O Globo, n. 32023, 10/04/2021, País, p. 5

 

Líder do governo no Senado atua para barrar investigação

Julia Lindner e Paulo Cappelli

10/04/2021

 

 

O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), afirmou que vai trabalhar para retirar assinaturas do requerimento de criação da CPI da Pandemia. Segundo ele, muitos senadores repensaram a posição porque a decisão do ministro do STF Luís Roberto Barroso determinando a instalação imediata “repercutiu de forma muito negativa” na Casa.

Como o requerimento reúne 32 assinaturas — há necessidade de, no mínimo, 27 —, a operação do governo precisaria convencer seis parlamentares a mudar de lado.

— Vamos iniciar diálogo com diversos senadores. Muitos que subscreveram (a CPI) têm manifestado a sua contrariedade com a decisão — disse Bezerra ontem, em entrevista ao GLOBO. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEMMG), garantiu que vai ler, na terça-feira, o requerimento em plenário, rito necessário para a instalação. O prazo para a retirada dos nomes é até a data da leitura. Para Bezerra, a decisão de Barroso representa uma “intervenção” nas prerrogativas do Senado e foi um erro por ter sido tomada no auge da pandemia de Covid-19, no momento em que a Casa funciona de forma remota. Ele considera que a leitura de que houve uma “ação política” por parte do STF a um ano da eleição presidencial torna a situação mais delicada.

— Não ajuda na harmonia das relações dos Poderes. Precisamos trabalhar no sentido de evitar novos confrontos. Essa decisão vai merecer uma reflexão dos membros do Senado, como espero que possa receber uma avaliação mais serena por parte dos membros do STF, no sentido de evitar uma relação conflituosa —declarou.

“FORA DO RADAR”

O senador do MDB disse ainda que, após a formação do comitê para tratar do coronavírus, no mês passado, a possibilidade uma CPI já estava “fora do radar” do governo. Embora concorde com Bezerra na crítica à decisão do STF, o senador Plínio Valério (PSDB-AM) garante que manterá a sua assinatura no requerimento: — Embora discorde em gênero, número e grau da decisão do Barroso, por entender uma decisão invasiva, uma intromissão de um Poder no outro, por não reconhecer no Supremo competência para isso, não cogito retirar a minha assinatura. Autor do requerimento de criação da CPI, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) afirmou que o funcionamento é “perfeitamente possível”, porque as sessões em plenário já ocorrem de forma semipresencial — há senadores reclamando nos bastidores em função de os trabalhos da comissão exigirem presença na Casa, em um momento em que a disseminação do vírus está em alta. Uma tradição no Senado é  que o primeiro signatário do requerimento seja presidente ou relator da comissão. Randolfe disse ao GLOBO que vai pleitear sua indicação para um dos cargos, mas como seu partido tem apenas mais um senador, há resistência na Casa.

SEM “VEXAME”

Um dos responsáveis da ação no Supremo, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) afirma que a retirada de assinaturas neste momento, após dois meses da apresentação do documento, “será um vexame”. Apesar de Pacheco (DEM-MG) dizer que está disposto a cumprir a decisão de Barroso, a instalação

da CPI não deve ser imediata. Após a leitura do requerimento em plenário, na próxima semana, os líderes ainda vão ter que se reunir para definir a composição do colegiado. A partir daí, começará o processo para a indicação pelos partidos dos integrantes da CPI. De acordo com senadores ouvidos pelo GLOBO, o intuito de Pacheco é fazer um gesto de que está seguindo a decisão de Barroso, mas sem se comprometer totalmente. O trâmite dará mais tempo à cúpula do Senado até que haja uma decisão do pleno do STF. A análise do caso no plenário virtual está prevista para terminar no dia 26.