Título: Democracia por imposição
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 04/03/2005, Internacional, p. A7

Projeto de senadores democratas e republicanos obriga os EUA a promover a liberdade em países ditatoriais

WASHINGTON - Congressistas democratas e republicanos se uniram para transformar a Declaração da Independência dos EUA em manual de política externa a ser aplicado, principalmente, em países sob regime ditatorial. A idéia é pôr em forma de lei a visão americana do conceito da democracia e dos direitos humanos como elementos fundamentais da ação no exterior.

Por trás da medida estão senadores como o republicano John McCain e o democrata Joe Lieberman. McCain foi cotado para vice de John Kerry, nas últimas eleições. Joe Liberman disputou com Kerry nas primárias.

- A idéia é apoiar as transformações iniciadas com a queda do Muro de Berlim e que seguem hoje no Oriente Médio - afirmou Lieberman, em alusão ao Iraque. Segundo o senador, a lei dá aos EUA um ''objetivo nacional'', como definido na Declaração da Independência.

- Haverá recursos para que nossas embaixadas sejam 'ilhas da liberdade' - disse Lieberman.

O Ato da Democracia de 2005 ganhou a sigla ADVANCE - ''avançar valores democráticos, endereçar países não-democráticos e crescer''. Entre os ''endereçados'' está a Coréia do Norte.

O Ato cria o ''departamento de Movimento e Transição para a Democracia''. Obriga o governo a emitir relatório anual sobre democracia no mundo, além de pedir a designação de pelo menos um diplomata encarregado de direitos humanos em legações instaladas em nações não-democráticas. A ele caberá, com o embaixador, ''agir ativamente junto aos locais para propagar as idéias democráticas''. Também garante à Casa Branca autoridade para assumir medidas punitivas contra tais Estados, incluindo o confisco das propriedades destes em território americano. O projeto reserva US$ 700 milhões para serem usados ''no apoio a indivíduos ou grupos civis pró-democracia no mundo''.

- A promoção da liberdade é inseparável da segurança nacional americana - afirmou McCain, citando as revoluções ''laranja'' da Ucrânia e ''do cedro'', no Líbano.

Para Lieberman, ''no debate entre idealistas e realistas, o Ato leva a política externa para o idealismo''. Porém, saber quando esta é ''idealista'' ou ''realista'' é quase impossível. Muitas vezes, aspirações realistas embutem discursos idealistas. Em outras, o idealismo acaba absorvido por interesses mais concretos como econômicos ou de segurança.

Mas é notória a especificidade americana quanto a uma suposta missão - dada ao povo por Deus - de levar a democracia aos povos, o que se torna uma política de segurança quando o credo diz que povos democráticos não guerreiam. ''Temos essas verdades como auto-evidentes'', escreveu Jefferson, na Declaração, ''que todos os Homens foram criados iguais e possuem direitos inalienáveis à vida, à liberdade e à busca pela felicidade''.