O Globo, n. 32028, 15/04/2021, Economia, p. 21

 

Déficit maior

Manoel Ventura

15/04/2021

 

 

O Ministério da Economia avalia propor ao Congresso uma alteração na meta de resultado das contas públicas deste ano para editar as medidas de combate à Covid-19, além de aumentar os gastos com o Ministério da Saúde. A mudança na meta fiscal pode ser uma alternativa à proposta de emenda à Constituição (PEC) para ampliar as despesas com a pandemia, que perdeu força no governo, embora ainda seja defendida por técnicos que veem no projeto uma forma de garantir mais segurança jurídica aos gastos extras contra a crise.

Entre as medidas que precisam ser lançadas com urgência estão a nova rodada do programa de manutenção do emprego, nos moldes da medida provisória (MP) 936, e empréstimos para pequenas empresas por meio do Pronampe.

A ideia da equipe econômica é financiar esses programas por meio de crédito extraordinário, que fica fora do teto de gastos — regra que limita o crescimento das despesas da União. Por outro lado, é preciso cumprir a meta de resultado das contas públicas. Neste ano, o governo está autorizado a um rombo de até R$ 247 bilhões.

RISCO DE DEMISSÕES

O valor não é suficiente para acomodar os gastos necessários para fazer frente às despesas com a pandemia. Por isso, voltou à mesa da Economia a possibilidade de propor uma mudança na meta fiscal. O rombo seria ampliado para garantir a edição das medidas. O novo número alvo ainda está sendo calculada pelos técnicos.

A nova edição da MP 936 e o Pronampe são considerados os programas mais urgentes. O governo avalia que, se essas medidas não forem editadas rapidamente, as empresas podem começar a demitir. Além de verba para os dois programas, será preciso gastar mais com saúde.

Ontem, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), defendeu que o Ministério da Economia priorize a renovação do programa que autoriza acordos de redução de salário e jornada e suspensão de contratos e disse que a medida precisa ser tratada “com muito zelo”. O assunto foi discutido na reunião do comitê executivo de enfrentamento à pandemia.

— Tratamos de assuntos relativos ao Ministério da Economia, de temas importantes para o enfrentamento da pandemia, que é a salvação dos empregos no Brasil. Um novo programa de manutenção de empregos, a exemplo do que aconteceu em 2020, garantindo a suspensão do contrato de trabalho e a contribuição do governo para a manutenção desses empregos — contou Pacheco, após o encontro.

Mais tarde, durante sessão do Senado, o parlamentar, que também é presidente do Congresso, anunciou que será votado na semana que vem outro projeto que viabiliza a renovação das medidas emergenciais: um texto que dispensa o governo de apresentar medidas de compensação para criar despesas, desde que não sejam gastos obrigatórios permanentes.

O plano para mudar a meta começa a ser avaliado dias após circular internamente no governo uma PEC elaborada pela equipe econômica para flexibilizar regras fiscais e viabilizar programas emergenciais. Em uma versão, o texto previa até brechas para gastos com obras fora dos limites de gastos, o que fez com que a ideia fosse chamada de “fura-teto”.

A interlocutores, o ministro da Economia, Paulo Guedes, rechaçou totalmente a possibilidade de “furar” o teto de gastos com a proposta. Nos planos de Guedes, as despesas fora do teto ficariam restritas aos programas econômicos para combater os efeitos da pandemia e aos recursos para saúde. Guedes ressaltou a auxiliares que lutou para deixar gastos como o Bolsa Família dentro do teto e que não faria sentido, agora, propor uma PEC para “furar” a regra fiscal com obras.

Mesmo com a mudança da meta fiscal no radar, auxiliares de Guedes defendem que, com a PEC, seria possível manter em 2021 dois Orçamentos: o tradicional, com gastos com Bolsa Família, obras e outras despesas ordinárias, e um “Orçamento de Guerra”, reunindo as despesas com a pandemia, como em 2020.

MÍNIMO DE R$ 1.147 EM 2022

Guedes rejeita a ideia de decretar Estado de Calamidade, como ocorreu no ano passado, por ver na medida um “cheque em branco” para gastos públicos. Além disso, não haveria contrapartidas para as despesas, porque os salários dos servidores públicos já estão congelados até o fim deste ano. O governo já pode gastar até R$ 44 bilhões com o auxílio emergencial fora de todas as regras fiscais.

Enquanto o Orçamento de 2021 ainda está sendo discutido, o governo envia hoje ao Congresso o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2022, que prevê as bases para o Orçamento do próximo ano. A equipe econômica deve propor um rombo nas contas públicas na casa de R$ 170 bilhões, de acordo com fontes que participam das discussões.

Guedes pretende mostrar uma recuperação gradual das contas públicas, com a redução do déficit na comparação com este ano. O foco principal dele é conter o endividamento do governo, que se aproxima de 90% do PIB.

A LDO deve indicar ainda um reajuste do salário mínimo de R$ 1.100 para R$ 1.147 em janeiro de 2022. O valor seria corrigido tendo como base uma inflação medida pelo INPC de 4,3%, sem ganho real.