Título: Clima de pessimismo marca Davos
Autor: Totinick, Ludmilla; Girão, Luisa
Fonte: Jornal do Brasil, 02/02/2009, Economia, p. A18

Retomada do protecionismo dominou debates, mas negociação para ressuscitar Doha fracassa

Ludmilla Totinick e Luisa Girão

O Fórum Econômico Mundial terminou ontem, em Davos na Suíça, afundado num forte pessimismo, com os líderes empresariais e de governos pedindo, por meio de um documento, uma ação rápida e coordenada dos países para enfrentar a mais séria recessão global desde 1930. Os participantes do encontro temem os efeitos sociais da crise, principalmente uma instabilidade política maior nos países, ressurgimento do protecionismo comercial e um revés nas iniciativas em favor da globalização. Os pedidos de maior ação do estado na economia vieram acompanhados de ressalvas sobre medidas protecionistas.

Os Estados Unidos mais uma vez foram o alvo, após o anúncio de que, no pacote de US$ 819 bilhões aprovado pelos deputados americanos na semana passada há uma cláusula que autoriza investimentos somente com uso de matéria-prima americana. O primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, alertou que políticas protecionistas podem ser adotadas pelos países como resposta à crise financeira internacional. Disse que há o risco de um mercantilismo financeiro, com bancos estrangeiros retraindo o capital para o seu país natal durante a turbulência. ­ Se não fizermos nada, vai levar a uma nova forma de protecionismo, uma retração na globalização e a redução no comércio entre os países que será seguido rapidamente por uma velha forma de protecionismo comercial do passado ­ acredita. Já a chanceler alemã, Angela Merkel, disse que não deve deixar que estas forças sejam distorcidas. ­

Por exemplo, eu estou muito atenta aos subsídios injetados na indústria automobilística americana. Isso pode levar a distorções e protecionismo ­ disse. O diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), Pascal Lamy, voltou a afirmar que o livre comércio voltou a se tornar vítima da crise. ­ O comércio deve ser parte da solução da crise, por seu efeito multiplicador de renda e de empregos e, por isso, é urgente retomar e concluir as negociações globais da Rodada Doha ­ ressaltou. O Brasil foi uma das principais vozes em Davos-2009 contra o protecionismo. O ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, defendeu a retomada das negociações da Rodada Doha de liberalização de comércio internacional.

Acordo pelo livre comércio

Em Davos, os ministros do co- mércio fracassaram mais uma vez em resgatar as negociações da Rodada de Doha. A reunião do G20, marcada para 2 de abril, em Londres, passa a ser a próxima opção para um avanço real. O ministro do Comércio e Indústria do Egito, Rachid Mohamed Rachid, propôs encontro ministerial antes da próxima reunião do G20. A idéia foi apoiada por vários participantes, mas nenhuma decisão foi tomada por enquanto.

Representantes de 44 países, incluídos os 27 da União Europeia (UE), produziram uma declaração com três pontos principais: dar máxima prioridade à conclusão da Rodada Doha, tomando como base os pontos acordados até 2008; renunciar à criação de novas barreiras ao comércio de bens e serviços, à imposição de restrições à exportação ou à adoção de medidas de estímulo contrárias às normas da OMC; apoiar esforços para monitorar novas medidas capazes de afetar o comércio. ­

Os mesmos políticos que falam a favor do livre comércio recebem nos gabinetes lobistas que pedem medidas protecionistas ­ afirmou a ministra do Comércio da Suíça, Doris Leuthard. Mas Klaus Schwab, presidente executivo do Fórum, alertou os participantes a não esperar muito da reunião do G20. Segundo ele, os líderes deverão focar suas atenções em respostas técnicas imediatas para a crise econômica e financeira.

Ações

A situação financeira desfavo- rável e as medidas protecionistas já tomadas por várias potências mundiais causaram uma atmosfera sombria nas conversas em Davos. ­ A única coisa que está brilhando é o sol ­ afirmou o ministro do Comércio da Índia, Kamal Nath. Para o prêmio Nobel de economia, Joseph Stiglitz, Davos este ano foi mais sombrio porque os participantes resolveram dividir os problemas. ­ No balanço final, uma coisa é evidente: a crise ocupou os espíritos e os debates. E a elite econômica governamental e empresarial do planeta volta para casa sem conseguir encontrar soluções ­ concluiu. (com agências)