O Globo, n. 32020, 07/04/2021, Economia, p. 18

 

STF vai julgar ação que pode reduzir prazo de patentes

Ivan Martínez-Vargas

07/04/2021

 

 

Está na pauta do Supremo Tribunal Federal (STF) desta semana um julgamento que deve ter impacto no setor farmacêutico, no agronegócio e nas indústrias de telecomunicações e eletroeletrônica. A Corte vai decidir se derruba um trecho da lei de patentes que, na prática, prorroga o prazo de vigência da proteção de invenções no país, em média, por três anos e meio. De um lado, a decisão tem impacto no acesso da população a medicamentos a preço mais baixo, os genéricos. E de outro, aborda a questão do incentivo e remuneração a invenções no país.

O que os ministros do Supremo vão julgar é se o prazo de patentes no país pode ser prorrogado automaticamente caso a burocracia de aprovação leve mais tempo. Pela lei atual, patentes de invenções têm duração de 20 anos, contados a partir da data em que o pedido de proteção é registrado no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). O artigo que está em discussão no Supremo prevê que a vigência da patente, ou seja, o prazo a partir da concessão do INPI, não pode ser inferiora dez anos.

Apesar dos avanços, a burocracia do INPI para aprovara patente pode demorar mais de uma década. O período de proteção das invenções acaba então sendo prorrogado para garantira regra que prevê ao menos dez anosa partir do fim da tramitação no INPI.

Em 2016, a Procuradoria Geralda República( PGR) entrou coma ação no Supremo, sob o argumento de que o parágrafo da lei que prorroga a vigência de patentes para compensara demora do INPI é inconstitucional.

ECONOMIA DE R$ 3 BI AO SUS

Hoje, 46,6% das patentes vigentes no país estão amparadas no dispositivo que prorroga o prazo de concessão, segundo dados do INPI compilados pelo escritório de advocacia Licks, que atua no processo representando entidades contrárias à tese da PGR.

A favor da tese, estão grandes laboratórios farmacêuticos nacionais, que são produtores de medicamentos genéricos, além de ex-ministros da Saúde. Contrários à mudança estão farmacêuticas e empresas de insumos agroindustriais multinacionais e entidades como a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee).

O principal argumento de quem defende amu dançaéo barateamento de custos pagos pelo SUS por medicamentos que tiveram patente prorrogadacomba seno dispositivo. No domingo, um grupo formado por ex-ministros da Saúde e pesquisadores divulgou manifesto que defende a mudança na lei. Assinaram o documento oito ex-titulares da pasta da Saúde: José Serra, José Gomes Temporão, Arthur Chioro, José Saraiva Felipe, Humberto Costa, Alexandre Padilha, Argenor Alvares e Barjas Negri.

“A mudança na lei de patentes pode trazer uma receita adicional de R$ 3 bilhões para o sistema de saúde pública, que podem ser usados beneficiando seja para tratar da Covid-19 ou de qualquer outra doença”, diz o documento.

O manifesto cita estudo da UFRJ publicado ano passado que analisa o efeito da extensãode pat entesem nove medicamentos comprados pelo SUS. O gasto coma compra dos remédios foi de R $10,6 bilhões entre 2014 e 2018, e a economia potencial projetada caso a extensão não existisse seria de R$ 3,9 bilhões. Segundo o estudo, o tempo médio de prorrogação de patentes é de três ano semeio.

Para o Grupo Farma Brasil, que reúne laboratórios que produzem genéricos no país, o fim do dispositivo alinharia o Brasil à prática internacional.

— O dispositivo tenta resolver o problema de um órgão administrativo, o INPI, onerando a sociedade. Na prática, aleijá determina que, enquanto a patente está sendo analisada, o inventor tem direito de obter indenização se houver exploração indevida da invenção — diz Reginaldo Arcuri, presidente da entidade.

‘COPIAR FICARIA MUITO FÁCIL’

Arcuri defende que a norma seja derrubada de maneira retroativa, o que não é consenso sequer entre farmacêuticas nacionais. A Eurofarma apoia o fim da extensão de patentes, mas com efeito futuro.

— Somos contra a retroatividade por causa da estabilidade jurídica — diz Martha Penna, presidente de Inovação da Eurofarma.

Para Gustavo Svensson, diretor jurídico do Grupo NC, que controla o laboratório EMS, a retirada do dispositivo traria maior previsibilidade para que as farmacêuticas nacionais planejassem o lançamento de medicamentos similares, mais baratos:

— Desenvolver uma droga genérica pode levar cinco anosa depender da complexidade da molécula. Hoje, o prazo das patentes não é fixo, depende do tempo que o INPI leva na análise do pedido.

O advogado Otto Licks, que atua no processo contra atese da PGR, aval iaque muda ralei teria grande impacto em setores como telecomunicações e agronegócio, e penalizaria indústrias que investem em pesquisa e desenvolvimento:

— Se essa decisão for tomada, será uma anulação de patentes ao atacado, eliminaria praticamente todas as patentes concedidas nos governos de Dilma Rousseff. Aindús tria que vende genéricos para o governo quer vender mais, mas isso prejudica outros setores. Apenas 1,44% das patentes cobrem fármacos.

Cerca de 90% das patentes de invenção do segmento de telecomunicações vigentes hoje teriam o fim decretado, segundo dados do INPI compilados por Licks. Nos segmentos de fármacos e biofármacos, o índice é de 73%. No de eletrônica, 71%.

O advogado afirma que o tempo médio de análise das patentes tem diminuído. No ano passado, 68% das patentes foram concedidas sem o mecanismo da extensão. Neste ano, o índice chega a 75,7%.

A indústria de eletroeletrônico sé contra a mudança. Segundo Humberto Barbato, presidente da Abinee, alei traz tranquilidade ao inventor:

— Toda a inteligência embarcada nos eletrônicos, como os chips, são patenteados, há patentes em tablets,comp utadores, celulares, TVs.Senã oti vera proteção, copia relançar no mercado ficaria muito fácil.