Título: Sem-terra dão ultimato a Lula
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Fonte: Jornal do Brasil, 08/02/2005, País, p. A3
Movimento ameaça abandonar o presidente, na campanha à reeleição, se reforma agrária não deslanchar este ano
BRASÍLIA - O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) deu um ultimato ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Este ano será a última chance que o petista terá para ''mostrar serviço'' na reforma agrária. Caso decepcione novamente o movimento, como ocorreu nos últimos dois anos, quando não cumpriu as metas de assentamentos, o governo federal perderá, pela primeira vez, o apoio entusiasmado dos sem-terra em uma campanha presidencial - a provável disputa pela reeleição no ano que vem.
- Este ano é a última oportunidade para o governo Lula mostrar que está realmente comprometido com a reforma agrária. Se isso não acontecer, chegaremos a 2006 com a conclusão de que a chance que ele recebeu em 2002 foi perdida - afirma João Paulo Rodrigues, um dos principais líderes nacionais do movimento.
A discussão no MST sobre como se comportar em 2006 ainda é cautelosa. O movimento não quer romper prematuramente com Lula, em quem depositou o voto dos militantes em suas quatro campanhas presidenciais. Mas a decepção com os rumos do governo é evidente. João Paulo Rodrigues chega a dizer que é preciso haver uma campanha urgente de ''resgate da reforma agrária''.
O MST identifica uma mobilização ideológica para desacreditar a bandeira, inclusive no governo.
- A reforma agrária está sob ameaça. Há uma campanha para difamar a eficiência e a relevância social desse instrumento - diz o dirigente.
Tal campanha seria capitaneada pelos interesses do agronegócio e, dentro do governo, teria como representantes os ministros Antonio Palocci Filho (Fazenda), Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento) e, principalmente, Roberto Rodrigues (Agricultura).
Em 2004, o governo federal assentou 81.254 famílias de sem-terra, abaixo da meta de 115 mil, que, na avaliação do MST, já era modesta.
Em 2003, foram 36 mil famílias, também abaixo da meta, que era de 60 mil. Por isso o MST menciona 2005 como ''a última chance de Lula''. O objetivo, novamente, é assentar 115 mil famílias.
Se os sem-terra se sentirem, de novo, frustrados, o apoio à reeleição de Lula, na avaliação de Rodrigues, vai ficar virtualmente impossível. O MST é dividido entre uma facção mais radical, concentrada nos acampamentos, e a direção nacional, mais propensa ao diálogo.
Apesar de tudo, o presidente ainda é considerado um aliado pelo movimento. Rodrigues diz que seria precipitado ir para o confronto absoluto com Lula.
- Temos um aliado no Palácio do Planalto, só estamos esperando que cumpra o que prometeu. Nos oito anos de Fernando Henrique Cardoso, tínhamos um inimigo como presidente. Sempre lembro isso a alguns companheiros mais sectários - comenta.
Em caso de nova decepção, em 2005 parte considerável do movimento deve desembarcar publicamente da candidatura à reeleição de Lula e procurar outra opção entre partidos de esquerda.
A senadora alagoana Heloísa Helena (ex-PT, hoje no P-S0L) seria uma alternativa natural. Por seus laços históricos com o PT, no entanto, dificilmente o movimento apoiará oficialmente um candidato de oposição a Lula.
No início do ano, João Pedro Stédile, também coordenador nacional do MST, prometeu ''grandes mobilizações'' que forçassem o governo a mudar a política econômica. Há um mês no Pontal do Paranapanema, em São Paulo, Stédile afirmou que o governo Lula estava ''em dívida'' com o movimento.