O Globo, n. 32027, 14/04/2021, País, p. 4

 

Planalto em desvantagem

Julia Lindner

14/04/2021

 

 

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEMMG), oficializou ontem a abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar ações e possíveis omissões do governo federal na pandemia e aceitou a ampliação do escopo para que sejam investigados também os repasses de verbas da União a estados e municípios. A composição da comissão, porém, mostra que os aliados do Palácio do Planalto serão minoria no colegiado. Dos 11 titulares, ao menos sete são de oposição ou independentes.

A criação da CPI é o cumprimento de uma decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso, que determinou a Pacheco fazer a leitura do requerimento apresentado em fevereiro pelo senador Randolfe Rodrigues (RedeAP). O governo, então, trabalhou para ampliar o foco por meio de um outro pedido de CPI, protocolado pelo senador Eduardo Girão (Podemos-CE), que tem como foco estados e municípios. Pacheco decidiu por unificar a investigação, mas ressalvando que só podem ser analisados em relação aos entes federados o que for pertinente a repasses de verba federal.

— A comissão terá como objeto o constante do requerimento do senador Randolfe Rodrigues, acrescido do objeto do requerimento do Senador Eduardo Girão, limitado apenas quanto à fiscalização dos recursos da União repassados aos demais entes federados para as ações de prevenção e combate à pandemia da Covid-19, e excluindo as matérias de competência constitucional atribuídas aos estados, Distrito Federal e municípios — destacou Pacheco.

PERFIS DOS INTEGRANTES

A partir de agora, os líderes partidários devem fazer as indicações para a comissão. As informações divulgadas pelas legendas sinalizam que os aliados do Planalto devem ficar em minoria. Dos senadores que devem ser indicados, três têm perfil oposicionista e outros quatro são tidos como independentes.

Entre os cotados, o MDB, que possui a maior bancada da Casa, busca protagonismo ao tentar conquistar a presidência ou relatoria. Os emedebistas devem indicar nomes independentes: o líder da bancada, Eduardo Braga (AM), que é de um dos estados mais afetados pela crise, e Renan Calheiros (AL), crítico ao governo.

O PSD, que possui a segunda maior bancada do Senado, deve indicar o oposicionista Otto Alencar (BA) para uma das vagas titulares, assim como Omar Aziz, que é do

Amazonas e fez críticas ao governo federal pela atuação no estado. No PSDB, o escolhido deve ser o senador Tasso Jereissati (CE), outro crítico do governo Bolsonaro.

Da oposição, o autor do requerimento de criação da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), deve ser um dos titulares. No PT, Humberto Costa (PE) será indicado.

Entre os aliados do Planalto, o presidente do PP, Ciro Nogueira (PI), deve assumir vaga de titular e tomar frente na defesa do governo na CPI. Além dele, o líder do DEM, Marcos Rogério (RO), próximo de Pacheco, também é um dos nomes alinhados ao governo que devem participar. O Podemos pretende indicar Eduardo Girão (CE), que apresentou o requerimento com a ampliação de foco desejada pelo Planalto.

O regimento do Senado não prevê um prazo máximo para as indicações, mas existem precedentes para que o presidente da Casa faça as nomeações caso os partidos protelem. Segundo pessoas próximas a Pacheco, ele deve esperar por um período de até dez dias.

A partir daí, deve ser marcada a reunião para instalação e eleição do presidente da comissão, a quem caberá escolher o relator da investigação. O presidente do Senado pretende deixar nas mãos da CPI decidir como será o funcionamento, se haverá opção por aguardar a retomada presencial dos trabalhos ou se optará por algum tipo de funcionamento semipresencial ou totalmente remoto.

A ampliação do escopo das investigações foi defendida durante a sessão por Girão, que destacou que seu requerimento teve o apoio de 45 dos 81 senadores, com nomes não apenas da base do governo.

— Por ser mais ampla, se mostra mais independente e justa. O objetivo e municípios, o que será alvo de investigação é a aplicação de recursos federais desviados acasos específicos—defendeu Girão.

Embora defenda que é preciso observara “conveniência” da instalação da CPI neste momento, o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), defendeu que a proposta apresentada por Girão fosse apensada à original.

— Em tempos de pandemia como a que vivemos não convém a constituição de duas Comissões Parlamentares de Inquérito, mas é fundamental que a comissão a ser instalada, por decisão do Supremo Tribunal Federal, possa investigar os atos praticados por agentes políticos e administrativos não apenas da União, mas também dos estados, do Distrito Federal e dos municípios —defendeu.

Antes da leitura do requerimento para a criação da CPI, o líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO), apresentou uma questão de ordem em plenário para que nenhuma Comissão Parlamentar de Inquérito possa funcionar até que os integrantes da Casa estejam imunizados contra a Covid-19.

O senador Omar Aziz (PSD-AM) criticou parlamentares que querem aguardar a instalação da CPI em momento considerado mais adequado:

— Os senadores que não querem que instale a CPI agora, que querem que o senhor aguarde momento adequado, e aí no momento adequado teremos 500 mil mortes, 600 mil mortes no Brasil, porque o que estou vendo é que estão querendo protelar. Que esses senadores entrem no Supremo pedindo a suspensão. E aqueles que assinaram, que concordam com a CPI, vão participar.

O governador do Maranhão, Flávio Dino (PC do B), criticou a ampliação do escopo da CPI:

— Colocar tudo numa CPI só é para não andar nada. O certo é fazer uma CPI sobre o governo federal, que é o vetor principal da crise com as ações e omissões do Bolsonaro. Se coloca tudo no mesmo balaio, no mesmo cesto, parece aquela tática de batedor de carteira que fica gritando pega ladrão para poder fugir. Tem que separar.

“A comissão terá como objeto o constante do requerimento do senador Randolfe Rodrigues, acrescido do objeto do requerimento do Senador Eduardo Girão, limitado apenas quanto à fiscalização dos recursos da União repassados aos demais entes federados” 

Rodrigo Pacheco (DEM-MG), presidente do Senado