O Globo, n. 32028, 15/04/2021, Mundo, p. 26

 

Vírus avança na América do Sul

Ana Rosa Alves

15/04/2021

 

 

A nova onda da Covid-19, impulsionada pelas variantes mais contagiosas do coronavírus, causa uma piorado quadro epidemiológico em diversos países da América do Sul, o epicentro da pandemia nas Américas. A Argentina e o Uruguai veem um aumento sem precedente dos casos, enquanto a Colômbia voltou a apertar as restrições de locomoção para cerca de 12 milhões de pessoas —um quarto de sua população.

Segundo as projeções do Imperial College, de Londres, para 68 países e territórios, o Uruguai e a Argentina tinham na segunda-feira, respectivamente, a terceira e a quarta maiores taxas de transmissão (Rt) do coronavírus no planeta, de 1,42 e 1,37, atrás apenas de Índia e Irã. O Brasil, em contraste, aparece na 33ª posição, com um Rt de 1,06, enquanto os índices de Perue Colômbia estão entre os 10 maiores.

VIZINHOS ISOLAM BRASIL

O Rt é uma das principais referências para acompanhara evolução epidemiológica: quando é inferior a um, indica tendência de desaceleração. Quando é superior, indica que o vírus se dissemina mais rápido. Os números uruguaios e argentinos significam que cada 100 pessoas infectadas devem contaminar outras 142 e 137 pessoas, respectivamente.

Há semanas, a Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta que as novas variantes e, em especial, a dimensão calamitosa da pandemia em território brasileiro representavam um risco para a região —todos os vizinhos, com exceção do Paraguai, fecharam suas fronteiras com o Brasil. Teme-se em particular a variante P .1, mais contagiosa e possivelmente mais letal, tida como uma alavanca para acrise sanitária. Na semana passada, ela já era associada a 30% dos novos casos no Uruguai e a 40% dos diagnósticos em Lima.

A América do Sul segue sendo o epicentro da pandemia nas Américas —disse ontem Carissa Etienne, diretora da Organização Pan-Americana de Saúde, ressaltando que as mortes por Covid-19 nos últimos sete dias superaram todos os números semanais de 2020, e alertando que as medidas de distanciamento já não têm a mesma adesão de antes. — Não estamos agindo como uma região em meio a um surto cada vez pior.

A situação uruguaia é alarmante: no último mês, a média móvel de novos casos mais que triplicou, passando de 1.017 em 13 de março para 3.766 em 13 de abril. Na semana passada, segundo o New York Times, o país foi o segundo com mais novos casos por 100 mil habitantes, atrás apenas de Curaçao, no Caribe.

As mortes diárias cresceram em uma proporção ainda maior: multiplicaram-se por mais de sete, passando de uma média de 7,6 para 57,7. Para tentar conter a crise sanitária, o país prorrogou até o fim de abril a suspensão das aulas presenciais e eventos públicos, além de fechar seus órgãos públicos.

Setores da população e especialistas pressionam por medidas mais duras do governo de LuisLacalleP ou, quetevesuces soem controlara Co videm 2020, mas reluta em apertaras restrições, afirmando não crer no “Estado policial”.

Na Argentina, a situação também é crítica. Em 13 de março, a média móvel era de quase 6,5 mil novos casos por dia, e em 3 de abril, havia passado para 21,6 mil. As mortes, por sua vez, duplicaram: passaram de uma média diária de 110 para 220 no último mês. Segundo o La Nación, 19 das 24 regiões registram mais de 150 casos por 100 mil habitantes ou viram uma variação de casos superiora 20% nos últimos 14 dias. Em Buenos Aires, a taxa de ocupação hospitalar ultrapassa 70%.

Em 7 de abril, o governo de Alberto Fernández impôs um toque de recolher noturno para tentar conter o avanço da doença. Em 2020, a Argentina teve a quarentena mais longa do mundo, levando o PIB a cair 10% e a taxa de pobreza a subir de 35% para 42%.

NOVA QUARENTENA

Já a Colômbia viu os novos casos diários quase quadruplicarem, passando de 3,7 mil para 14,4 mil no último mês. O país tem hoje um Rt de 1,31, o oitavo maior entre os países analisados pelo Imperial College. Na terça, o presidente Iván Duque anunciou quarentenas de fim de semana em Bogotá, Medellín, Barranquilla e Santa Marta. Apenas setores essenciais poderão funcionar, e somente um a pessoa por família poderá sair deca sapara comprar comida, remédios ou produtos básicos. No último dia 4, Duque já havia estendido o toque de recolher noturno em diversas áreas.

A situação não é muito melhor no Peru: o país tem hoje um Rt de 1,3, o décimo maior na lista do Imperial College. Em 30 de março, registrava uma média de 6,3 mil novos casos por dia, número que hoje é de 9,9 mil. As mortes diárias passaram de uma média de 167,6 por dia para 335,9.

Apesar de já ter aplicado a primeira dose da vacina em 40% da população —maior percentual das Américas —o Chile é outro que continua a ver um aumento dos casos. Para que os imunizantes contenham o contágio, apontam especialistas, é necessário que se inocule em torno de 70% a 90% da população.

RESTRIÇÕES MENOS EFICAZES

O agravamento ocorre apesar da ampliação de uma quarentena, desde 27 de março, que se aplica amais de 85% da população. Segundo um estudo da Universidade do Chile, contudo, as restrições têm se mostrado menos eficaz esqueno ano passado, diante do cansaço da população: a taxa de redução da mobilidade é cerca de metade da de 2020.

Já no Paraguai, os casos também crescem, ma sem ritmo menor: passaram, no último mês, da média diária de 1,7 mil para 2,2 mil. As mortes por dia, por sua vez, quase triplicaram, de 23 para 65.

A Venezuela vê uma escalada parecida das mortes diárias, que passaram de uma média de 7 para 17 no último mês, segundo registros oficiais. Os casos, por sua vez, apresentam uma tendência de queda nos últimos dias: após registrarem um pico de 1,4 mil no último dia 6, o maior da pandemia. Na terça, a média móvel de novos diagnósticos foi um pouco superiora 1,1 mil.

A Bolívia, por sua vez, viu a média móvel de novos casos subir de 722 para 1.098. A média de mortes, por sua vez, teve uma pequena queda: era de 19,6 há um mês e hoje é de 18,57. Tal qual Montevidéu, La Paz acelerou a vacinação na fronteira com o Brasil.