Correio Braziliense, n. 21.137, 08/04/2021. Cidades, p. 15

 

Pandemia em abril pode ser ainda pior

Ana Isabel Mansur

Pedro Marra

Samara Schwingel

08/04/2021

 

 

PROJEÇÃO » Março teve 1.191 mortes pela covid-19, e as de pessoas com até 39 anos superaram em 69% o total do ano passado. Especialistas avaliam que cenário tem chance de se agravar neste mês. Fatores como flexibilização das restrições pode impactar resultado

Do início do ano até a última terça-feira, as mortes por covid-19 de pessoas com até 39 anos superaram em 69% o total verificado em 2020 para essa faixa etária, no Distrito Federal. O mês passado é considerado o pior da crise sanitária no país e no DF até o momento, principalmente devido à alta de casos e óbitos. Pesquisador do Centro Universitário Iesb e pós-doutor pela Universidade de Brasília (UnB), Breno Adaid calcula que, na pior das hipóteses, abril terá 1.680 vítimas da doença. Ontem, a Secretaria de Saúde (SES-DF) registrou mais 83 vítimas, incluindo um bebê com menos de 2 anos (leia abaixo).

O DF teve, em 2020, 161 mortes de pessoas com até 39 anos. Em pouco mais de três meses, esse número subiu para 273 — alta de 69,5%. Só em março, o DF teve 1.191 vítimas no total. O professor Breno Adaid fala em três cenários possíveis para abril: "A previsão é que fiquemos em torno dos 1 mil óbitos no fim do mês. No melhor cenário, 725 e, no pior, 1.680", projeta. Em relação ao número de casos, Breno afirma que, no cenário mais grave, abril pode ter 1.313 novos registros por dia e, no mais otimista, essa projeção cai para 873. "Todas as opções são possíveis. Mas devemos ter um aumento a partir da metade do mês, em virtude da reabertura do comércio", alerta.

Breno explica que os efeitos da queda na transmissibilidade (Rt) do vírus só devem ser percebidos em maio. "O número de casos e de mortes deve melhorar e ter uma queda realmente expressiva", calcula o professor. Para chegar a esses dados, ele avaliou, principalmente a média móvel de casos,e de mortes , além do indicador da disseminação do vírus — que ficou em 0,86 ontem. Esse resultado revela que cada grupo de 100 pessoas infecta, em média, outros 86 indivíduos.

Duas pessoas infectadas recentemente foram a mãe e o pai de Mário Leite Nunes, 45 anos. No entanto, o casal não resistiu ao quadro e acabou morrendo, em março. "Ela (a mãe) falava para eu me cuidar, para não chegar perto dela, porque tinha medo de eu contrair a doença", conta o gari. A autônoma Marlucia Leite Nunes, 44, irmã de Mário acrescenta que o pai também se preocupava com as medidas de segurança sanitária contra o novo coronavírus. "Meu pai era muito prevenido, pedia para termos cuidado com as coisas e com as pessoas, não só neste momento de pandemia. Ele sempre falou para nós sobre o amor ao próximo. É a coisa que ele mais cultivou, e isso ficou de ensinamento", lamenta Marlucia.

Saídas

Em nota técnica divulgada em 31 de março, um grupo de oito pesquisadores de universidades brasileiras e de Portugal calculou que a taxa de transmissão da doença no Distrito Federal estava maior do que a indicada pelo Executivo local. O grupo analisa o indicador por meio de dois modelos: a partir dos casos confirmados — que deixava a taxa em 0,97, contra 0,91 verificado, à época — e por meio do número de mortes (1,36). O grupo destacou, no documento, que a diferença entre os resultados ocorre por causa da subnotificação de casos e da baixa testagem.

Para a pesquisadora e professora Kelly Magalhães, a situação do DF é um somatório de fatores. Pós-doutora pela Universidade de Harvard e coordenadora do Laboratório de Imunologia e Inflamação (Limi) da UnB, ela explica que o cenário se atribui à sobrecarga do sistema de saúde, dos leitos em unidades de terapia intensiva (UTIs), da lotação do sistema funerário, da baixa vacinação e da falta de restrições eficientes. "O que podemos fazer para tentar que abril não seja pior que março é promover vacinação em massa para toda a população e estimular medidas protetivas, como uso máscaras, distanciamento social e lockdown acompanhado do auxílio financeiro", recomenda.

0,86
Taxa de transmissão (Rt) do novo coronavírus no DF, ontem