em Brasília você tem que avaliar do ponto de vista das disputas locais. Temos um senador do PFL que é a aliado do nosso governo em âmbito federal, que tem votado com nosso governo. Quando não vota, sai do plenário para não votar contra. Aqui em Brasília, Paulo Octávio é candidato ao GDF, precisa se deslocar do guarda-chuva do Roriz. É candidato de qualquer jeito, independente se o Roriz vai lançar candidato ou não. Então ele tenta formar uma base política que dê sustentação para concorrer ao GDF. Isso possibilita que a bancada do PT se alie a essa estratégia num combate a Roriz. Essa estratégia possibilitou que o PT construísse maioria dentro junto com o PFL e elegesse o presidente da Câmara, independentemente do candidato do Roriz, que sofreu uma derrota. E pode, do mesmo jeito, sofrer uma derrota nas eleições do DF.

- Em que medida essa derrota do governador na Câmara pode influenciar no processo de sucessão?

- A Câmara tem força determinante do horizonte da oposição no DF. Eu me lembro quando Cristovam era governador, o papel que Luiz Estêvão teve na Câmara lhe deu a possibilidade de ser eleito senador e de Roriz vencer Cristovam nas eleições seguintes.

- A aliança contou inclusive com o governo federal. Interessa que ela continue?

- Se o Paulo e o PFL quiserem apoiar o candidato do PT no DF, ótimo. Ela só interessa nesse sentido. Em outro, não existe a mínima possibilidade. Ele tem uma boa relação com o ministro José Dirceu, se articula nacionalmente com o governo federal, dá sustentação ao governo Lula, o que é bom para a gente governar o País, ter maioria no Senado e na Câmara. Se for possível ter o apoio dele no DF, ótimo.